sábado, 28 de janeiro de 2012

MANIFESTO EM DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS DE IMIGRANTES HAITIANOS

São Paulo, 16 de janeiro de 2012

As organizações nacionais e internacionais de apoio às migrações e grupos de pesquisa e estudo sobre as migrações sediados em diferentes universidades brasileiras têm acompanhado com apreensão a realidade enfrentada pelos imigrantes haitianos na fronteira da região norte do Brasil assim como a cobertura dada a essa realidade pela mídia brasileira e internacional. Alinhados com a necessidade de um tratamento dessa nova realidade como uma questão de direitos humanos, assim como de todos os novos fluxos migratórios que começam a se intensificar na região e no Brasil, sugerimos ao governo brasileiro que veja nesse momento a oportunidade de tornar concreta para o país e para o mundo a postura humanitária que vem demarcando o discurso e as ações governamentais no exterior em questões que envolvem relações internacionais e que tem contribuído para outorgar ao Brasil reconhecimento político e econômico no contexto internacional.
Nesse sentido, sugerimos os seguintes encaminhamentos:
1. Informar e esclarecer adequadamente a opinião pública sobre o conjunto de fatores que estão gerando a migração de haitianos, dentre os quais, de que esses fluxos migratórios não decorrem apenas dos terremotos, mas de um contexto de crise interna, tanto econômica como política, do Haiti; de que os haitianos estão deixando seu país e imigrando ao Brasil pela urgência de sobreviver; dos motivos pelos quais o governo brasileiro está concedendo vistos humanitários e não a condição de refugiados aos haitianos, etc.
2. Estimular a sociedade brasileira, através de campanhas públicas, a se engajar em ações solidárias com os imigrantes haitianos em território brasileiro, a exemplo do que já se evidenciou no amplo apoio dado pelos brasileiros ao povo haitiano após o último terremoto ou em outras tragédias e catástrofes que atingiram populações de outros países. Essas ações poderiam ser articuladas pelo governo em parceria com organizações de apoio às migrações e abranger as demandas dos imigrantes haitianos relacionadas à alimentação, emprego, moradia, atendimento médico, psicológico, jurídico, educativo, etc.
3. Sensibilizar profissionais da mídia brasileira para evitar a criação de um clima de alarme e criminalização da migração de haitianos, evitando o uso de imagens sensacionalistas e de
termos como “invasão”, “ilegalidade”, etc., conforme vem se observando em muitos materiais informativos e reportagens veiculadas sobre o assunto.
4. Rechaçar políticas restritivas e xenofóbicas que proíbam ou limitem fortemente a entrada de migrantes haitianos e gerem um clima propício à violência, à proliferação das máfias e à exploração dos trabalhadores. Analisando detidamente o exemplo de outros países que adotaram este tipo de políticas, percebe-se que não apenas o fluxo de migrantes persistiu (e em alguns casos aumentou, porque as causas da migração não são enfrentadas), como a restrição ocasionou fenômenos lamentáveis como a formação de campos de migrantes próximos às fronteiras em condições de vida indigna; a conversão do tema da migração em tema securitário e objeto de política interna suscetível à exploração assistencialista ou populista. Essas restrições provocaram a criminalização dos movimentos migratórios, colaborando, ainda, para tipificar o "delito de solidariedade", ou seja, tornar crime a ajuda ao migrante sem documentos.
5. Trabalhar em parceria com governo de países sul-americanos, com governos dos estados brasileiros e com organizações de apoio às migrações para o planejamento e efetivação de programas de acolhida e inserção dos novos imigrantes haitianos em diferentes estados e cidades sul-americanas e brasileiras.
6. Construir junto aos países de trânsito um projeto de atuação conjunta envolvendo os diferentes atores governamentais e não governamentais de modo a garantir uma migração segura. A negligência frente à repressão e à violência devem ser denunciadas e veementes rechaçadas.
