quarta-feira, 31 de março de 2010

OS MUTILADOS

Pe. Alfredo J. Gonçalves, CS

Contam-se aos milhões. Estendem-se por todas as partes do planeta. Habitam especialmente as grandes cidades dos países centrais, mas também as metrópoles dos países emergentes e as capitais dos países subdesenvolvidos. Seu número cresce na proporção direta da economia globalizada. Correm atrás do capital, das mercadorias, da tecnologia de ponta, das oportunidades de trabalho. Na maioria das vezes tem um corpo perfeito. São mutilados não na aparência e na superfície, mas na intimidade mais secreta e oculta. Mutilados nas raízes profundas da própria existência, pois tiveram de arrancá-las do solo pátrio onde enterraram os restos mortais de seus antepassados.

Mutilados também nas estradas inóspitas por onde, sós ou em grupos, fazem, desfazem e refazem as encruzilhadas da sobrevivência. Muros, leis e homens de farda mutilam seus passos, sua travessia, suas aspirações mais sagradas. Não raro mutilam inclusive suas vidas, ceifando-as no meio do caminho. Nos mares, nos desertos ou nas fronteiras, evaporam-se os sonhos de muitos, restando apenas ossos ressequidos e embranquecidos pela inclemência do sol.

Os que logram chegar ao destino são novamente mutilados em seus direitos básicos e fundamentais. Cruzam a fronteira geográfica, mas nem sempre cruzam a fronteira política. Sem papéis, em situação irregular, passam a ser chamados “clandestinos”. Mutilados em seus documentos e em sua identidade. O que equivale a dizer mutilados no acesso ao trabalho, à saúde e educação públicas, a um endereço fixo, a uma pátria. Mutilados e relegados aos porões mais sórdidos e insalubres dos centros urbanos, aos esconderijos da sociedade.

Embora com seus membros fortes e cheios de vida, sentem-se mutilados na sua criatividade e na capacidade de progredir. Restam-lhes os serviços mais sujos e pesados, as tarefas mais perigosas e mal remuneradas. Caem sobre seus ombros os trabalhos que os cidadãos locais se recusam a executar. Mutilados da cidadania, não há escolha, não há alternativa. A necessidade, aliada à pressão dos familiares que ficaram em casa, obriga-os a sujeitar-se a qualquer tipo de oferta.

Não obstante ocupem o interior dos becos, ruas e praças da cidade, permanecem sempre do “lado de fora”. Os “do lado de dentro”, os estabelecidos, necessitam deles como trabalhadores e trabalhadoras, mão-de-obra abundante, fácil e barata. Mas não os querem como cidadãos. Clandestinamente abrem-lhes a porta dos fundos, mas cerram a porta da frente. Os legítimos os vêem como ilegais!

Os que não logram cruzar as fronteiras quedam-se ainda mais mutilados em sua dignidade de pessoa humana. Para o migrante, nada mais vexatório do que voltar para casa com os bolsos vazios. Pior ainda, mais pobres e desfigurados que na saída. É o fracasso estampado no corpo e na alma com feridas fundas e cicatrizes indeléveis. A vergonha costuma ser companheira de todo regresso fracassado. Daí as várias tentativas de retomar a travessia com todos os seus riscos, acompanhadas não raro de outros tantos regressos fracassados.

O processo de mutilação, porém, não se esgota aí. Mesmo para os que lograram cruzar a fronteira geográfica e política, às vezes se vêem barrados na fronteira cultural. Deslocados do berço materno ou da língua pátria, como peixes fora de água, mal conseguem balbuciar alguns vocábulos do novo idioma. Estrangeiros e mutilados na origem, no trânsito e no destino. Na origem, porque tiveram as raízes cortadas, privadas da terra mãe e expostas ao sol; no trânsito, porque são tratados de forma hostil pelos olhares oblíquos e as perguntas capciosas das autoridades constituídas; no destino, porque muitas vezes são forçados a se fecharem em guetos de defesa contra o preconceito, a discriminação e a xenofobia, vítimas privilegiadas ou “bodes expiatórios” do racismo e da perseguição pura e simples de grupos fascistas ou neonazistas.

Entretanto, jamais mutilados na esperança! Teimosamente retomam a estrada, empreendem nova travessia. Em algum lugar do mundo necessitam de um pedaço de terra para reconstruir a cidadania que a pátria lhes negou. E partem, tenazmente partem e voltam a partir!... Em busca de uma pátria sem fronteiras ou do sonho de uma cidadania universal. Caminheiros imbatíveis de um amanhã recriado! Profetas que peregrinam sobre a face da terra, tratando de antecipar os traços de justiça e solidariedade do Reino de Deus.

Novas denúncias envolvendo brasileiros e as cidadanias italianas‏

Amigos,

de certa forma retomando, num outro contexto, as nossas denúncias de corrupção nos consulados na concessão da cidadania italiana (que abordamos desde setembro de 2009 sem que as autoridades diplomaticas admitam irregularidades que para nós são gritantes) o jornalista Rocco Cotroneo, do maior jornal diário italiano, il "Corriere della Sera", publicou uma série de 4 reportagens, nos dias 19 e 20 de março de 2010, com fotos, gráficos e cópias de documentos, denunciando como descendentes de oriundi, com direito ou não à cidadania, utilizando a intermediação de funcionários da Embaixada em Brasilia, além de gangues de agenciadores que facilitam todo o processo (que para um processo normal levaria dezenas e dezenas de anos, tão grande é a fila de espera nos consulados) , conseguiram a cidadania italiana numa pequena cidade da província de Savona (Liguria), utilizando uma das tantas organizações que foram montadas por brasileiros e italo-brasileiros para explorar o filão criado com as dificuldades sempre crescentes nos consulados.
Falava-se em 6 mil euros por uma legalização, de 10 a 15 mil euros por uma cidadania... agora o jornalista Cotroneo fala em 80 mil (80 mil) euros por uma cidadania para um árabe fundamentalista...

As reportagens contam do sistema utilizado, de falsificações - pessoas que "adotaram" um avô italiano, real, mas que nunca foi parente seu - o que nos fez relembrar os 39% de pedidos aceitos pelo Consulado de S. Paulo que tinham "dante causa" desconhecidos , como denunciamos em nossa reportagem de setembro de 2009 e números confirmados pelo próprio consul Marco Marsilli em sua atabalhoada resposta que publicamos em outubro 2009 em nosso jornal Oriundi.

Teriam algumas desses "dante causa" desconhecidos dado origem a europeus DOC em que foram transformados árabes integralistas, como o jornalista Cotroneo denuncia em sua entrevista? é possivel...

Vejam abaixo os links das quatro primeiras reportagens do Cotroneo.
Esperamos que não fique só nisso, e se vá mais a fundo, seja com a reportagem, seja com a Procuradoria, sobre tudo o que acontece no interior de nossas representações diplomaticas, pois certamente os casos abordados são só a pontinha de um enorme iceberg, e a resposta até aqui do MAE - Ministero degli Affari Esteri italiano - foi muito timida, pois não basta averiguear os (poucos) casos apontados, é necessárua uma intervenção total nas representações diplomaticas no Brasil... Nós denunciamos milhares e milhares de irregularidades, e até NADA ACONTECEU!!!

Seguem abaixo os links das 4 reportagens de Rocco Cotroneo.
Obrigado

Vezio Nardini

La grande truffa dei passaporti italiani

Timbri all’ambasciata in Brasile e la residenza sull’Appennino: così si creano falsi cittadini

http://www.corriere.it/cronache/10_marzo_19/La-grande-truffa-dei-passaporti-italiani-rocco-cotroneo_30f35a8a-3329-11df-82b0-00144f02aabe.shtml
Categoria: primopiano > Cronache | Pubblicato il 19 marzo 2010

«Così ho trasformato un giovane arabo in un europeo doc»

Ha fatto per anni lo spallone di esseri umani, prendeva cinesi in Paraguay e Bolivia e li portava in Brasile.

http://www.corriere.it/cronache/10_marzo_19/cosi-ho-trasformato-un-giovane-arabo-in-un-europeo-doc-rocco-cotroneo_725d30b8-3329-11df-82b0-00144f02aabe.shtml

Categoria: primopiano > Cronache | Pubblicato il 19 marzo 2010


Passaporti falsi, scattano le inchieste | 20 marzo 2010


http://archiviostorico.corriere.it/2010/marzo/20/Passaporti_falsi_scattano_inchieste_co_9_100320024.shtml


L' allegra colonia di turisti che aspettano il documento | 20 marzo 2010


http://archiviostorico.corriere.it/2010/marzo/20/allegra_colonia_turisti_che_aspettano_co_9_100320031.shtml

Vezio Nardini

ORIUNDI - a revista mensal de informação e emoção da comunidade ítalo brasileira

ESCRAVIDÃO DE IMIGRANTES É FLAGRADA EM OFICINA LIGADA À MARISA

ESCRAVIDÃO DE IMIGRANTES É FLAGRADA EM OFICINA LIGADA À MARISA: ETAPAS DO PROCESSO DESDE O ALICIAMENTO ATÉ AS LOJAS DO MAGAZINE FORAM APURADAS PELA SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL DO TRABALHO E EMPREGO DE SÃO PAULO (SRTE-SP), QUE APLICOU 43 AUTOS DE INFRAÇÃO, COM PASSIVO TOTAL DE R$ 633,6 MIL.

Por Maurício Hashizume*

São Paulo (SP) - A ligação entre o trabalho escravo de imigrantes sul-americanos e a Marisa, uma das maiores redes varejistas do país, foi atestada por um novo rastreamento de cadeia produtiva do setor de confecções.

Etapas do processo que se inicia no aliciamento e termina nas lojas do grande magazine foram apuradas pela Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de São Paulo (SRTE-SP), que responsabiliza a Marisa em 43 autos de infração, com passivos da ordem de R$ 633,6 mil - dos quais R$ 394 mil se referem à sonegação do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). Os auditores exigem também que a empresa faça o registro dos envolvidos, promova a rescisão indireta e pague os direitos correspondentes.

O ponto de partida foi uma operação fiscal da SRTE-SP realizada no último dia 18 de fevereiro, que inspecionou todas as instalações de uma pequena oficina de costura registrada como Indústria de Comércio e Roupas CSV Ltda., em nome do boliviano Valboa Febrero Gusmán.

No sobrado da Igreja "Boas Novas de Alegria" localizado na Vila Nova Cachoeirinha, Zona Norte da capital paulista, a fiscalização encontrou 16 pessoas de nacionalidade boliviana (uma delas com menos de 18 anos) e um jovem peruano trabalhando em condições análogas à escravidão na fabricação de peças de vestuário feminino para a Marisa, que se apresenta como "a maior rede de lojas femininas do país".

De acordo com o site da empresa, são "mais de 220 lojas espalhadas por todas as regiões do país"; "mais de 90 milhões de peças vendidas" e "mais de 44 milhões de clientes" freqüentam as unidades da rede por ano.

Nenhum dos trabalhadores que pilotavam as máquinas de costura tinha Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) assinada. Todos manejavam peças de um lote da Marisa. A etiquetagem com a marca (veja foto ao lado) era inclusive feita no local.

Foram apreendidos cadernos com anotações que remetem diretamente a cobranças ilegais de passagens da Bolívia para o Brasil, a "taxas" não permitidas de despesas designadas com termos como "fronteira" e "documentos" - o que, segundo a fiscalização, consiste em "fortes indícios de tráfico de pessoas" -, ao endividamento por meio de vales e a descontos indevidos nos salários. Há registros de "salários" de R$ 202 e de R$ 247, menos da metade do salário mínimo (R$ 510) e menos de um terço do piso da categoria (R$ 766).

Vários problemas graves no campo de saúde e segurança do trabalho também foram detectados. As instalações elétricas estavam completamente irregulares. Os extintores, com a carga vencida, ficavam ao lado de tecidos amontoados, com alto risco de incêndio, Cadeiras não respeitavam padrões mínimos de qualidade. Uma criança, filha de uma das operárias, estava exposta a acidentes com o maquinário.

As jornadas de trabalho começavam às 7h e chegavam a se estender até às 21h. Nos sábados, o turno transcorria das 7h às 12h, com o restante do fim de semana livre, conforme depoimentos colhidos pela Repórter Brasil, que acompanhou a fiscalização in loco. As refeições eram feitas de modo improvisado nos fundos do mesmo cortiço que abrigava a oficina. O irmão do dono da CSV permanecia todo o tempo junto com os trabalhadores e atuava como um vigia permanente dos imigrantes.

Os alojamentos também não seguiam normas básicas. Em apenas um cômodo mal iluminado nos fundos de um dos imóveis, construído para ser uma cozinha (veja foto abaixo), sete pessoas dormiam em três beliches e uma cama avulsa. Infiltrações, umidade excessiva, falta de circulação de ar, mau cheiro e banheiros precários completavam o cenário de incorreções. Não havia separação adequada das diversas famílias alojadas na mesma construção.