7. Trabalhar em conjunto com o governo do Haiti e com organismos internacionais orientados à migração para coibir a atuação de “coiotes” nos movimentos migratórios de haitianos no Brasil e a propaganda sobre as vantagens econômicas e oportunidades de trabalho no país, especialmente relacionadas à realização da Copa do Mundo.
8. Pautar a política externa do governo brasileiro em relação ao Haiti pelo direito fundamental de respeito à soberania e autodeterminação do povo haitiano, reconhecendo a sua capacidade e defendendo a restituição da dívida histórica, social, ecológica e financeira necessária para a vida e dignidade da população do Haiti. Considerar, nesse sentido, as referências históricas do Haiti como uma nação precursora e benfeitora das lutas antiescravistas e anticoloniais em toda a região, renomado pela criatividade de seus artistas e
pela força organizativa de seu povo, que, ao longo da historia, vem suportando enormes depredações e calamidades e ao mesmo tempo demonstrando disposição para uma luta permanente e solidária na construção de alternativas frente às injustiças e adversidades.
9. Desenvolver estudos emergenciais para ouvir e conhecer as histórias de vida, realidades enfrentadas no processo migratório e na chegada ao Brasil, expectativas, formação, experiências e possibilidades de inserção dos haitianos em atividades produtivas na sociedade brasileira. Esses estudos podem ser desenvolvidos em parceria com pesquisadores de universidades que trabalham diretamente com o tema, alguns dos quais já estão atuando diretamente junto aos imigrantes haitianos na região norte do país, como é o caso do GEMA (Grupo de Estudos Migratórios da Amazônia (www.http://dgp.cnpq.br/buscaoperacional/detalhegrupo.jsp? grupo= 0082703W6Z9GQ1)
10. Avaliar continuadamente o impacto da migração de haitianos em suas relações sociais e comunitárias, de modo a produzir instâncias de mediação com a sociedade brasileira que colaborem para a promoção de relações interculturais positivas entre as culturas e para a prevenção e combate a reações de cunho xenofóbico, racista, sexista, elitista, ou qualquer outra forma de discriminação negativa e exploração indevida que possam ser dirigidas a esta população.
11. Retomar, a partir desse fluxo migratório de haitianos, o processo de formulação e aprovação de políticas migratórias com foco na inclusão e que contenham diretrizes para o efetivo enfrentamento do crescimento das migrações para o Brasil do ponto de vista dos direitos humanos. É fundamental que essa formulação conte com a participação dos migrantes, de organizações de apoio às migrações e de pesquisadores de universidades que se dedicam ao estudo do tema e sejam parte do processo de integração regional liderado pelo Brasil na América do Sul e no âmbito de iniciativas como a União das Nações Sul-americanas - UNASUL e Comunidade de Estados Latino-americanos e Caribenhos – CELAC.
Signatários:
Articulação Sul-Americana Espaço Sem Fronteirasi
Grupo de Estudos Migratórios da Amazônia, da Universidade Federal do Amazonas
Laboratório de Comunicação Social Aplicada do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro-RJ
Grupo de Pesquisa Mídia, Cultura e Cidadania do Programa de Pós-Graduação da Universidade do Vale do Rio dos Sinos - RS.
Núcleo de Antropologia e Cidadania do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Grito dos Excluídos Continental
i Rede formada por organizações de 09 países do Continente: Centro de Direitos Humanos e Cidadania do Imigrante - CDHIC, ONG Presença da América Latina – PAL, Só Direitos, Agencia Frei Tito de Comunicação - ADITAL, Associação de Arte e Cultura Andina - ALAC, Clínica Migración y DDHH Equipo Pastoral de Neuquén, Instituto Internacional de Estudios y Capacitación del Sur – INCASUR, Foro Ciudadano de Participación por la Justicia y los Derechos Humanos – FOCO, Casa Cesar Vallejo de Apoyo al Inmigrante - ACCICEV, AGORA – Paraguay, PROANDES, Consultoría para los Derechos Humanos y el Desplazamiento – CODHES, Asociación Rumiñahui, Fundación Instituto de la Mujer, Consejo Integral de Defensa de Inmigrantes Latinoamericanos – CIDIL, Centro de Derechos y Desarrollo – CEDAL, Asamblea de ciudadanos del Cono Sur – Perú, Red de Migraciones del Foro Ética & Responsabilidades (FER).

NOTA EM APOIO AOS HAITIANOS

Haiti, um país empobrecido, destruído: Historicamente o Haiti foi expropriado pelo sistema colonial. Não obstante, foi o primeiro país da América Latina e a primeira República negra a tornar-se independente. Mas, por décadas, grandes potências sustentaram ditaduras político-econômicas e desestabilizaram quaisquer iniciativas de democratização e justiça no país, inviabilizando a promoção de um desenvolvimento socioeconômico que possibilitasse vida e trabalho dignos à população. Nesse contexto, milhares de haitianos são forçados a migrar para fugir da pobreza.

Terremoto e ajuda humanitária: Em janeiro de 2010, um terremoto devastou o Haiti. Cerca de 3,5 milhões de pessoas (1/3 da população) foram atingidas e a migração se intensificou. Após o terremoto, houve uma mobilização internacional e a Organização das Nações Unidas (ONU) indicou o Brasil para coordenar a ajuda humanitária ao Haiti auxiliando na organização da infraestrutura social. Além disso, à época, o então Presidente Lula abriu as portas do Brasil aos haitianos que desejassem reconstruir suas vidas. Compromisso este mantido pela Presidenta Dilma Rouseff.

Lentidão da ajuda humanitária, discriminação internacional? Dois anos após o anúncio da ajuda humanitária internacional, muito pouco da infraestrutura social do Haiti foi recuperada. Curiosamente, EUA e Japão que também sofreram catástrofes, se recuperaram rápido. Isto sugere algumas questões. A lentidão da ajuda humanitária ao Haiti estaria relacionada à negritude do seu povo? Discriminação internacional? Que papel as tropas militares brasileiras tem desempenhado na reconstrução social do Haiti? Como elas estão atuando? Para além do terremoto, um problema social maior grassa desde a colônia até os dias atuais, qual seja: o empobrecimento do Haiti, a corrupção e a prática de políticas unilaterais que bloqueiam sua reconstrução social e democrática.

Intensificação da migração, clandestinidade e contrabando de pessoas: estes são alguns dos desdobramentos do terremoto e da ineficiente ajuda humanitária. Sem documentação, os haitianos entram no Brasil sofrendo humilhações, abusos, roubos, etc. Em sua rota, passam pela República Dominicana, Panamá, Equador, Peru, até chegar a Tabatinga e Brasileia – fronteira brasileira – onde aguardam a concessão de um ‘Pedido de Visto de refugiado’. Depois, seguem para Porto Velho, Manaus e outras regiões brasileiras. Toda esta viagem custa cerca de quatro mil dólares, pagos aos “coiotes”. Ademais, a Pastoral dos Migrantes vem constatando que muitos haitianos não procedem diretamente do Haiti, mas de outros países em crises econômicas e de empregos. O Governo do Acre assiste parte desses imigrantes. No entanto, já sinalizou que não têm mais condições de fazê-lo.

Presença da Igreja e acolhida: A Igreja Católica, através das Congregações Scalabrinianas (Irmãs e Padres) e da Pastoral dos Migrantes (SPM) esforça-se para acolher esses imigrantes viabilizando-lhes casa, alimentos, remédios, cursos de língua portuguesa, cursos profissionalizantes, e, encaminhando-os para postos de trabalho em Manaus, Rondônia, Acre, Paraná, Rio Grande do Sul, São Paulo, Mato Grosso e Minas Gerais.