"A fiscalização se comprometeu, ao lançar a iniciativa do Pacto Municipal Tripartite contra a Fraude e a Precarização, e pelo Trabalho e Emprego Decentes em São Paulo, a intensificar as ações nesse setor da economia", coloca o auditor Renato Bignami, que atuou no caso. "Não há distinção de qualquer natureza no sentido de privilegiar determinada empresa em detrimento de outra. Mas tendo em vista nossa escassez de recursos, a SRTE/SP busca priorizar as principais empresas beneficiárias dessa situação, fiscalizando-as e buscando fazer com que cumpram a legislação de proteção ao trabalho".

Na avaliação da médica e auditora fiscal Teresinha Aparecida Dias Ramos, que também fez parte da comitiva e checou até a receita médica de uma das trabalhadoras com doença de pele, as vítimas do trabalho escravo na oficina de costura CSV estavam expostas a distúrbios respiratórios, problemas ergonômicos, e justamente a enfermidades dermatológicas, além das condições psicossociais indesejáveis, por causa do medo constante.


Cadeia produtiva

Quando chegaram à CSV, os auditores encontraram um representante da trinca de empresas Dranys Confecções Ltda., Elle Sete Confecções Ltda. e Gerson Cesar de Almeida Confecções ME. A Dranys tem loja própria e é a marca mais comercial. A Elle Sete compra os tecidos, faz o primeiro corte e dispõe de um cadastro de subcontratadas que executam a parte mais substantiva de costura das peças. A Gerson de Almeida presta serviços de acabamento, passadoria, revisão, arremate e controle de qualidade. Na prática, contudo, as três atuam de modo tão combinado que é muito difícil dissociar os limites precisos entre uma e outra.

O emissário era registrado da Gerson de Almeida, mas utilizava veículo utilitário da Dranys para, segundo ele, monitorar o trabalho prestado e retirar lotes já concluídos. Aos auditores fiscais do trabalho, ele apresentou nota fiscal emitida em nome da Elle Sete à CSV. Declarou ainda que buscava documento de auditoria do Programa de Responsabilidade Social, executado pela consultoria Bureau Veritas por encomenda para as Lojas Marisa.

Depois das etapas sob responsabilidade da Dranys/Gerson de Almeida/Elle Sete, as peças seriam submetidas à avaliação do magazine. Somente mediante aprovação, a mercadoria seguiria para o Centro de Distribuição Marisa, em Alphaville, Barueri (SP), de onde partiria para as várias lojas da rede pelo país.

No dia 22 de fevereiro, a fiscalização fez inspeções na Dranys (onde foram apreendidos 21 contratos de prestação de serviços de costura firmados com diversos donos de oficinas de costura bolivianos), na Elle Sete (onde tiveram acesso a notas fiscais que revelam o fluxo das peças encomendadas pela Marisa e entrevistaram o operário do setor de modelagem Gerson de Almeida, que declarou desconhecer as atividades da trinca de pessoas jurídicas e aparentemente era utilizado como "laranja") e na Gerson de Almeida (onde encontraram um dos sócios da Dranys e o próprio Valboa).

Nas dependências da Gerson de Almeida, as condições de trabalho também não respeitavam as normativas. Passadeiras trabalhavam em pé, por longos períodos, em local fechado, bagunçado, sujo e sob altas temperaturas. Na mesma empresa, auditores coletaram informações com um representante comercial que atua na intermediação entre a tríade formada por Dranys/ Elle Sete/Gerson de Almeida e a Marisa. Ele descreveu com detalhes os canais de definição e controle da produção das peças pela rede varejista ao longo do ano.


Além disso, apreenderam desenhos de peças, mensagens eletrônicas com instruções expressas da Marisa e relatório de controle de recusas de peças confeccionadas pela Dranys para a Marisa. Um dos lotes foi reprovado pela Marisa por causa de problemas na costura e no zíper. Todas essas constatações, no entender da fiscalização, comprovam a total ingerência da Marisa no que se refere aos outros elos da cadeia produtiva.

Os auditores fiscais se deslocaram, em 1º de março, para a sede da Marisa e colheram um conjunto de informações que reforçam o diagnóstico do vínculo existente entre a empresa e todas suas "fornecedoras", vínculo esse que passa pela especificação das peças até a definição dos preços.

Para quantificar o grau de dependência entre as partes, a SRTE-SP apurou que 94,5% do faturamento da Dranys, no período de janeiro de 2009 a fevereiro de 2010, foram obtidos em encomendas da Marisa.

"Após toda a análise dos locais de trabalho, das entrevistas realizadas e dos documentos auditados, concluímos tratar-se de uma rede de empresas a fundamentar a subordinação reticular", definem os autores do relatório de fiscalização. A GSV, segundo a SRTE/SP, "presta serviços de costura, com mão de obra escrava, com total exclusividade para a empresa Marisa Lojas S.A".

Para a equipe fiscal, a Marisa é "inteiramente responsável pela situação encontrada" e "comanda e exerce seu poder de direção e ingerência de diversas formas sempre no sentido de adequar a produção de peças de vestuário à sua demanda, com exclusividade, a seu preço e à sua clientela".

Durante a fiscalização, Valboa confidenciou à reportagem que buscava "vales" (com metade do valor final das encomendas) junto às empresas intermediárias, antes mesmo de terminar o serviço, para poder pagar aluguel e comida. Esses adiantamentos confirmam a falta de autonomia financeira do dono da oficina para manter negócio próprio.

Caracterizadas como "pseudoempresas interpostas" pela fiscalização, as fornecedoras Dranys/Gerson de Almeida/Elle Sete funcionam, na visão dos auditores, "como verdadeiras células de produção da empresa Marisa Lojas S/A, todas interligadas em rede por contratos simulando de prestação de serviço, mas que, na realidade, encobertam nítida relação de emprego entre todos os obreiros das empresas interpostas e a empresa autuada".

O relatório chama atenção para o nível de dependência da rede varejista à sua "marca própria": 88% dos produtos vendidos são da marca própria "Marisa". O elevado nível de participação exige, de acordo com a SRTE/SP, forte gestão de fornecedores - em termos de definição de peças, qualidade, logística e preço.

Sonho e partilha

A reportagem conversou com alguns dos trabalhadores que costuravam na oficina CSV. A maioria dos bolivianos vinha de El Alto, no altiplano andino, cidade com cerca de 1 milhão de habitantes, vizinha à capital La Paz, marcada por ser ponto de convergência de migrantes camponeses e indígenas. Eles dizem ter sido atraídos pelos relatos de parentes que migraram anteriormente para o Brasil e têm receio de fornecer qualquer tipo de informação sobre como entraram no país e de como vivem atualmente. O único peruano declarou ser de Cusco e sequer portava o visto temporário concedido pela Polícia Federal.

A maior parte deles cultiva o sonho de retornar em melhores condições à terra natal. Formado em Educação Física, um dos jovens jurou um dia voltar para dar aulas aos pequenos e pequenas de sua comunidade. Um dos mais velhos na oficina de Valboa disse que está no Brasil há três anos, pensa sempre em rever a família na Bolívia, mas nunca conseguiu materializar o seu intento. "Mas este ano eu voltarei", declarou, esperançoso.

Em depoimentos à reportagem (vigiados de perto pelo irmão do dono da oficina de costura), disseram receber de R$ 500 até R$ 700 por mês, em períodos de maior intensidade do trabalho. Segundo eles, com o que recebem, é possível, pelo menos em alguns meses ao longo do ano, enviar remessas de US$ 100 para parentes na Bolívia.

Registros dos cadernos apreendidos ajudam a desvendar, porém, os reais beneficiários do empenho dos imigrantes sul-americanos. Anotações mostram que Valboa chegara a pagar, em empreitada recente, míseros R$ 1,33 por peça aos trabalhadores de sua oficina. Para o lote da Marisa/Dranys/Gerson de Almeida/Elle Sete, os costureiros e costureiras declararam que receberiam cerca de R$ 2 por blusa.

Em depoimento, Valboa, dono da CSV, declarou que receberia das intermediárias Dranys/Gerson de Almeida/Elle Sete efetivamente R$ 4 por cada peça costurada. A nota fiscal emitida pela Elle Sete apresenta, porém, o valor de R$ 7 por blusa costurada. Deduz-se, por conseguinte, que essa diferença de R$ 3 por peça entre o que aparece na nota e o que seria pago à oficina de costura era embolsada pelas intermediárias.

Partilha do valor pago por uma peça vendida pela Marisa

R$ 2,00 (4%) - Trabalhador

R$ 2,00 (4%) - Dono da oficina (CSV)

R$ 17,00 (34%) - Intermediárias (Dranys/Gerson de Almeida/Elle Sete)

R$ 28,99 (58%) - Lojas Marisa

R$ 49,99 - Preço Final

As "fornecedoras", por sua vez, receberiam, conforme outra nota apreendida, R$ 21 por peça da Marisa. Durante a inspeção dos auditores à sede da Gerson de Almeida, no bairro do Bom Retiro, as mesmas blusas estavam recebendo etiquetas com o preço final ao consumidor de R$ 49,99.

Grosso modo, os R$ 49,99 que porventura vierem a ser pagos por uma cliente da Marisa estão assim repartidos: R$ 2 para o trabalhador (4%), R$ 2 para o dono da oficina (4%), R$ 17 para os intermediários (34%) e R$ 28,99 (58%) com a Marisa.

Questionada pela reportagem, a Marisa afirma que, inicialmente, o preço indicado nas etiquetas não é necessariamente o preço final de venda, podendo a peça ser vendida a preços inferiores devido a diversas circunstâncias de mercado (giro de produtos, aceitação do consumidor, mudança de estação, etc). "Em segundo lugar, os preços praticados pelos fornecedores diretos da Marisa junto aos demais elos da cadeia produtiva escapam a qualquer ingerência de sua parte. Por fim, vale observar que o custo com a mão de obra (distribuído nos diversos elos da cadeia) é apenas um dos vários componentes formadores do custo final (tributos, marketing, modelagem, distribuição, matéria prima etc.)", complementa a rede varejista, por meio de advogado.

Notificações e dificuldades

A SRTE/SP notificou a Marisa a proceder o registro imediato dos 17 trabalhadores e trabalhadoras encontrados na oficina de costura CSV, efetuar a rescisão indireta e pagar as verbas rescisórias, na presença dos auditores fiscais responsáveis pela ação, no próximo dia 5 de abril 2010.

"Faremos a assistência a essa rescisão. Se não houver, na ocasião, a apresentação de todos os documentos que propiciem a conferência dos cálculos e a completa quitação dos valores rescisórios, a empresa será notificada a apresentar rescisão complementar e fazer o pagamento suplementar, tantas vezes quantas forem necessárias para a conferência e quitação", afirma Luís Alexandre, da SRTE-SP, que também atuou no caso.

A Marisa foi avisada do envio do relatório da fiscalização à Secretaria de Inspeção do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego (SIT/MTE), bem como aos demais órgãos, como a Polícia Federal (PF), para apuração dos indícios de tráfico de pessoas, às Receitas Federal e Estadual, em virtude de sonegação de tributos, e a representantes do Ministério Público do Trabalho (MPT) e do Ministério Público Federal (MPF).

O auditor Renato Bignami enumera uma série de motivos pelos quais a equipe optou por não promover o resgate dos trabalhadores, como ocorre nas libertações de condições análogas à escravidão no meio rural promovidas pelo grupo móvel de fiscalização.

Primeiro, os nacionais dos países que fazem parte do Mercosul (Argentina, Uruguai e Paraguai), Bolívia e Chile, por força do Decreto n. 6.975, de outubro de 2009, têm direito a permanecer provisoriamente no Brasil. Neste caso, o único impedimento para a concessão do visto de dois anos é a existência de antecedentes penais ou policiais. Sendo assim, o resgate com conseqüente reenvio de bolivianos estaria descartado.

Segundo, muitos dos trabalhadores da oficina CSV vivem no Brasil acompanhados de suas famílias (com esposas e filhos, que não raro freqüentam escolas e já foram alfabetizados em Português), diferentemente dos libertados das fazendas brasileiras mantêm famílias em suas cidades de origem. O reenvio desses sul-americanos aos países de origem poderia causar "um trauma maior", na visão de Renato.

Terceiro, esses trabalhadores têm pertences pessoais como eletrodomésticos, roupas, móveis etc. O transporte desses bens para os países de origem seria inviável. E quarto, não há estrutura pública de abrigo provisório que pudesse acolher essas famílias caso houvesse de fato o resgate.

Renato ressalta que não existem procedimentos definidos para o resgate em ambiente urbano, específico para trabalhadores estrangeiros. Faltam ainda dados confiáveis a respeito desses trabalhadores (Onde estão? Quantos são? Para quem trabalham? Quem os trouxe? Como vieram?).

O auditor pede uma articulação mais efetiva dos órgãos públicos em torno da questão e destaca os problemas da falta de confiança nos agentes do poder público ("pacto de silêncio") e da baixa conscientização do consumidor brasileiro.