Restrição à migração e contradições nacionais: Constatando que imigrantes haitianos ingressam no Brasil de forma contrabandeada, o Estado brasileiro decidiu restringir as entradas a um número de 1.200 por ano. Para o governo, essa decisão inibiria os “coiotes” e controlaria a imigração haitiana. São muito importantes e necessárias as ações de combate ao contrabando de pessoas, mas, o Estado brasileiro não deixa claros os critérios para a concessão de “Vistos” e desconsidera que a restrição à imigração implica a intensificação da migração indocumentada, na violação de direitos humanos e abre caminho para a migração seletiva que prioriza profissionais qualificados. Nesse sentido, o que se percebe é uma contradição nos compromissos humanitários assumidos.

Reconstrução do Haiti, uma proposta para a ajuda internacional humanitária: As condições em que ocorre a imigração haitiana devem ser enfrentadas com firmeza pela ajuda humanitária internacional, sempre resguardando a defesa e promoção dos direitos humanos e a solidariedade. Nesse sentido, uma ação fundamental é a imediata reconstrução das organizações socioeconômicas do Haiti, criando condições para que as pessoas possam escolher MIGRAR ou FICAR em seu país.

Nesse sentido, propomos ao Governo brasileiro que:

1 – O Governo do Brasil – em visita ao Haiti, prevista para o início de fevereiro 2012 – desencadeie e coordene uma campanha internacional para a imediata reconstrução do Haiti em suas bases sociais, econômicas, culturais e ambientais, criando condições concretas para que os haitianos possam escolher entre MIGRAR ou exercer seu direito de FICAR no seu país com dignidade humana. Sem essas condições, documentadas ou não, as pessoas continuarão a migrar para fugir da pobreza e tentar reconstruir suas vidas em outros países;

2 – A ajuda humanitária internacional auxilie na organização política e social do Haiti, viabilizando a ampla participação da população em processos decisórios de forma democrática e multilateral, impedindo que políticas unilaterais – que ainda grassam no Haiti – bloqueiem a reconstrução política, social e econômica sustentável do país;

3 – O Governo do Brasil formule e implemente políticas migratórias que privilegiem o bem estar da pessoa humana em suas bases políticas, sociais, econômicas, culturais e ambientais;

4 – O Governo do Brasil seja signatário da Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membros das suas Famílias -Adotada pela Resolução 45/158, de 18 de Dezembro de 1990.

Reafirmamos nosso compromisso de permanecer apoiando a luta dos migrantes por dignidade, justiça e protagonismo político, social, econômico, cultural, religioso, ambiental, etc. Colocamo-nos à disposição de apoiar o Estado brasileiro na elaboração e implementação das ações sugeridas.


SPM – Serviço Pastoral dos Migrantes

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Sul-sudaneses impossibilitados de retornar a seu país

CARTUM, Sudão, 16 de janeiro (ACNUR) - À primeira vista parece um ferro-velho, repleto de móveis quebrados, vigas de metal enferrujadas e portas arrancadas das dobradiças. Após uma observação mais detalhada é possível observar caixas gigantes com cadeados, tendas improvisadas e pessoas escondidas atrás da constante camada de poeira que sopra através
da capital sudanesa.

Esta é a estação de trem de Shajara, no sul de Cartum. É um dos 14 pontos de partida ainda ativos nas redondezas da capital e funciona como abrigo para toneladas de bagagem e centenas de pessoas desesperadas que estão esperando há um ano para retornar a suas vilas no Sudão do Sul. O último trem a partir desta estação foi no final de outubro. Outros seis trens estão programados para os próximos meses, e todos estão lutando para entrar na lista de passageiros.

“Nós estamos aqui há nove meses, realmente queremos ir embora”, disse uma mulher que construiu sua casa em um vagão abandonado. “Meu bebê nasceu aqui há três meses. Nós o chamamos Railway”. A família
estava entre os sulistas que fugiram por mais de 20 anos da guerra civil entre norte e sul.