Acordo e posição

Pressionada por denúncias anteriores, a Marisa - assim como as outros magazines do setor - já tinha assinado um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o Ministério Público do Trabalho (MPT) em 2007. No documento proposto pela Procuradoria Regional do Trabalho da 2a Região (PRT-2), a rede varejista se compromete a tomar providências (por meio de advertências no site, cláusulas em contratos comerciais e de visitas periódicas a fornecedores) no sentido de evitar ligações com oficinas com trabalho ilegal.

Em resposta à Repórter Brasil, a Marisa insiste que "não mantém e nunca manteve vínculos com trabalhadores estrangeiros em situação de vulnerabilidade ou trabalhadores contratados com condições de irregularidade" e que "a situação detectada pelos auditores não é de responsabilidade direta ou indireta da Marisa".

"É importante registrar que a Marisa cumpre rigorosamente o TAC celebrado com o Ministério Público do Trabalho", completa o advogado José Luis Oliveira Lima, que respondeu em nome da empresa. "Pelo TAC, a Marisa não ficou responsável pela cadeia produtiva, mas sim pelos fornecedores devidamente credenciados, e não há no relatório de inspeção nenhuma constatação de trabalho [escravo] nesses fornecedores".

Segundo o advogado, a Marisa foi "além no cumprimento do TAC" e "solicitou auditoria não apenas nos seus fornecedores credenciados, mas também nos fornecedores destes". A empresa não esclarece, porém, nem quais são os critérios adotados e nem se as subcontratadas da Dranys/Gerson de Almeida/Elle Sete, caso da CSV, foram em algum momento auditadas.

A empresa, que alega ter investido cerca de R$ 30 milhões nos últimos três anos em responsabilidade social, sustenta que não existe conivência ou incentivo à subcontratação. "Cada contratado se organiza segundo critérios próprios, inerentes a particularidade de cada segmento. A Marisa não tem acesso ou ingerência à estrutura de custo de seus fornecedores", acrescenta a rede varejista, que nega ter controle do conjunto do processo produtivo, como afirmam os auditores fiscais.

Por iniciativa da Associação Brasileira do Varejo Têxtil (Abeim) - que engloba outras redes como C&A, Riachuelo e Renner -, a Marisa anuncia que a implantação de um novo modelo de certificação voluntária para combater condições degradantes de trabalho já está em fase avançada de negociações.

"A Marisa, sempre com o intuito de aperfeiçoar o seu controle aos fornecedores, encampou a iniciativa da Abeim. Esse sistema vem sendo desenvolvido desde agosto de 2009, sendo um processo complexo que envolve várias empresas do mercado, inclusive, empresas certificadoras", adianta. A grande novidade, confirma o advogado, é a união de forças com a finalidade de aumentar o controle no setor. "O modelo proposto visa atingir a cadeia produtiva numa maior profundidade, considerando sua enorme pulverização".

Para a Marisa, "o mercado não pode prescindir de ações de fiscalização conjunta envolvendo os aparatos de fiscalização dos fiscos Federal e Estaduais", com a finalidade de alcançar "todos os atores econômicos pelos quais se encontra pulverizada a cadeia produtiva do setor".

Pacto e mercado

As posições apresentadas pela Marisa não convenem Eunice Cabral, presidente do Sindicato das Costureiras de São Paulo e Osasco. Segundo ela, os grandes magazines têm responsabilidade e "querem se omitir". "Não estamos falando de lojinhas de fundo de quintal", emenda a dirigente. A denúncia que suscitou a fiscalização foi encaminhada pela entidade de Eunice.

O próprio preço praticado pelas redes varejistas, na análise da sindicalista, não reflete os custos de produção e embute a conivência com a precariedade negada pela Marisa. "É impossível comercializar produtos a preços tão baixos cumprindo tudo o que a lei determina. Isso é concorrência desleal", prossegue. "Quem faz tudo direitinho acaba sendo prejudicado".

O número de costureiras na região caiu de 180 mil, na década de 1990, para cerca de 80 mil, em 2006. Como a demanda do setor de confecções aumentou durante esse mesmo período, a situação flagrada na oficina de costura CSV seria, para Eunice, um dos principais motivos para a redução drásticas de empregos formais no setor. "O Brasil é grande e estamos de portas abertas para receber gente de outros países. Mas as leis precisam ser cumpridas e todos precisam ser tratados com dignidade", conclui.

Os auditores fiscais responsáveis pelo caso reconhecem que, diante do emaranhado de pessoas jurídicas intermediárias resultantes da subcontratação (terceirização, quarteirização, quinteirização etc.), a empresa tomadora principal acaba perdendo o controle da mão de obra que está "na ponta". "Mas no caso específico da Marisa, o que se verificou foi a simulação de contrato de fornecimento, sendo que a empresa mantém a ingerência sobre todos processos que envolvem a produção", reitera Luís Alexandre.

"Não existe, ainda, um diploma legal que discipline de maneira adequada e suficiente a terceirização de serviços, deixando essa questão inteiramente para o mercado - leia-se, a ´lei do mais forte´", complementa o auditor.

Os integrantes do Grupo de Combate à Fraude nas Relações de Trabalho e à Terceirização Irregular da SRTE/SP avaliam que a Lei de Anistia Migratória, ao facilitar a concessão de vistos provisórios durante o segundo semestre do ano passado, criou um ambiente favorável à regularização, inclusive do ponto de vista trabalhista. No entendimento deles, o empoderamento dos imigrantes (com a conscientização sobre direitos, a qualificação profissional e a eliminação de aliciadorees que atuam no tráfico de pessoas) é essencial.

Ainda nesse sentido, a SRTE/SP recomenda, por parte das empresa, o cumprimento integral do disposto no Anexo I do Pacto Contra a Precarização e Pelo Emprego e Trabalho Decentes em São Paulo - Setor das Confecções. "Uma parte importante do empresariado ainda não aderiu", conta Renato.

A Marisa e outras redes magazines da Abeim foram convidadas a aderir ao Pacto Municipal Tripartite, mas declinaram. Aos auditores, a Marisa declarou entender que, por já possuir um TAC firmado com o MPT, não lhe competia ir além dos estritamente acordado nesse âmbito. Já o advogado da empresa declara que as negociações envolveram entidades associativas (e não empresas individualmente consideradas) e a divergência "envolveu a oposição à terceirização de forma geral manifestada no pacto".

Em 2009, a Marisa teve aumento de 7,4% da receita líquida que, projetada pelo alto consumo da classe C, saltou para R$ 1,5 bilhão. A empresa deve abrir 39 novas unidades em 2010. A rede está investindo pesado nas vendas pela internet. E apesar de todos os problemas apontados pela fiscalização, a reportagem registrou exemplares da mesma blusa fabricada pelos imigrantes latino-americanos submetidos à escravidão sendo vendidos, nesta terça-feira (16), em loja da Marisa na capital paulista.

Consultas feitas pelos auditores ao Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) permitem inferir que as outras seis oficinas de costura (cinco delas também pertencentes a bolivianos) que fabricavam a mesma blusa para a Dranys/Gerson de Almeida/Elle Sete não proporcionavam condições de trabalho muito superiores às encontradas na CSV.

Todas elas jamais tiveram movimentação de empregados, o que, segundo os auditores, denota "a imensa informalidade e precariedade das condições de trabalho nesses locais". Um dos proprietários dessas oficinas se superou: "emprestou" o Cadastro de Pessoa Física (CPF) de uma outra pessoa no preenchimento de nota emitida para as intermediárias.

*O jornalista da Repórter Brasil acompanhou a fiscalização da SRTE/SP como parte dos compromissos assumidos no Pacto Contra a Precarização e pelo Emprego e Trabalho Decentes em São Paulo - Cadeia Produtiva das Confecções

Fonte: http://www.reporterbrasil.com.br/exibe.php?id=1714

PRESENÇA BOLIVIANA EM SÃO PAULO QUESTIONA IDENTIDADE BRASILEIRA, DIZ PESQUISADOR DA DEUTSCHE WELLE, NA ALEMANHA

Estudioso das migrações internas na América Latina, o francês Sylvain Souchaud se dedica à análise do fluxo de bolivianos para São Paulo. Em entrevista, ele fala o que essa migração representa para o Brasil.

DEUTSCHE WELLE - Poderia falar sobre o cerne de seu trabalho sobre a migração boliviana para São Paulo?

SYLVAIN SOUCHAUD - Comecei trabalhando num projeto sobre a migração de bolivianos para Corumbá, no Mato Grosso do Sul, cidade na fronteira entre o Brasil e a Bolívia e a segunda concentração de bolivianos no Brasil. Nossa ideia era verificar como essa migração podia ter uma relação com o fluxo de bolivianos para São Paulo, que é a cidade com o maior número de imigrantes bolivianos no Brasil. (...)

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/folha/dw/ult1908u706919.shtml

BRASIL ATRAI GRANDE NÚMERO DE IMIGRANTES BOLIVIANOS

Brasil | 18.03.2010

Imigrantes bolivianos encontram-se regularmente na Praça Kantuta. Nos jornais brasileiros, não são raras as notícias sobre oficinas de costura que empregam bolivianos em forma de trabalho escravo. Verdade ou exagero, a colônia boliviana cresce na maior metrópole latino-americana.

Em alguns trabalhos acadêmicos sobre o assunto, chega-se a falar de "senzalas bolivianas", numa referência a oficinas de costura, onde os imigrantes daquele país ganham por hora e por isso se autoescravizam em jornadas absurdas de trabalho e condições desumanas de moradia. Além do medo de serem descobertos, quando vivem ilegalmente no Brasil.

"Como em todo lugar do mundo, os que não têm documento são explorados. Isso acontece em qualquer lugar e aqui é a mesma coisa. Nem sempre no ramo da costura, mas também em outros setores, como nas oficinas mecânicas, por exemplo. Uma empresa formal não vai se arriscar a contratar um clandestino, o que faz com que, quando eles conseguem trabalho, aceitam salários muito mais baixos do que o normal", diz Carlos Sotto, há 39 anos no Brasil e um dos idealizadores da feira da Praça Kantuta.

Nesta feira, os bolivianos de São Paulo se reúnem aos domingos para jogar futebol, degustar comidas originárias de seu país, cantar, dançar e encontrar amigos. Há de tudo no local, desde oferta de roupas a cabeleireiros ou parquinho infantil. Segundo Sotto, "continua chegando uma média de três a cinco ônibus cheios de bolivianos por dia a São Paulo. A colônia atualmente é a que mais cresce na cidade", diz ele em frente à sua barraca de salteñas na Praça Kantuta.

Ausência de guetos

Estimativas extraoficiais, como a citada em texto publicado pelos pesquisadores Renato Cymbalista e Iara Rolnik Xavier, falam de 100 mil bolivianos vivendo na cidade, em sua maioria jovens, de baixa escolaridade, empregados na indústria do vestuário. Há fontes que chegam a mencionar um total de 200 mil

Se no início os bolivianos estiveram pouco presentes no espaço público, isso se deu em função do esquema de moradia a eles oferecido, via de regra com hospedagem nas próprias oficinas de costura, onde trabalham e moram ao mesmo tempo. Como costumam ganhar por hora, a tendência é de jornadas exorbitantes de trabalho, em busca de salários melhores.

Embora concentrados em alguns bairros da cidade, os bolivianos não formam enclaves étnicos ou guetos como em metrópoles europeias. E raramente ficam desempregados, contrastando desta forma mais uma vez com as minorias imigrantes de grandes cidades como Londres ou Paris.

Perfil mudou ao longo dos anos

Os primeiros bolivianos a migrarem para o Brasil eram via de regra estudantes, que se deslocaram para São Paulo ainda nos anos 1950, dentro de programas de intercâmbio acadêmico entre o Brasil e a Bolívia. A partir da década de 1970, o perfil desse migrante mudou.

"Para trabalhar nesse setor de costura, as pessoas que chegam hoje a São Paulo vêm do departamento de La Paz, da região andina, urbana. E principalmente da cidade-subúrbio El Alto. Ou seja, temos que pensar essa migração em termos urbanos e não de um migrante que vem do meio rural, campesino, e é facilmente explorado pelos agentes da cidade", explica o geógrafo Sylvain Souchaud.

O pesquisador francês estuda a migração boliviana para o Brasil, num projeto de parceria entre uma instituição francesa de pesquisa e o Núcleo de Estudos da População (NEP) da Universidade de Campinas (Unicamp).

Segundo Souchaud, muitos desses imigrantes bolivianos permanecem apenas por pouco tempo no Brasil, tendo sempre em vista um retorno ao país de origem. "Eles costumam ficar um ou dois anos e acabam voltando para El Alto, onde a família ficou.

As relações sociais, quando eles estão no Brasil, não são a prioridade deles. A meta é trabalhar, juntar dinheiro durante uma temporada, montar um projeto – comprar um casa, financiar os estudos – e voltar. Tem muito movimento, muitos vão e voltam", diz o pesquisador.

Fenômeno novo

Para o Brasil, essa migração recente é um fato praticamente inusitado. Embora país de imigrantes, as últimas levas de imigração em massa já estão há muito enterradas no imaginário brasileiro. Essa tendência recente reflete, segundo Souchaud, a nova posição geopolítica assumida pelo Brasil na América Latina.

"O papel do Brasil na região está crescendo cada vez mais. O Brasil não era um país de imigração muito importante para os vizinhos, ao contrário da Argentina, que assumia no passado esse papel de polo migratório regional. Agora o Brasil está assumindo essa função. Isso engloba vários aspectos: a posição do país na região, a forma como ele se autodefine, as relações que tem com os vizinhos e um conhecimento melhor destes vizinhos", ressalta o geógrafo.

Desconhecimento da região

Conhecer bem os vizinhos não costuma ser algo normal num país das dimensões do Brasil, onde não raro se diz "na América Latina" quando se quer falar dos países de língua espanhola, como se o próprio Brasil não estivesse incluído dentro desta denominação geográfica.

"A dificuldade para propor esse tema da migração regional no Brasil, como professor, foi grande. Não são muitos os alunos que querem estudar os países vizinhos. O interesse continua sendo o imigrante europeu. Não há uma curiosidade muito forte em relação aos países vizinhos. Isso está mudando muito lentamente", afirma Souchaud.

Mas se os brasileiros conhecem pouco a Bolívia, a recíproca também é verdadeira, diz o estudioso francês que já viveu vários anos em ambos os países. O surgimento da população boliviana em São Paulo, diz ele, "questiona um pouco a identidade brasileira. Os brasileiros, principalmente do Sudeste, se definem através de uma migração europeia. Essa migração andina indígena muda um pouco o perfil migratório do Brasil. E consequentemente pode mudar a identidade do país a longo prazo", aposta Souchaud.

Com a ajuda do Estado brasileiro, contudo, os bolivianos, via de regra, não contam. "A única ajuda que veio foi a de dar anistia aos ilegais", conta Carlos Sotto, ao lembrar que "se o Estado for ajudar os clandestinos no Brasil, teria que ajudar coreanos, angolanos, bolivianos, equatorianos. E o governo não tem dinheiro nem para ajudar brasileiros", diz resignado o boliviano que vive há quase 40 anos em São Paulo.

Autora: Soraia Vilela

Revisão: Roselaine Wandscheer

Fonte: http://www.dw-world.de/dw/article/0,,5208328,00.html
RODRIGO PETRY: Agencia Estado

SÃO PAULO - A rede varejista Marisa considerou "equivocada" a autuação de R$ 633,67 mil imposta pelo Ministério do Trabalho de São Paulo após auditores fiscais encontrarem funcionários estrangeiros em condições consideradas análogas à escravidão, conforme reportagem publicada hoje pelo jornal "Folha de S.Paulo". O advogado da Marisa, José Luis Oliveira Lima, disse que irá apresentar uma "resposta à autuação" informando que a rede "não tem responsabilidade sobre os serviços terceirizados de suas fornecedoras".

"Temos um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) assinado com o Ministério Público do Trabalho em que somos obrigados a fiscalizar o primeiro elo da cadeia de fornecedores. Mesmo assim, fiscalizamos até o nosso segundo elo", afirmou. Lima ressaltou que a fiscalização do Grupo de Combate à Fraude e à Terceirização Irregular do ministério aconteceu na oficina da GSV, que presta serviços - por meio de outras empresas - à Dranys Confecções. "Essa empresa (GSV), está no quarto elo da nossa cadeia, ou seja, não é nossa fornecedora direta", justificou o advogado. Lima acrescentou ainda que a Dranys já foi descredenciada entre as empresas fornecedoras da Marisa.

O chefe substituto da seção de fiscalização do Ministério do Trabalho, Renato Bignami, afirmou que a Marisa foi notificada porque uma fiscalização na GSV, em fevereiro, após uma denúncia, encontrou 17 bolivianos e um peruano produzindo peças de roupas "exclusivamente dedicadas a marca Marisa". Todos os trabalhadores, segundo ele, não tinham registro de trabalho.

Bignami disse que o valor de R$ 633,67 mil refere-se à recuperação de débitos do FGTS dos trabalhadores estrangeiros e a multas de um total de 43 autos de infração entregues à varejista. Segundo ele, a Marisa tinha conhecimento da prática e já tinha sido alertada sobre a situação. Um relatório foi encaminhado à Secretaria de Inspeção do Trabalho, em Brasília, recomendando a inclusão da Marisa na "lista suja" do ministério de empresas associadas ao trabalho análogo ao escravo.

Bignami salientou que outras empresas de médio e grande porte dedicadas à comercialização de produtos têxteis e de confecção estão sendo investigadas. Segundo ele, a Marisa foi notificada a registrar os trabalhadores e a pagar os encargos trabalhistas devidos. São considerados trabalhos análogos à escravidão, por exemplo, jornadas superiores a 12 horas ou servidão por dívida, que é o pagamento dos custos de ingresso do estrangeiro no País.

Fonte: http://economia.estadao.com.br/noticias/not_9852.htm

Haiti: mulheres deslocadas participam de projeto de trabalho

FONDS-VERRETTES, Haiti, 24 de março (ACNUR) - Cerca de 8 mil sobreviventes to terremoto que arrasou o Haiti em janeiro deste ano buscaram refúgio em Fond-Verrettes, uma comunidade rural isolada, incrustada nas montanhas haitianas ao sul do país, já na fronteira com a República Dominicana. Nesta localidade, o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) está implementando um projeto comunitário de costura que conta com a participação de mulheres sobreviventes do
terremoto. O projeto tem o objetivo de fazer com que as mulheres deslocadas e as famílias que as acolheram possam ter uma fonte renda, fortalecendo, assim, o apoio mútuo. A agência de refugiados da ONU enviou 8 máquinas de costura e uma ajuda em dinheiro para os materiais necessários para a Oganizasyon Fanm Solidè Fonvèrèt, uma cooperativa feminina em Fonds-Verrettes. O projeto qualificará o grupo, que já
congrega mais de 140 membros locais, e treinará dezenas de mulheres deslocadas para se tornarem costureiras. A cooperativa venderá a produção para uma rede de comerciantes estabelecidos nas comunidades vizinhas.

Leia a íntegra desta notícia em www.acnur.org.br

Brasil: uma nova potência, Ou um país ainda mais dominado?

O Brasil vem sendo retratado pelo governo e pela imprensa como um gigante prestes a explodir e se tornar uma nova potência mundial. Onde se ligue um rádio, se abra uma página de jornal, ou se veja um programa de notícias na TV, lá estão as declarações de políticos, entrevistas com "especialistas" e dados selecionados "provando" esta nova tese. No entanto, ao esfriarmos um pouco a cabeça e verificarmos qual é a realidade por trás desse discurso ufanista e grandiloquente, nos damos conta de que só existem promessas, e que a vida permanece a mesma, com os problemas se agravando.

Os números não mentem, mas podem ser distorcidos. E é essa técnica, junto das projeções fantasiosas para o futuro, sem que exista nenhuma comprovação dessas expectativas, que formam a base do discurso de que "esse é um país que vai para a frente", como a ditadura gostava de dizer, ao propagandear o seu "milagre econômico". Esse termos designou os anos maia duros e repressivos da tortura no Brasil, mas em que havia um crescimento acelerado do PIB, às custas do endividamento geométrico do país. No fim das contas, o "milagre" foi mais um passo ladeira abaixo. Mas seria impensável alguém dizer isso na época, em que era consenso que o Brasil se aproximava de um futuro promissor, como nova potência.

Collor atribuiu a si mesmo a missão de que colocaria o Brasil no caminho do progresso; FHC jurava que o Brasil sem inflação era um novo país, candidato a superdesenvolvido; e, agora, Lula... faz parte da propaganda de governo exaltar avanços irrelevantes e esconder retrocessos bem mais significativos.

Nesta matéria tentaremos discutir alguns aspectos dessa ideologia claramente enganosa e reacionária, de esperar que o Brasil, com este mesmo sistema, governo e regras do jogo possa aguardar sua vez de ser grande.

Pré-sal: o petróleo não é mais nosso

Com a descoberta de jazidas gigantescas de petróleo na chamada camada pré-sal, o Brasil pula de um produtor médio para o patamar de um dos maiores donos de reservas do mundo. Em cerca de 10 anos, é possível que o Brasil se torne um grande exportador desse importantíssimo recurso energético. O pré-sal é um dos eixos do discurso de "Brasil potência".

No entanto, o pré-sal ainda nem começou a gerar produção em larga escala, e já não é do povo trabalhador brasileiro. O governo Lula autorizou a manutenção de todas as concessões privadas que existem hoje, incluindo as que se localizam em áreas abrangidas pelo pré-sal. Mesmo que a descoberta tenha sido feita com recursos e investimentos estatais, os empresários vão lucrar em cima.

Não contente com isso, Lula encaminhou ao Congresso 4 projetos que aumentam ainda mais o roubo do petróleo. Nem mesmo as novas áreas descobertas não serão estatais, e todas passarão pelos leilões, iniciados por FHC e ampliados por Lula, através dos quais, megaespeculadores e multinacionais se apossaram de boa parte de nossas riquezas. A Petrobrás pode ficar com apenas 30% das novas jazidas. Pelo menos é alguma coisa, não é? Na verdade, não, pois nem mais a Petrobrás é "nossa". Lula privatizou ainda mais a empresa, e vem entregando o controle petroquímico brasileiro à Braskem, braço energético da empreiteira Odebrecht.

Assim, o pré-sal vai trazer muita riqueza. Mas não vai ser o país, muito menos os trabalhadores que vão ganhar qualquer coisa com isso. Isso, inclusive, não vai ser nenhuma novidade, já que os atuais maiores produtores de petróleo são países muito subdesenvolvidos e com a população em condições precárias.

Copa do Mundo e Olimpíadas

Parodiando o efeito da vitória brasileira na Copa de 70, capitalizada por Médici para saudar a situação do país, em plena ditadura; o governo Lula tenta vender o peixe de que está tudo dando certo, após a escolha do país para sediar a Copa em 2014 e as Olimpíadas em 2016.

Neste aspecto, para conter a euforia despropositada, é importante olharmos a história. O Brasil sediou a Copa em 1950, e não consta que tenha mudado uma vírgula depois disso. Da mesma forma, foi a sanguinária ditadura argentina quem sediou a última Copa realizada na América do Sul, em 1978. Também neste evento, o governo tentou tirar proveito. Mas a Argentina, mesmo campeã, não ganhou nada, social e politicamente, com o evento. Pelo contrário.

Para pegarmos um exemplo mais recente, falemos do PanAmericano do Rio. Esta competição obscura, que não serve de parâmetro sequer esportivamente, gastou quase 10 vezes o que tinha sido orçado! Ou seja, o Pan serviu apenas para Lula escutar uma vaia histórica, e para empreiteiras lucrarem como nunca e políticas roubarem como sempre.

A Copa e Olimpíada não poderão ser vistas pelos trabalhadores, com seus ingressos milionários, e só trarão desvio de verbas, dívidas e autopromoção dos governos.

PIBinho

A crise econômica mundial, ao contrário da bravata da "marolinha" de Lula, atingiu em cheio o Brasil. Foram mais de 1 milhão de desempregados, que, mesmo com o índice retornando ao patamar anterior, após 1 ano, deixou um rastro de dívidas, rebaixamento de salários e gastos públicos com seguro-desemprego. O Brasil assistiu a quase 2 anos de paralisia produtiva, com a indústria despencando quase 20%, reduzindo a arrecadação e endividando o país.

O ministro Guido Mantega, disse que o Brasil não tem "pibinho", e sim "pibão". Só se for na cabeça dele, que jurou que o Brasil nunca entraria em recessão e que cresceria 2% ano passado. Aconteceu tudo ao contrário. Hoje, a inflação volta a preocupar; os juros brasileiros são os mais altos do mundo e devem tornar a aumentar; e o arrocho ao funcionalismo e lentidão em obras são reflexos cada vez mais comuns, devido à queda do recursos do orçamento.

O PIB brasileiro entrou em recessão, e, mesmo após passar pelo pior, segue pífio em comparação com outros subdesenvolvidos. O índice de "crescimento" é mais baixo que o da Índia, Argentina e outros países que ninguém imagina que se tornem potências econômicas, nem daqui a um século.

Dívida não foi paga

O último, e um dos mais fortes argumentos governistas para defender a "saúde" do país, é a versão de que o Brasil deixou de ter dívida externa e agora empresta dinheiro ao FMI. Metade disso é uma mentira deslavada, e a outra é uma verdade vergonhosa.

O Brasil, sob o comando do PT teve um dos maiores saltos da dívida pública de sua história. Hoje, a dívida pública chega perto de 1,5 trilhão de reais! Isso nunca aconteceu. Percentualmente, a dívida só cresce, apesar de bilhões serem gastos todos os anos com os juros. De 2008 para 2009, o endividamento passou de 37% para mais de 43% do PIB.

A falácia de que a dívida acabou é fruto de um jogo de cena. O governo "pagou" a dívida em dólares ao FMI, fazendo muito mais dívida, em títulos públicos. Neste caso, não trocou 6 por meia dúzia, e sim por uma dúzia inteira. A mentira, porém, se baseia no fato de que a dívida agora é para um credor desconhecido e pulverizado em magnatas estrangeiros, governos de países imperialistas e banqueiros em geral, sem que nenhum deles tenha a antipatia concentrada que tinha o FMI.