Nos meses que antecederam a independência do Sudão do Sul, em julho do ano passado, muitos daqueles que tinham buscado refúgio no Sudão nos
anos anteriores começaram a retornar para seus locais de origem, assim como as pessoas que nasceram e cresceram no Sudão mas que tinha importantes vínculos com o sul. Após um início entusiasmado - mais de 350 mil pessoas retornaram ao Sudão entre outubro de 2010 e dezembro de 2011 - o movimento de retorno ao sul está paralisado.

Por um lado, o problema é financeiro: o governo do Sudão do Sul esgotou os fundos destinados a organizar esses movimentos, enquanto muitos outros sulistas no Sudão perderam seus empregos desde a separação do país e estão enfrentando dificuldades econômicas.

Mas também há problemas logísticos que levaram à situação da estação de Shajara. Décadas de negligência deixaram o serviço ferroviário entre Cartum e Wau, no noroeste do Sudão do Sul, em ruínas. Uma única linha de trem de mais de mil quilômetros de comprimento conecta as duas cidades.

Leia a íntegra desta notícia em: www.acnur.org.br

Brasil e os desafios da lei de migrações

Entrevista especial com Rosita Milesi “Embora o fluxo migratório atual de haitianos seja composto fundamentalmente por migrantes, é preciso recordar que os processos políticos haitianos continuam marcados por grandes dificuldades para o estabelecimento da ordem democrática”, aponta a diretora do Instituto Migrações e Direitos Humanos.

Confira a entrevista.

Aproximadamente cinco mil haitianos migraram para o Brasil nos últimos dois anos, após o terremoto que assolou o Haiti em 2010. Entretanto, o número de estrangeiros residentes no país ainda é pequeno, cerca de 1% da população, segundo Ir. Rosita Milesi. De acordo com ela, os maiores desafios do Brasil em relação à migração dizem respeito à Lei de Estrangeiros, criada em 1980, na ditadura militar, e “marcada pelos princípios vigentes em tal período”. “Há anos a sociedade civil luta por uma Lei de Migrações, pautada nos Direitos Humanos e que corresponda às exigências de uma política migratória coerente com a dinâmica das migrações da atualidade, contemplando inclusive situação que hoje mais do que nunca preocupam e demandam particular atenção, como, por exemplo, as vítimas do tráfico de pessoas e os migrantes submetidos a trabalho escravo ou degradante, assim como os migrantes em situação irregular, que não podem ser criminalizados pelo simples fato de estarem indocumentados”, ressalta.

Na avaliação dela, é preciso aprovar uma nova Lei de Migrações para suprir as demandas atuais e as “inúmeras situações que marcam a sociedade de hoje e as necessidades da vida dos migrantes da atualidade”. “Está em tramitação na Câmara dos Deputados um Projeto de Lei de iniciativa do Poder Executivo, mas até o presente o Congresso Nacional tem manifestado pouco interesse pela sua aprovação”, esclarece em entrevista concedida à IHU On-Line, por e-mail.

Ir. Rosita também destaca a necessidade de o país investir em uma nova política migratória “diante da crescente preocupação com deslocamentos humanos motivados por diversas causas e razões - mudanças climáticas, crise ecológica e situações provocadas em função de grandes projetos desenvolvimentistas, tráfico de pessoas, tráfico de migrantes, e outras. O cenário futuro da América Latina é de fato de aumento nos fluxos migratórios”. Na avaliação dela, as iniciativas governamentais que buscam uma solução migratória para o fluxo de haitianos devem ser reconhecidas e valorizadas “positivamente”. Entretanto, pondera, “fechar fronteiras opõe-se à integração e à convivência humana e restringe a solidariedade entre os povos, principalmente para com os que vivem situação de maior vulnerabilidade”.

Rosita Milesi é diretora do Instituto Migrações e Direitos Humanos.

Confira a entrevista.

IHU On-Line - Como é o deslocamento dos haitianos que tem chegado ao Brasil?