Do outro lado, é verdade que, mesmo devendo cada vez mais, o Brasil ofereceu dinheiro emprestado ao FMI. Esta ação é um escândalo, pois além de retirar recursos da saúde e educação, dá verbas para um órgão imperialista que estava falido poder se recuperar, e voltar a impor seus planos de destruição mundo afora, receitando demissões e privatizações.

Não há espaço para desenvolvimento no imperialismo

A verdade é dura, mas precisa ser dita: o Brasil não está indo, nem pode ir rumo a se tornar uma potência. Isso vale para o Brasil e para as dezenas de países pobres e semicoloniais que existem hoje.

Isto tampouco é culpa de Lula, ou de algum governo isoladamente. Isso é assim por algo muito maior: o capitalismo, como modo de produção chegou a seu limite, e não cresce mais.

Nesta fase, descrita pelo revolucionário russo Vladimir Lênin como imperialismo, a burguesia já não pode crescer para "locais novos", nem há espaço para novos integrantes do clube. Um burguês ou um país burguês, para aumentarem seus lucros, precisam tomar a parte da exploração que outro burguês ou país esteja usufruindo. Assim, a luta por espaço no capitalismo imperialista assume um caráter canibal, em que um burguês destrói ou compra o outro (e daí as fusões e monopólios), e os países entram em guerra para definir quem ficará com os mercados consumidores e matérias-primas.

Esta época, marcada por guerras, crises e revoluções (como parte da resistência da classe trabalhadora), traz ainda mais miséria aos pobres, e empobrecimento a setores que antes ainda escapavam desses ataques. Os ricos são cada vez mais ricos, e em menor número, e os pobre se multiplicam e se tornam ainda mais pobres.

No capitalismo, o Brasil só tem este triste destino pela frente. Mas a História, por outro lado, nos mostrou como foi possível que uma ilha minúscula como Cuba se tornasse uma potência esportiva, em saúde e educação (antes de ver tudo isso retroceder nos últimos anos). Não foi com Copa do Mundo que Cuba deu este salto. Da mesma forma como países de economia rural e atrasada, como a China e a Rússia viraram potências sem sediarem evento nenhum. O que fez estes países avançarem foram revoluções socialistas, em que o Estado passou ao controle operário, mesmo que burocrático, e conquistas sociais foram arrancadas através da expropriação burguesa.

Um Brasil potência é possível... só se for socialista, e como parte de uma mudança internacional.

Movimento Revolucionário
http://movimentorevolucionario.org/ct/ct25/brasilsuperpotencia.html

Duas faces da mesma moeda: Fórum Econômico Mundial e Fórum Social Mundial fracassam ao tentarem propor alternativas dentro do capitalismo

No aniversário de uma década do Fórum Social Mundial (FSM), que ocorre sempre no mesmo período que o Fórum Econômico Mundial, ambos encontros globais tiveram suas piores realizações, com números baixíssimos de comparecimento, esvaziamento político e insignificância dos debates e decisões.

Depois de nascer como uma forma de dar vazão ao sentimento antiglobalização capitalista, e de crescer com a presença de ativistas antiimperialistas, o FSM acabou. Em 2001, ano de sua 1ª realização, em Porto Alegre, o Fórum ainda era visto como um contraponto às decisões dos poderosos, tomados em Davos, no Fórum Econômico Mundial (FEM). Na época, líderes do PT (Brasil), Frente Ampla (Uruguai), e diversos outros defensores da “humanização do capitalismo”, bradavam que “Um outro mundo (era) possível”.

Apenas 2 anos depois, na mesma cidade, Lula e o PT já eram governo no Brasil, e o presidente eleito surpreendia e irritava os participantes do Fórum Social ao anunciar que, depois, iria ao Fórum Econômico em Davos. Naquele momento, Lula já deixava claro que num e noutro evento nada de diferente iria ser proposto, e que não fazia diferença que mudassem os governos ou em que Fórum estivesse.

Ali ficou provado que eles são todos iguais e que nenhum outro mundo é possível dentro do capitalismo. Lula, Tabaré Vázquez (Uruguai), Evo Morales (Bolívia), Bachelet (Chile), etc., foram eleitos e nada de significativo mudou, nem no mundo, nem sequer em seus países. Passados 10 anos, a máscara dos Fóruns caiu, e, para os trabalhadores, não faz mais nenhum sentido suas existências.

Fórum dos ricos: banqueiros ainda desnorteados após o pior da crise

O Fórum Econômico Mundial, que tradicionalmente ocorre em Davos, na Suíça, nesta edição demonstrou os descaminhos que a burguesia está atravessando nesse momento, onde mesmo que os rumos da economia estejam retornando precariamente aos eixos, ainda está longe de ser o que era.

Este ano, mesmo com o “pior da crise” tendo passado, e à volta à cena dos banqueiros, escondidos em 2009, o comparecimento de nomes consagrados foi muito grande, e o evento foi caracterizado por representantes e substitutos. Em 2008 e 2009, os banqueiros e políticos fugiram dos debates, preocupados em deixar a “poeira baixar”, e negociar trilhões de dólares públicos, sem chamar a atenção. Agora, mesmo com a saída das sombras, essas figuras ainda têm de moderar seus discursos, pois sabem do ódio que a maioria do mundo ainda sente por eles, os culpados pelos milhões de desempregados, endividados e despejados.

O grande assunto de Davos neste ano foi o que se fará para reconstruir a economia capitalista daqui em diante. Até mesmo a burguesia e seus analistas reconhecem, portanto, que a economia está longe de ter se recuperado, e que o capitalismo é que está na berlinda.

E todo esse debate, acerca dos rumos a se seguir, está explicitamente impresso no próprio lema do Fórum: “Melhorar o estado do mundo: repensar, redesenhar, reconstruir”. Tudo isso para tentar demonstrar que os banqueiros se preocupam com o estado deplorável com que as maiores economias se encontram. Mas, na verdade, o que se está demonstrando é que a burguesia pouco se importa com os rumos globais, já que nenhuma medida prática, que chegue perto de pôr fim à crise e as instabilidades políticas e econômicas acabem.

Na realidade, não há nada que os teóricos burgueses e os grandes patrões possam fazer: o capitalismo está falido historicamente. Seus planos e debates se resumem a ver como podem adiar o colapso e fazer com que sejam os trabalhadores a pagar por seus efeitos.

Soluções de “faz de conta”

O grande centro dos debates ocorridos em Davos ficou em torno das polêmicas regulamentações do mercado financeiro. Desde 1944, com o acordo de Bretton Woods, após a 2ª Guerra Mundial, não se discutia a necessidade de mudanças tão drásticas nas políticas econômicas dentro do capitalismo. Mais uma vez, diante da destruição de forças produtivas e de sua saturação no capitalismo, o Estado se vê obrigado a regular o mercado.

No entanto, em 1944, se visava reerguer a economia capitalista, após ela ser totalmente destruída pela guerra; e também evitar que as organizações operárias tomassem o poder. Era o famoso “medo do comunismo”... Neste período, o capitalismo precisou, e ainda pôde, conceder muitos benefícios sociais aos trabalhadores, com o objetivo de acalmar as lutas e “dar alguma coisa para não perder tudo”.

Hoje, há 2 fatores que são ainda mais graves no papel nefasto que cumpre o capitalismo. O 1º deles é que não existiu nenhuma guerra em proporções mundiais, com toneladas de bombas caindo, milhões de mortos e a destruição física de fábricas, estradas, pontes, hospitais, plantações, etc. Foi a superprodução de mercadorias, assim como tinha sido em 1929, e a anarquia da produção combinada com o crescimento fictício do consumo baseado em crédito (leia-se endividamento), que criaram as “bolhas” financeiras e imobiliária, que levaram à crise mundial.

O 2º fator é que, além de ainda mais visivelmente a crise atual ser decorrência do capitalismo, a situação atual não permite que haja investimentos massivos em concessões sociais ou obras públicas, por exemplo. Após mais de 60 anos da última “reconstrução e redesenho” capitalistas, a burguesia está num beco sem saída, e não é capaz de evitar uma nova crise e novos protestos violentos contra seus governos.

Mudando de tema, a burguesia internacional, além da crise, também debateu o meio-ambiente em Davos. Outro fracasso! Podemos dizer que já está colecionando eventos em que se discute muito e nada é resolvido.

Foi assim na COP-15, conferência mundial para debater as questões ambientais, principalmente as climáticas; e agora novamente em Davos. Nem mesmo Barack Obama, aparentemente demonstrando iniciativa de regular mais o mercado, com diversos mecanismos que impedissem o excesso de crédito, foi diferente. A inadimplência da população e o endividamento recorde dos países voltam a conturbar toda a economia; mas nem mesmo isso bastou para que se definisse alguma medida.



Fórum dos pobres: a burguesia fica muda, os ativistas de esquerda ficam quietos

O Fórum Social Mundial nasceu para ser o contraponto ao Fórum de Davos. Enquanto a burguesia se reunia para discutir as medidas necessárias para manter a sociedade do mesmo jeito, o FSM se propunha a reunir os ativistas e militantes que buscavam “um outro mundo possível”.

Porém, mesmo o Fórum tendo nascido anunciando esse intuito, a direção do evento, desde o início composta de modo policlassista, por empresários (como Oded Grajew), grupos econômicos imperialistas (como o Le Monde) e organizações oportunistas e burocráticas (como o PT), nunca permitiram que a base realmente antiimperialista decidisse alguma coisa.

A experiência negativa com governos que só eram diferentes nos discursos dos tempos de oposição, e a ausência de propostas nos encontros, fizeram com que cada vez menos ativistas dedicados à mudança social vejam o Fórum como uma verdadeira expressão de um encontro que busca uma mudança.

Os números mostram isso: o FSM já teve uma marcha de abertura com mais de 200 mil pessoas em 2005, e este ano teve pouco mais de 10 mil, na sede de Porto Alegre. Qualitativamente, foi pior ainda: a maioria era de militância paga por centrais sindicais de direita ou ligadas, de alguma maneira, às políticas governistas. Eram os casos da CUT, Força Sindical, CTB, etc.

.Ao contrário de alguns militantes que pensam que o FSM se perdeu, a própria essência da constituição do FSM é a busca por reformar o capitalismo. Desde sua 1ª edição, nas entrelinhas, ficava claro que se podia explorar, mas não tanto; que se podia degradar a natureza, mas não tanto; etc.

Todas as questões discutidas, na verdade, giram em torno da existência do capitalismo; e, para que uma melhora para a humanidade seja efetivamente conquistada, somente lutando para acabar com o capitalismo.

E Lula dessa vez foi nos dois Fóruns como nos outros anos?

Lula, “o cara” do imperialismo, discursou para 10mil pessoas em Porto Alegre, em mais uma aparição escancaradamente eleitoreira, onde falou aos presentes todas as maravilhas que aplicou em seus dois mandatos... Além disso, aproveitou para declarar que Davos tinha perdido o glamour, numa gesto patético de tentar dizer que, no fundo, prefere o FSM.

Enquanto isso, na cidade suíça, era dado a ele o prêmio de estadista global, que Meirelles, o tucano neoliberal, nomeado e mantido como presidente do Banco central dos 8 anos de Lula, recebeu em seu nome. Um prêmio dos maiores banqueiros do mundo, concedido pelos méritos e serviços prestados aos homens que criaram a crise, que demitiu milhões de trabalhadores.

O que se torna evidente diante dos dois encontros – o dos ricos e o dos pobres - é que tanto um quanto o outro estão falidos e não respondem à realidade. Está na hora dos trabalhadores assumirem o controle de seu próprio caminho e fortalecerem suas lutas e resistência com a unidade nas ruas e a formação de estruturas populares e operárias de massas, em combinação com a luta por uma nova direção para os trabalhadores. Estes devem ser nossos fóruns e esse é o caminho para outro mundo!

Anistia não esgota problemas enfrentados por imigrantes

Reportagem originalmente publicada no site Repórter Brasil

Com tantas anistias desde a década de 1980, por que os imigrantes ilegais ainda são uma realidade? Razões profundas e complexas ajudam a explicar a dificuldade para garantir os direitos daqueles que escolhem viver no Brasil

Por André Campos*

"Defendemos que a questão da migração irregular tem aspectos humanitários e não pode ser confundida com criminalidade" . Pontuada por declarações como essa, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou, em julho do ano passado, a Lei 1.664/2009, mais conhecida como Lei da Anistia Migratória, que autorizou a regularização dos estrangeiros que estavam em situação ilegal e tinham entrado no Brasil até 1º de fevereiro de 2009.

O prazo para a obtenção do visto provisório de dois anos junto à Polícia Federal se estendeu praticamente por todo o segundo semestre de 2009. Informações divulgadas pelo Ministério da Justiça em janeiro deste ano indicam que mais de 40 mil estrangeiros foram beneficiados. Segundo projeções iniciais do órgão, em meados de 2009, cerca de 50 mil pessoas poderiam ser beneficiadas - outras fontes, no entanto, estimavam à época em até 200 mil o número de estrangeiros em condição irregular no país.

São imigrantes de diversas regiões, como África, Ásia, Europa e, principalmente, América Latina. Muitos buscam melhores condições de vida e trabalho, mas também há casos como o daqueles que fogem de conflitos em outros países e os que abandonam nações ricas para viver no Brasil.

A anistia do ano passado não foi a primeira realizada pelo Brasil - em 1981, 1988 e 1998 também foram implementadas políticas do gênero. O Acordo Bilateral Brasil-Bolívia, firmado em 2005, também facilitou a regularização de imigrantes do país vizinho. A mais recente ação nesse campo é o Acordo sobre Residência para Nacionais dos Estados Partes do Mercosul, Bolívia e Chile, promulgado em outubro de 2009, que torna possível a concessão de visto de dois anos a qualquer um dos nacionais que, estando em seu país de origem, deseje estabelecer- se no território de outra parte.

Com tantas iniciativas sazonais para tirar estrangeiros da clandestinidade, por que os imigrantes indocumentados ainda são uma realidade no Brasil? Falta de divulgação de anistias e acordos, burocracia para acessar tais benefícios e novas levas migratórias ajudam a explicar o fenômeno.

Há, no entanto, outras razões mais profundas. É preciso levar em conta que esses regulamentos oferecem uma legalização com os dias contados. São vistos temporários. A obtenção do documento permanente depende da comprovação de profissão ou emprego lícito. Algo distante de uma grande massa de imigrantes em condição precária que ganham a vida em atividades associadas ao mercado informal, como o comércio ambulante e as pequenas confecções.

"Clandestino e informal são duas categorias que andam juntas", explica o padre Mário Geremia, do Centro Pastoral do Migrante (CPM) em São Paulo (SP). A informalidade empurra estrangeiros de volta à situação de indocumentados, que, por sua vez, veta o acesso ao mercado formal.

"A verdade é que acordos e anistias são paliativos", analisa o padre. A informalidade e a clandestinidade mantêm na sombra violações de direitos humanos, pois muitos temem ser deportados caso denunciem trabalho degradante e escravo ou mesmo o tráfico de pessoas.

Essa conjuntura reforça a urgência de ações amplas para integrar os imigrantes para além da regularização em termos legais. Trata-se de uma tarefa complexa, que esbarra simultaneamente em dificuldades impostas pela legislação em vigor e na negligência com relação a direitos também garantidos por lei. Na prática, multiplicam- se situações que demonstram que, apesar dos discursos elogiosos à política imigratória, há muito a ser feito para garantir um tratamento verdadeiramente digno aos que migram para o Brasil.

Oficinas dos "patrícios"

O setor de confecção é o ganha-pão de grande parte dos imigrantes que entram ilegalmente no país. Notadamente na capital paulista operam diversas das pequenas oficinas que empregam bolivianos, paraguaios, peruanos e asiáticos, entre outros. São locais frequentemente improvisados, onde residência, refeitório e ambiente de costura confundem-se num só recinto, em geral comandado por um "patrício" já há mais tempo em terras brasileiras.

Essas oficinas, em geral, são fornecedoras terceirizadas - quando não quarteirizadas ou quinterizadas - de confecções donas de marcas próprias. Além de informais, apresentam problemas de segurança, higiene e trabalho excessivo, num arranjo em que os costureiros recebem por peça produzida. Em casos mais graves, há inclusive restrição à liberdade dos trabalhadores. Um exemplo típico é a coação para que fiquem presos ao serviço até pagar supostas dívidas da viagem ao Brasil, financiada pelo "oficinista" - como é chamado o dono desses pequenos empreendimentos.

"Não é mais possível continuarmos com esse sistema de pagamento por produção e trabalho das 7 horas da manhã às 10 horas da noite", afirma Renato Bignami, auditor fiscal da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do estado de São Paulo (SRTE/SP). Em julho de 2009, o órgão lançou, juntamente com outras entidades, o Pacto Municipal Tripartite contra a Fraude e a Precarização, e pelo Trabalho e Emprego Decentes em São Paulo. Por meio de negociações com outros elos da cadeia produtiva, a articulação quer criar um ambiente propício para que as pequenas oficinas saiam da informalidade - proporcionando aos trabalhadores, dessa forma, o emprego lícito que abre as portas para o visto permanente.

A Associação Brasileira de Coreanos, uma das entidades signatárias do pacto - os coreanos são donos de muitas das confecções que repassam serviços -, se comprometeu a orientar para que as encomendas sejam expedidas apenas para oficinas que operam legalmente. A Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomercio) buscará certificar empresas com o Selo Fecomercio de Qualidade - que visa promover a sustentabilidade e a inclusão social em cadeias de distribuição. Outras ações da articulação preveem a capacitação de "oficineiros" para que regularizem seus negócios.

Devido aos custos tributários e trabalhistas, um dos principais obstáculos à formalização é a pequena margem de lucro desses empreendimentos. Por conta disso, Renato defende a união da categoria para negociar melhores preços com seus clientes - objetivo que esbarra na pulverização desse mercado e na falta de comunicação entre oficinistas de diferentes nacionalidades. "Se não houver uma organização que surja da base, o Estado não vai conseguir dar dignidade a esses trabalhadores" , diz. Os obstáculos para que isso ocorra, porém, não são apenas culturais e práticos. O próprio Estatuto do Estrangeiro - principal marco regulatório sobre a situação legal dessas pessoas - proíbe a participação de não nacionais em sindicatos ou associações profissionais.

Além disso, essa lei também veta ao imigrante titular de visto temporário "estabelecer- se com firma individual, ou exercer cargo ou função de administrador, gerente ou diretor de sociedade comercial ou civil". Isso afeta, por exemplo, pessoas como o boliviano Carlos Aguilera (nome fictício), há sete anos no país. Beneficiado pelo Acordo Bilateral Brasil-Bolívia, ele diz que, ao tentar formalizar sua confecção - onde trabalham outros quatro estrangeiros - obteve uma negativa da Junta Comercial devido à proibição. Com isso, queixa-se inclusive de ter perdido clientes não mais interessados em manter relações informais. "Eu gostaria, um dia, de ter um trabalho próprio, vender as minhas roupas no comércio. Mas desse jeito não há como", afirma. Segundo entidades ligadas aos imigrantes, o problema atinge diversos oficinistas - entre eles pessoas beneficiadas pela recente anistia.

Publicada no Diário Oficial da União (DOU)** em 5 de fevereiro de 2010, a Instrução Normativa (IN) 111 do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC) determina que as juntas comerciais devem aceitar solicitações de abertura de empresas de nacionais do Mercosul, Chile ou Bolívia, ainda que os mesmos tenham apenas a residência provisória.

Estatuto em descompasso

Em julho de 2009, o Planalto enviou à Câmara dos Deputados uma proposta para substituir o atual Estatuto do Estrangeiro, aprovado em 1980, ainda durante a ditadura militar. Ela remove o veto à abertura de empresas pelo imigrante temporário e assegura direitos de associação e sindicalização mais amplos. "Quando da promulgação dessa lei, o foco era precipuamente a segurança nacional", destacou o ministro da Justiça, Tarso Genro, em mensagem encaminhada ao Congresso. "Essa realidade, nos dias atuais, encontra-se em descompasso com o fenômeno da globalização."

Há também queixas quanto aos trâmites para estrangeiros que chegam para trabalhar no Brasil já com contrato firmado no país de origem. "Cada visto demora no mínimo três meses, e é preciso pagar de US$ 1,5 mil a US$ 3 mil a um despachante, devido à complexidade da papelada exigida", informa o deputado federal William Woo (PPS-SP). Autor do projeto de lei que deu origem à última anistia, ele também propõe, no Congresso Nacional, uma nova legislação que garanta às companhias que operam no país a concessão automática de vistos de trabalho a estrangeiros numa proporção de até 5% sobre o total de funcionários brasileiros.

No caso dos sul-americanos, o Conselho Nacional de Imigração (CNIg) - órgão que coordena e orienta as atividades de imigração - publicou norma em outubro de 2008 que reduz, durante dois anos, a burocracia para emitir vistos de trabalho. Além disso, ela torna a concessão automática, para esse grupo específico, quando há vínculo com empresa estabelecida no Brasil. A autorização padrão resulta de análise do Estado e tende a ser concedida apenas quando não há mão de obra nacional equivalente.

"Eu acho isso fantástico, é uma abertura em prol dos estrangeiros" , avalia o advogado Grover Calderón, presidente da Associação Nacional de Estrangeiros e Imigrantes no Brasil (Aneib). Segundo ele, no entanto, falta ainda uma melhor divulgação desse benefício.

Para além da esfera trabalhista, outros aspectos burocráticos da vida dos imigrantes geram descontentamento. Segundo Grover, a obtenção da segunda via do Registro Nacional de Estrangeiro (RNE) - documento equivalente ao RG dos nacionais - chega a demorar até oito meses. Lentidão semelhante enfrenta quem entra com pedido de residência permanente por ser casado com pessoa de nacionalidade brasileira ou ter filho natural do país - situações previstas em lei. "Espera-se até um ano e meio para receber o documento", reclama. Durante esse período, as pessoas ficam apenas com um protocolo, que não é aceito pela maioria das instituições públicas e privadas. "Consequentemente, ele não pode abrir uma conta corrente, tirar uma carteira de motorista e, às vezes, nem mesmo obter uma carteira de trabalho com facilidade".

Dificuldades adicionais

Estrangeiros também enfrentam obstáculos para ocupar postos de emprego em órgãos estatais - direito já previsto na Constituição, que atesta serem acessíveis tanto a brasileiros quanto a estrangeiros os cargos e funções públicas. Apesar disso, editais de concursos permanecem exigindo nacionalidade brasileira, situação que, de acordo com Paulo Sérgio de Almeida, presidente do CNIg, ainda ocorre por falta de uma lei que regulamente esse dispositivo constitucional. "Atualmente, apenas universidades e centros de pesquisa públicos podem contratar estrangeiros, desde que sejam professores, cientistas ou exerçam ocupação correlata", informa.

No momento, a Aneib é parte em um processo judicial contra o Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) e o Conselho Federal de Medicina (CFM) que pleiteia ao médico estrangeiro o direito de votar e ser votado nas eleições para representantes do colégio profissional - algo que já acontece, por exemplo, na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). As normas do CFM vetam tal participação, com base em trechos do Estatuto do Estrangeiro que proíbem aos imigrantes envolver-se em atividades de natureza política. Segundo o Cremesp, somente em São Paulo há cerca de 1,7 mil médicos naturais de outros países registrados na entidade.

O acesso ao ensino é outro ponto polêmico. Invocando o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a Secretaria Estadual de Educação paulista aprovou, em 1995, uma resolução que orienta as escolas a aceitar a matrícula de filhos de imigrantes - postura seguida pela rede municipal.

Apesar dos avanços, ainda há relatos de dificuldades na hora da matrícula - fato corroborado, em 2006, pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) municipal instalada para apurar violações de direitos humanos de imigrantes. Os problemas tendem a ser ainda piores em outras regiões do país. "Por aqui, muitas vezes a matrícula só ocorre quando há intermediação nossa com as autoridades" , afirma Rosa Maria Zanchin, coordenadora da Rede Solidária para Migrantes e Refugiados em Manaus (AM).

Com o objetivo de reivindicar direitos e força política aos estrangeiros, o acesso ao voto é uma das bandeiras de lideranças dos imigrantes. De autoria do senador Alvaro Dias (PSDB-PR), tramita atualmente no Congresso uma proposta de emenda constitucional que faculta a participação daqueles domiciliados no Brasil em eleições municipais, tanto na qualidade de eleitores como de candidatos a vereador. Dispositivos similares já vigoram em países como Suécia, Irlanda e Holanda.

Em 2001, uma proposta semelhante de Alvaro Dias chegou a ser votada em primeiro turno no Senado. Teve 42 votos favoráveis e quatro contrários, mas foi rejeitada porque 28 parlamentares estavam ausentes na seção que a apreciou - seriam necessários três quintos dos votos em relação ao total de senadores para a aprovação. "Com quórum maior, provavelmente a iniciativa teria sido acolhida", justifica o senador. Polêmica, a medida não é unanimidade nem mesmo entre políticos ligados aos imigrantes. "Quem quer escolher os governantes tem de adotar a pátria", afirma William Woo, defendendo o voto apenas para os naturalizados brasileiros.

"Pouco se discutem os direitos dos estrangeiros. Falta interesse", argumenta Grover, da Aneib, que defende o direito ao voto. No entanto, ao mesmo tempo em que há imigrantes lutando pela integração, muitos estão no Brasil com mentalidade distinta: juntar dinheiro para voltar, o quanto antes, à sua terra de origem. Segundo Sidnei Dornelas, pesquisador do Centro de Estudos Migratórios (CEM), isso ajuda a explicar a sazonalidade nas migrações, por exemplo, dos trabalhadores de confecções - setor que, usualmente, opera a todo vapor nas proximidades das festas de final de ano. "Há outras épocas do ano em que muitas pessoas vão embora", ilustra.