Rosita Milesi - O processo de deslocamento por via aérea parte da República Dominicana e tem como destino o Equador ou o Peru. Como estes países não exigem visto para haitianos (o Peru introduziu a exigência de visto para haitianos em janeiro de 2012), estes migrantes não encontravam dificuldades na entrada. Depois, por trajeto terrestre ou fluvial, chegam à fronteira do Brasil, em diferentes pontos. Tabatinga, Assis Brasil, Brasiléia são os mais frequentes. Em alguns casos, em lugar de se deslocar à fronteira com a região Norte, o menor trajeto, chegam pela região Centro-Oeste, entrando por Corumbá, por exemplo. As escolhas dependem das facilidades de transporte, possibilidade de entrar no território do Brasil e, em muitos casos, interesses e estratégias dos “coiotes” que atuam neste trajeto.

IHU On-Line - Qual é o perfil dos haitianos que estão migrando para o Brasil? É possível saber quantos já migraram para o nosso País?

Rosita Milesi - São pessoas que, em meio à pobreza e os escombros de um país pobre e destruído pelo terremoto de 12 de janeiro de 2010, conseguiram reunir junto a seus familiares e amigos uma quantidade de recursos suficiente para pagar o custoso e explorado deslocamento do Haiti até a fronteira brasileira, passando por vários países. É um trajeto migratório motivado pela busca de trabalho, na esperança de encontrar condições de reconstruir a vida e de ajudar os familiares que deixaram no Haiti.

Até o dia 23 de dezembro de 2011, o Comitê Nacional para Refugiados (CONARE) recebeu 3.396 processos de haitianos solicitando refúgio. Além deste total, na data, havia aproximadamente 1.000 haitianos em Tabatinga (AM) e 811 em Brasiléia (AC), aguardando a entrevista com a Polícia Federal para formalizarem seus pedidos. Assim, mesmo que ainda não tenhamos estatísticas oficiais, pode-se concluir que em torno de cinco mil (5.000) haitianos chegaram ao Brasil, durante os últimos dois anos, ou seja, após o terremoto de 2010.

Uma pesquisa realizada por professores da Universidade Federal de Minas Gerais, em base nos processos enviados ao Conselho Nacional de Imigração - CNIg, permite visualizar o perfil da população que chegou ao Brasil no início deste fluxo migratório. Os dados que seguem referem-se ao conjunto de 714 processos que tramitaram em 2010 e 2011. Observe-se que 73 pessoas não responderam o item “Escolaridade”. Neste contingente, temos o seguinte quadro:

Escolaridade segundo o grupo de processos analisados pelo CNIg – 2010-2011.

Escolaridade Nº de Pessoas %
Analfabeto 5 0,7
Fundamental incompleto 253 39,5
Fundamental completo 56 8,7
Médio incompleto 196 30,6
Médio completo 84 13,1
Superior incompleto 20 3,2
Superior completo 27 4,2
Total 641 100,0

Quanto à atividade que exercia antes de sair do Haiti, temos os dados abaixo, extraídos do mesmo contingente de 714 processos, ressalvando que 17 pessoas não responderam este item.

Haitianos no Brasil: setor da atividade exercida antes da saída do Haiti

Setor Nº de Pessoas %
Agricultura 24 4,9
Indústria 14 2,0
Construção civil 267 38,4
Comércio 77 11,0
Serviço 170 24,4
Educação 40 5,7
Estudante 35 5,0
Outros 60 8,6
Total 697 100,0


Quanto à presença de homens e mulheres, não tendo ainda um informe geral único, valemo-nos de diferentes fontes e grupos pesquisados os quais indicam que entre 85 e 86% são homens. Em Tabatinga, por exemplo, de 1º de janeiro até 31 de dezembro de 2011 chegaram 2.428 homens, 401 mulheres e 12 menores.

IHU On-Line - Os haitianos vêm para o Brasil apenas na condição de imigrantes ou também de refugiados?