Entre os que vêm pensando em voltar, há os que permanecem ilegais para poupar gastos com documentos e evitar encargos trabalhistas. "Eles não enxergam a questão mais ampla. A informalidade impede a ascensão social e mantém guetos", frisa o padre Mário. Com isso, nutrem cadeias clandestinas fundadas na concorrência desleal que corroboram para manter condições de trabalho precárias para estrangeiros e brasileiros.

*Matéria produzida em parceria com a revista Problemas Brasileiros

Fonte: http://www.cartacap ital.com. br/app/materia. jsp?a=2&a2=6&i=6226

terça-feira, 30 de março de 2010

Pe. Sidney novo assessor da CNBB para mobilidade humana e missão continental

www.cnbb.org.br

“O Brasil na Missão Continental” e Setor Mobilidade Humana, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) conta com um novo assessor. Trata-se de padre da Congregação de São Carlos (Scalabrinianos), Sidnei Marco Dornelas. Nascido em 15 de julho de 1961, padre Sidnei é natural de São Bernardo do Campo (SP). Ele foi ordenado em 1988, e trabalhava no Centro de Estudos Migratórios, desde 1993, em São Paulo (SP).

Em seu novo trabalho, ele vai ajudar a refletir e a dinamizar o trabalho dos setores sobre a questão da mobilidade humana. No Projeto “O Brasil Missão Continental”, ele vai desenvolver uma assessoria voltada particularmente para a mobilidade humana. Ele também vai colaborar no desenvolvimento de subsídios e assessoria em encontros. O novo assessor sucede no Setor Mobilidade Humana a padre Cláudio Ambrósio, que passou dois anos no cargo.

Na Missão Continental ele vai trabalhar diretamente com o assessor da Comissão Episcopal para a Ação Missionária e Cooperação Intereclesial, padre José Altevir da Silva; o subsecretário adjunto de Pastoral da CNBB e assessor do Projeto O Brasil na Missão Continental, padre Ademar Agostinho Sauthier; e com o diretor do Centro Cultural Missionário (CCM), de Brasília, padre Estevão Raschetti.

Padre Sidnei foi nomeado no dia 11 de março, último dia da reunião do Conselho Permanente da CNBB.

A Páscoa é nossa vocação

A partir da paixão, morte e ressurreição de Jesus Cristo se fortalece a convicção dos vocacionados e vocacionadas que, confirmados em sua vocação, são enviados à missão

A Páscoa é nossa vocação, tanto no sentido de passagem ou êxodo rumo à terra prometida, quanto no significado de uma vida nova que brota no coração que celebra, na intensidade litúrgica, o mistério da morte e ressurreição do Senhor. É exatamente esta acentuada tonalidade pascal de nossa vocação e missão que desejamos meditar neste espaço.

Fora da esfera da Páscoa de Jesus Cristo nenhuma vocação encontra sentido e muito menos a nossa de consagrados e consagradas. Seríamos seguidores e seguidoras de um jovem crucificado, portador de nobres ideais, mas que jazia no túmulo frio onde repousava um corpo sem vida e abatido diante do triunfo da morte, expressão do egoísmo, da injustiça e de outras maldades.

A Páscoa é a festa da vida. A partir da Páscoa de Jesus Cristo temos a plena convicção de que somos vocacionados seguidores do crucificado ressuscitado, que nos confirma na vocação e nos envia à missão. Ambas, vocação e missão, são sinais de vida e estão à serviço dela.

A vocação como experiência da cruz
Desde o chamado de Deus e do sim que pronunciamos em nossa resposta vocacional percebemos a presença da cruz (Jo 15,20). Nosso sim, contrariando talvez as próprias expectativas, não nos isenta do sofrimento e de tantas contradições. A resposta generosa ao chamado de Deus que renovamos no cotidiano da vida bem que poderia ser a garantia de que a cruz estaria sempre longe dos vocacionados, e a certeza da ausência de qualquer contradição que manifestasse nossa fragilidade e incoerências. Mas nada disso acontece. Antes, a fragilidade nos acompanha ao longo do caminho vocacional que vamos trilhando no dia a dia da história.

Muitos pensam que os vocacionados, por causa da generosidade de sua resposta e da grandeza de sua opção vocacional, são poupados da cruz que se manifesta nas situações difíceis da aventura humana. Mas sabemos pela própria experiência que a realidade não é bem assim. Nossa vocação passa de alguma maneira e de diferentes formas pelo monte calvário, onde fora crucificado o Mestre que seguimos. Por mais radical que seja a nossa opção vocacional e por mais profunda que seja a entrega incondicional do vocacionado à causa do reino, ainda assim, ninguém esta isento da cruz. Mas isso não é motivo de desânimo nem justificativa para rever a opção ou mudar a direção do caminho.

Na realidade, os sofrimentos e as contradições que enfrentamos no desenvolver e na vivência de nossa vocação nos aproximam de Jesus crucificado e nos permitem aprofundar o sentido de nossa opção e suas conseqüências para a sociedade, para a Igreja e para o reino. De outra parte, devemos ter medo de uma vocação sem cruz, sem sofrimentos e dificuldades. Isso poderia ser sinal de comodismo, de indiferença aos problemas do mundo e claro sinal da ausência do profetismo que caracteriza a vocação dos seguidores de Jesus Cristo.

Uma vocação sem cruz certamente esta longe da radicalidade evangélica de amor incondicional aos irmãos, principalmente aos menos favorecidos, e da defesa da justiça. Deus nos livre de uma vocação tipo “mar de rosas”, sem dificuldades, doce, tranqüila e bastante cômoda e repleta de certezas. Antes, pedimos a Ele a força da fé, a sabedoria no discernimento constante e a humildade para enfrentar as cruzes com fidelidade evangélica e olhando sempre para o Crucificado, que nos ensina a levar a cruz com o coração amoroso e não com os ombros de um escravo. Pois levá-la com os ombros seria experimentar a escravidão, sentir o peso de um castigo que é desconhecido pelos vocacionados, que carregam o madeiro com a força que vem do coração, dispostos a seguir Jesus a qualquer preço e sem nenhuma condição ou pedido de recompensa.

A realidade pascal da vocação
Se a cruz de uma ou de outra maneira marca o caminho de cada vocacionado, que desde a própria fragilidade busca ser “luz do mundo e sal da terra” (Mt 5,13.14), ela também nos prova e nos permite dar testemunho de adesão amorosa e fiel ao evangelho de Jesus Cristo. Por isso, não temos nenhuma dúvida em afirmar que a vivência de cada vocação comporta uma experiência pascal. Nela vivemos situações de cruzes e dificuldades, mas também recebemos a graça de uma vida nova que nos permite sentir o gosto da vitória de Cristo Ressuscitado.

Cada dia nos é oferecida a oportunidade de dar testemunho de Jesus Cristo e de ratificar nossa opção vocacional. Sacerdotes, religiosos ou cristãos leigos, todos somos chamados a repetir a experiência dos discípulos de Emaús e a caminhar com o Ressuscitado que nos acompanha, mesmo quando o coração está ferido ou decepcionado e chega a pensar que já não há mais espaço para a esperança (Lc 24,13-35).

Nem a cruz, nem qualquer outra contradição e dificuldade, poderá nos afastar do amor de Cristo (Rm 8,35). Esta é a convicção do apóstolo dos gentios que também bate em nosso coração vocacionado e pascal. Caminhamos com plena certeza de que o Ressuscitado nos acompanha e nos abençoa na vivência vocacional e no desenvolvimento de nossa missão (Mt 28,19-20). Aquele que nos chamou para segui-lo, deixando as barcas e as redes para trás (Mc 1,16-20), é o mesmo que nos oferece garantias de que estará sempre conosco pelos caminhos da Galiléia (Mc 15,7), deste novo tempo marcado pelos desafios da ideologia neoliberal e da globalização.

Páscoa é vida nova para todos nós, qualquer que seja a vocação abraçada, à qual nos esforçamos para viver plenamente no interior de nossas comunidades. Nesta solenidade de cruz e ressurreição, todos são chamados a renovar a opção vocacional e a dar testemunho transparente de Jesus Cristo vivo dentro de nós e no meio do mundo. Podemos até sentir o peso da cruz e cansar ao longo da caminhada, mas não temos motivos para nos desanimar se nossa fé aponta para o Ressuscitado, que não nos abandona em meio às tribulações da história e nem nos deixa sozinhos na missão.

A vocação como Páscoa (êxodo - passagem)
Se a opção vocacional sempre exige uma ruptura, um êxodo ou uma passagem de uma para outra realidade, podemos então confirmar que a experiência vocacional tem algo pascal no sentido de busca da terra prometida, conforme experimentou o povo de Deus sob a liderança de Moisés (Ex 3). Tal experiência, de saída da situação de escravidão no Egito em direção à “terra do leite e mel”, acontece com cada vocacionado. Ao escutar e responder ao chamado vocacional, deixamos uma determinada situação e nos colocamos a caminho na esperança de realizar nossos sonhos e de concretizar a vocação recebida como dom. Na dinâmica vocacional de chamado-resposta há sempre uma experiência de êxodo, que nem sempre é fácil e para uns custa mais do que para outros. Assim deparamo-nos com outra realidade inerente a toda vocação: a coragem do êxodo.

O chamado vocacional exige esta capacidade de sair, deixar e partir, a exemplo do velho Abraão (Gn 12). Bem verdade, na vivência de nossa vocação, qualquer que seja ela, há sempre a necessidade de sair, mudar e partir. Às vezes, trata-se de uma experiência histórica no sentido de deixar um lugar, uma casa e uma comunidade para ir rumo a novas e desafiadoras realidades. Outras vezes, devemos fazer um êxodo espiritual, deixar antigas maneiras de viver nossa opção e buscar um jeito novo, que traz oxigênio para nosso espírito e coração. Se nos acomodamos e perdemos a capacidade de fazer os necessários êxodos vocacionais e missionários, corremos o risco de ficar repetindo os velhos esquemas, dizer sempre as mesmas coisas e esquecer de avançar para as águas mais profundas de nossa opção vocacional.

Neste sentido, também meditamos a Páscoa situando-a no âmbito das diversas passagens que somos chamados a realizar ao longo do caminho vocacional que percorremos. São passagens ou êxodos que nos permitem aprofundar o significado da Páscoa e nos chamam à conversão. Cada êxodo que fazemos, mesmo se por caminhos que cruzam o deserto, nos oferece a oportunidade de testemunhar o Ressuscitado e assinalar a Páscoa definitiva de nossa vocação.

Chamados a dar testemunho do Ressuscitado
Nossa vocação cristã no atual contexto histórico é um compromisso a ser, mais que em outros tempos, aqueles que testemunham e anunciam a boa notícia de Jesus Cristo vivo no meio do mundo. Em outras palavras, podemos afirmar que nossa vocação coincide plenamente com a esperança e com a fé alicerçada em Deus, que guia a história e nos chama a conduzi-la pelos caminhos do evangelho.

Nossa vocação, em última análise, é dar testemunho da ressurreição do Crucificado e caminhar até a total realização do reino. Desta maneira, celebrar a Páscoa do Senhor é para nós, vocacionados e vocacionadas, a graciosa oportunidade de repetir o gesto do jovem Tomé de tocar com as próprias mãos o Cristo ressuscitado. Como ele, também nós, na fragilidade da fé, carregamos as dúvidas, dentre outros sinais de incredulidade. Mas também temos, ao lado de nossas fraquezas, a força da fé que nos faz testemunhas de Jesus e construtores de seu reino.

Não somos seguidores de um fantasma, e muito menos de um magnífico discurso ou teoria religiosa. Quem nos chamou, e aquele ao qual seguimos, não é outro senão Jesus Cristo, morto e ressuscitado, que nos confirma no seguimento e nos antecipa na missão de construir o reino. Esta é a fé que transborda em nosso coração vocacionado neste tempo pascal que celebramos com amor e esperança. Aqui fincamos as raízes mais profundas de nossa vocação, que se realiza em meio às adversidades e cruzes até à Páscoa definitiva de cada vocacionado em Cristo.

Vida nova para todos vocacionados
A participação junto com nossas comunidades na celebração do tríduo pascal, nos renova e nos dá novo ânimo na vivência da vocação a qual fomos chamados desde o ventre materno (Jr 1,5). Todos os anos, em cada Páscoa, temos a oportunidade de meditar o mistério da Páscoa de Jesus e refazer a opção vocacional diante do Ressuscitado.

A Páscoa é o melhor momento para meditar nossa vocação, aprofundar nossas opções e rever as alternativas que vamos assinalando nos passos da caminhada e no desenvolvimento de nossa missão. Nesta festa solene, que nos remete a história do antigo e do novo povo de Deus, percebemos o peso e o sentido da cruz, o vazio do sábado à beira do túmulo e a alegria da ressurreição. Não resta dúvida, que em cada Páscoa que celebramos o coração se renova, a vocação se fortalece e experimentamos a vida nova junto ao Ressuscitado.

Durante a semana santa, revivemos cada passo de Jesus, sua vida, seu ministério, a tragédia do calvário e a glória da ressurreição. Cada um destes momentos litúrgicos desperta em nosso coração vocacionado algumas dimensões, que talvez vão perdendo seu vigor no decorrer do ano em meio a tantas atividades que realizamos. Importa chegar ao domingo da ressurreição submersos pela alegria do amor, a ousadia do perdão e a força do Cristo vivo que caminha conosco como Emanuel – Deus conosco – pelos caminhos da missão (Mt 1,23; 28,20). Por isso, podemos afirmar e concluir que a Páscoa é uma festa vocacional onde cada um dos chamados renova e aprofunda sua opção pelo Ressuscitado.

Texto extraído do site
http://www.pnsg.com.br/

Chile adopta ley de protección de refugiados

SANTIAGO DE CHILE, 10 de marzo (ACNUR) - Con la sanción de la “Ley de Protección al Refugiado” en el día de ayer, se produce un importante avance en el desarrollo normativo de protección de refugiados en América Latina.

La nueva ley establece una normativa integral para regular la protección de las personas refugiadas en Chile y contempla las obligaciones internacionales contenidas en la Convención sobre el Estatuto de los Refugiados de 1951 y el Protocolo sobre el estatuto de los Refugiados de 1967. La misma establece garantías y obligaciones para el refugiado, regula procedimientos, y define lineamientos claros para la denegación o cancelación de la condición de refugiado, entre otros asuntos relevantes. La necesidad de una ley ha sido destacada en diversos encuentros internacionales así como en documentos estratégicos a los que Chile adhirió, tales como la Agenda para la Protección del año 2001, y la Declaración de México y su Plan de Acción del año 2004.

En su mensaje durante la presentación del proyecto de ley en abril de 2009, la presidenta de la nación, Michelle Bachelet, señaló: “Chile ha sido un actor relevante en esta materia, pues, por una parte, durante sus regímenes democráticos, ha otorgado protección a miles de refugiados que han buscado en nuestro país un lugar seguro donde vivir y trabajar; y, por otra, cuando el Estado de Derecho fue ignorado, varios miles de chilenos recibieron protección de diferentes países, de todos los continentes, con gobiernos de distintas tendencias políticas.”

En la actualidad hay en Chile cerca de 2000 solicitantes de asilo y refugiados, los que provienen de más de 30 países.

En 1999, el Gobierno de Chile y ACNUR firmaron un acuerdo marco para iniciar el programa de reasentamiento. Con este paso, Chile se convirtió en el primer país de Sudamérica en tener un programa de reasentamiento. Luego Brasil, Argentina y Uruguay iniciaron un programa similar al que muy pronto se sumará también Paraguay.
La concreción de este largo proceso que ayer concluyó con la aprobación de la ley en Chile, es un indicador más de la voluntad política y el compromiso humanitario que existe en la región para con la problemática de las personas refugiadas.



© ACNUR/ I.Carmona / D.Guerrero La presidenta Michelle Bachelet da la bienvenida a un grupo de refugiados palestinos provenientes de Irak. En 2008, un grupo de 117 refugiados palestinos fue reasentado en Chile.Este espíritu de comprensión ya se vio plasmado en la adhesión de 20 países de América Latina a la Declaración de México y el Plan de Acción, mediante el cual reiteraron su compromiso de brindar protección internacional y encontrar soluciones duraderas para los refugiados en la región. El Plan estableció acciones concretas a fin de desarrollar políticas públicas adecuadas, fortalecer el marco de protección y alcanzar soluciones en las situaciones de refugiados que América Latina enfrenta en el presente.

El marco normativo e institucional para la protección de refugiados se ha fortalecido considerablemente en la región: un importante número de países han consagrado a nivel constitucional el derecho de asilo mientras que la gran mayoría de los países latinoamericanos son partes de la Convención de 1951 y del Protocolo de 1967. La casi totalidad de los países de la región dispone de órganos, normas y procedimientos nacionales para la determinación de la condición de refugiado.

La adopción de la “Ley de Protección de Refugiados” puede ser calificada como una enorme contribución de Chile a la protección internacional de todas aquellas personas que deben huir de sus países porque sus vidas y derechos más elementales están en peligro.

Por: ACNUR

Maldita “oração da propina”

José Lisboa Moreira de Oliveira*

Todos aqueles e aquelas que estão acompanhando os escândalos de corrupção capitaneados por alguns políticos aqui do Distrito Federal devem ter visto pelo me-nos uma vez na televisão a cena da “oração da propina”. Alguns desses políticos, após terem repartido entre si a dinheirama roubada dos cofres públicos, após terem enfiado esse dinheiro nas cuecas, nas meias, nos bolsos e nas bolsas, juntaram-se para fazer uma oração de agradecimento pelo roubo que acabavam de realizar. Esse epi-sódio passou a ser chamado pela mídia de “oração da propina”, uma vez que o di-nheiro roubado provinha de propinas pagas por empresas beneficiadas por proces-sos de licitações fraudulentos.

Ora, essa maldita “oração da propina” revela uma das mais terríveis contradi-ções das religiões e, principalmente, do cristianismo. De fato, não são poucas as pes-soas que usam da religião e da oração para tirar vantagens pessoais, esconder atos desonestos e fraudar o próximo, particularmente os mais simples e mais pobres. Mesmo nos nossos dias, quando boa parte das pessoas já adquiriu mais consciência crítica, ainda é comum encontrarmos casos em que espertos e ladrões se aproveitam da boa fé das pessoas para ludibriá-las e roubá-las.

Aliás, diga-se de passagem, num mundo em que pelo menos 80% da popula-ção pratica algum tipo de religião, num país como o Brasil em que quase 93% das pessoas declaram-se adeptas de uma religião, a religiosidade tornou-se fonte de lucro para muitos malandros e exploradores. Não só as lideranças religiosas apelam para a religião com a finalidade de explorar seus fiéis e se enriquecerem. Também o comér-cio, a indústria, a propaganda, a ideologia neoliberal fazem da exploração do elemen-to religioso a “alma do negócio”.

Podemos citar alguns exemplos. Nas cédulas do dólar, moeda símbolo do neo-liberalismo e do espírito dominador dos Estados Unidos sobre o mundo, está escrita a seguinte frase; “We trust in God” (Nós confiamos em Deus). Verdadeira blasfêmia! Podemos falar de programas religiosos, veiculados na mídia, inclusive católica, feitos para extorquir as pessoas, principalmente as mais ingênuas, a fim de obterem dinhei-ro para sustentar as mordomias dos donos das emissoras e os programas de “lava-gem cerebral” montados com o deliberado propósito de enganar os simples, tirando-lhes cada vez mais a consciência crítica. Um pecado que brada aos céus!

Além disso, com frequência, vemos imagens de santos, frases bíblicas, crucifi-xos e outros símbolos religiosos em empresas, casas e carros comerciais e até em bo-tequins, conhecidos pela notória exploração dos clientes e pelas constantes fraudes e propagandas enganosas. Sem falar naquelas pessoas que costumam aparentar uma excessiva e melosa religiosidade, que, na verdade, não passa de uma fachada para enganar os outros e desviar a atenção da verdadeira identidade que está por trás da máscara religiosa (cf. Lc 20,45-47). Os recentes escândalos de padres pedófilos têm revelado essa verdade. A quase totalidade deles era extremamente conservadora, excessivamente religiosa, sujeitos amantes da batina e do clergyman, piedosos devo-tos de Nossa Senhora, extremados adoradores da Eucaristia, milagreiros, curadores, veneradores do Santo Padre e assim por diante. Tudo para disfarçar a real personali-dade criminosa de gente que abusava de inocentes, de crianças indefesas.

Portanto, a “oração da propina” feita por alguns políticos larápios do Distrito Federal revela o quanto a religiosidade continua sendo manipulada por muita gente, sem o menor escrúpulo, para encobrir roubos, fraudes e atos de safadeza. Mostra a ambigüidade da experiência religiosa e o sério risco de que a religião seja manipula-da para acobertar interesses egoístas e escusos. Demonstra a urgente necessidade de discernimento e de consciência crítica para desmascarar toda falsa religiosidade que, usando o nome de Deus em vão, busca explorar de forma abusiva a boa fé das pesso-as. Deixa evidente a obrigação que se nos impõe no sentido de arrancar toda máscara religiosa utilizada como disfarce para enganar os mais simples (cf. Mt 18,6-7). Leva-nos ao compromisso ético de recusarmos qualquer forma de participação em ativi-dades religiosas que servem apenas para “devorar os bens da viúvas” (Lc 20,47), ou seja, para roubar o que pertence aos pobres de nossas comunidades.

Infelizmente, por trás disso pode estar um grande aparato ideológico e grupos que não querem a formação da consciência crítica do povo, financiando a expansão de certas expressões religiosas que contribuem para a alienação. De fato, o método usado por determinados movimentos religiosos, leva as pessoas à suspensão total da atitude racional e dá muita ênfase ao espetacular, ao jogo emocional, ao transe, às “possessões diabólicas”, favorecendo a passividade diante da manipulação praticada por grupos politicamente e socialmente dominantes e diante das injustiças do siste-ma sócio-político-religioso, os quais, segundo o evangelista Marcos, são uma verda-deira “legião de demônios” (Mc 5,9). Neste método a instrumentalização da lingua-gem e dos símbolos é muito forte especialmente quando usados na mídia, visando o ganho de novos adeptos. O que podia ser sinal de libertação e de vida para as pesso-as pode se tornar mero instrumento de escravidão. Neste sentido se entendem muitas das críticas feitas à religião, como, por exemplo, aquelas de Feuerbach e de Marx.

Dentro desse contexto cresce a “religião de clientela” que recorre a forças so-brenaturais para tentar explicar fenômenos e situações que não precisam de explica-ções do além para ser entendidas. Desse modo a religião passa a ser uma resposta localizada para problemas localizados, perdendo a sua capacidade de ser interlocuto-ra da sociedade. No atual contexto brasileiro a maioria das expressões religiosas, in-clusive a católica, parece cair na tentação de concorrer com as outras. É a tentação da funcionalização da religião: tornar-se, simplesmente, uma prestadora de serviços reli-giosos à sociedade, esvaziando, assim, a sua dimensão de instância interpeladora. Isso aparece com muita força na chamada “teologia da prosperidade”, através da qual as religiões vão prestando serviços de acordo com as necessidades dos fiéis. São muitas as pessoas que hoje buscam esses serviços e têm encontrado um retorno satis-fatório.

O risco, portanto, é de que as religiões, para serem modernas, terminem por “vender-se” como mercadoria agradável, light, sob a alegação de que “o povo quer”. E ao tornarem-se apenas prestadoras de serviços religiosos as religiões fogem do compromisso ético, transformando-se numa espécie de suporte, de justificativa para atitudes narcisistas e para a subjetividade fechada, além de fazerem o jogo do grupo dominante que mantém 2/3 da população mundial numa situação de pobreza e 1/3 dela na mais absoluta miséria. Pode acontecer então o que Wolff chama de “religião sem o humano”, ou seja, a substituição das reais necessidades das pessoas por bens apenas aparentes e enganadores. Esta forma de religiosidade interessa aos sistemas injustos porque não oferece a possibilidade de um confronto entre as exigências éti-cas e as práticas econômicas, sociais e políticas que ameaçam a vida. Desse modo a religião contribui para que não haja responsabilidade social, reforçando e alimentan-do a exclusão social e não incentivando a solidariedade. A religião que opta por esse caminho realça excessivamente a dimensão do divino, mas, como diz Wolff, termina “dando as costas para o humano”.

Estou convencido de que, no momento, a maioria das experiências religiosas tendem a se perder facilmente no irracionalismo e na fuga da realidade. Os exemplos estão aí bem visíveis aos nossos olhos. Por essa razão, no meu entender, é indispen-sável uma crítica às religiões, a fim de ajudá-las a contribuir para que no mundo não prevaleça nem um secularismo ateu e nem um fundamentalismo alienado, mas sim uma religião que consiga comunicar às pessoas esperança, sentido para a vida, pa-drões éticos e uma firmeza para a luta e a caminhada. Permanece também o desafio de exigir das religiões verdadeira humildade, uma vez que em todas elas o problema da violência se manifesta e em todas elas a violência existe. Muitas vezes a violência é camuflada sob a aparência de obediência cega aos dogmas ou de fidelidade irracional às normas.

Não podemos esquecer, de forma alguma, que, no momento atual, precisamos de construtores de pontes capazes de transformar o potencial das religiões em ban-deiras de paz e em ações de solidariedade. Precisamos de uma religião que não sepa-re e nem divida; uma religião que una e reconcilie. Temos necessidade de uma religi-ão que ajude a ver o que é comum: sobretudo os valores éticos e as atitudes éticas; religiões que professem valores e padrões, mas que também tentem vivê-los. E gru-pos religiosos ou experiências religiosas que favorecem atitudes como a da “oração da propina”, que não denunciam estes atos religiosos imorais e desumanos, não me-recem continuar existindo. Precisamos lutar para que esses tipos de religiosidade desapareçam o quanto antes da face da terra.