Rosita Milesi - O refúgio é um instituto jurídico para proteger pessoas perseguidas que tem sua vida ameaçada e que necessitam de proteção internacional. Os haitianos sofrem as consequências de uma catástrofe natural, mas não são vítimas de perseguição, não atendem os requisitos do conceito de refugiado previsto na Convenção de 1951 e na legislação nacional (Lei 9474/97); portanto, o Comitê Nacional para os Refugiados - CONARE não encontra amparo para deferir seus pedidos de refúgio. Vale-se, então, da Resolução Recomendada nº 08/06, do Conselho Nacional de Imigração, que no Art. 1º “Recomenda ao Comitê Nacional para os Refugiados – CONARE (...), o encaminhamento ao Conselho Nacional de Imigração – CNIg, dos pedidos de refúgio que não sejam passíveis de concessão, mas que, a critério do CONARE, possam os estrangeiros permanecer no país por razões humanitárias”.

Com base nesta Resolução, o CONARE remete os pedidos de refúgio dos haitianos ao CNIg que, após ampla reflexão e análise da situação do Haiti e das graves consequências que o terremoto de janeiro de 2010 causou na população e em toda a estrutura social e governamental, decidiu conceder Residência Permanente por razões humanitárias, com base na Resolução n. 27/98, que trata dos casos omissos e especiais. “Na aplicação da RN n. 27/98, o CNIg tem considerado as políticas migratórias estabelecidas para considerar como “especiais” os casos que sejam “humanitários”, isto é, aqueles em que a saída compulsória do migrante do território nacional possa implicar claros prejuízos à proteção de seus direitos humanos e sociais fundamentais” (Extrato do voto aprovado pelo CNIg em reunião de 13/03/2011).

Em síntese, os haitianos, ao chegarem ao Brasil, tem apresentado pedido de refúgio, mas, sendo eles efetivamente imigrantes, a solução migratória concedida pelo Conselho Nacional de Imigração é a Residência Permanente por razões humanitárias.

Cabe, contudo, destacar que, embora o fluxo migratório atual de haitianos seja composto fundamentalmente por migrantes, é preciso recordar que os processos políticos haitianos continuam marcados por grandes dificuldades para o estabelecimento da ordem democrática. A instabilidade política ocorre em meio a uma economia fraca e uma sociedade civil bem fragilizada. Portanto, não se pode generalizar afirmando que são todos migrantes, como também não se deve afirmar que sejam necessariamente refugiados. Cada caso deve ser apreciado pelas autoridades brasileiras em sua especificidade.

IHU On-Line - Quais são as maiores dificuldades encontradas por eles ao ingressarem no país?

Rosita Milesi - Quando chegam ao Brasil os haitianos já consumiram praticamente toda a “reserva econômica” que tinham em mãos. Deste fato, somado às já tão precárias condições em que deixam seu país, resulta uma realidade de completa vulnerabilidade social.

Assim, na chegada em território brasileiro necessitam emergencialmente de abrigo, alimentação e documentos que lhes permitam a estada legal e o posterior deslocamento no Brasil. Querem trabalhar para ganhar o próprio sustento e, portanto, superar as dificuldades de acesso ao mercado de trabalho é de fundamental importância. Somam-se a essas dificuldades o estranhamento com a cultura local, as dificuldades de comunicação, o desconhecimento do idioma (a maioria fala o creolle – língua nativa haitiana). Uma dificuldade que os afeta são também os parcos recursos das prefeituras e órgãos estaduais no acompanhamento dessa demanda por assistência, proteção social, capacitação profissional e inclusão laboral.

IHU On-Line - Como a senhora interpreta a posição do governo brasileiro em relação aos haitianos e a decisão de aplicar medidas que tentem coibir a entrada deles no país?

Rosita Milesi - No âmbito do governo, considerando-se aqui tanto instâncias específicas – Conselho Nacional de Imigração, Comitê Nacional para Refugiados – quanto os diversos ministérios, os governos estaduais e municipais, há iniciativas que de fato buscaram dar uma solução migratória ao fluxo de haitianos, e este esforço deve ser reconhecido e valorizado positivamente. Destaca-se a decisão de situar os haitianos como grupo especial, necessitado de acolhida e assistência por razões humanitárias e, portanto, acolhidos no território nacional numa situação de excepcionalidade.

Recentes medidas foram adotadas – como a Resolução Normativa nº 97, de 12 de janeiro de 2012 - e queremos crer que venham em favor de melhor administração dos fluxos, principalmente coibir as redes de tráfico de migrantes e a ação dos coiotes, mas preservando sempre o direito da pessoa a migrar e o respeito à sua dignidade inalienável e aos seus direitos humanos.

Política de migração

Sabemos que a falta de canais legais e viáveis para as pessoas migrarem e buscarem condições de sobrevivência, sobretudo quando se encontram em situação de necessidade extrema, é um campo fértil para a ação de traficantes e exploradores, e acaba forçando estes migrantes ao uso das alternativas inadequadas e enganosas que lhes são oferecidas pelos coiotes. Por isso, estabelecer um plano, com condições específicas, para que os haitianos possam migrar regularmente ao Brasil é medida viável, humanitária e construtiva. Mas, é indispensável que as medidas contemplem todo o processo, tanto da entrada por vias regulares, quanto de acolhimento, aprendizagem do idioma, integração laboral e social na sociedade de acolhida. Assim, além da adoção de “Visto em caráter especial” (art. 2º da RN 97/12), espera-se que medidas de acolhimento, integração e acesso a políticas públicas sejam asseguradas para uma efetiva e digna acolhida e inserção dos haitianos no País.

Não queremos deixar de expressar nossa preocupação em relação ao risco da política gerar distorções, como, por exemplo: - aumentar a exploração dos haitianos por parte das redes de tráfico de migrantes, tendo em vista as exigências formais e as eventuais dificuldades de acesso dos mais necessitados; adotar outras vias de acesso irregular, o que importará no aumento da exploração por parte dos coiotes e na continuidade do fluxo de indocumentados que ficarão sujeitos a medidas severas do governo; dificultar aos haitianos eventualmente necessitados de proteção o acesso ao pedido de refúgio.

Reiteramos que não podem faltar medidas severas de combate às redes de tráfico de migrantes e aos coiotes. Este é um ponto de fundamental importância, para não deixar as pessoas que se encontram em situação de necessidade e de vulnerabilidade expostas à ação destes grupos inescrupulosos que vivem da exploração e de um verdadeiro contrabando de migrantes.

IHU On-Line - Como o Brasil deve agir em relação às suas fronteiras, considerando que muitos imigrantes as atravessam e entram irregularmente no país?

Rosita Milesi - Pautado pelo respeito aos direitos humanos e tratamento com dignidade e condições de acolhida a seres humanos que chegam, muitas vezes, em situações precárias, após uma longa e difícil jornada migratória.

Faz parte das atribuições do Estado estabelecer regras para a entrada e a residência de não nacionais no próprio território (as assim chamadas políticas de admissão e de estada). No entanto, é importante que o controle das fronteiras não se transforme num fechamento das mesmas, tampouco em caminho de criminalização de quem entra e reside no território em situação de irregularidade administrativa.

O número de estrangeiros residentes no Brasil é pequeno (cerca de 1% da população, enquanto, por exemplo, há 3,6 % na Argentina, 2,9% no Equador, 1,9% no Chile, 2,4% no Uruguai, 3,5% na Venezuela (cfr. International Migrant Stock, the 2008 Revision). O Brasil não se encontra frente a uma questão de exagerados fluxos migratórios e nem há no País uma presença exagerada de imigrantes. O tema deve ser incluído num debate mais amplo sobre política migratória onde a questão seja bem administrada e acompanhada das necessárias medidas de acolhimento e integração social, jurídica, laboral e cultural. Simplesmente fechar fronteiras opõe-se à integração e à convivência humana e restringe a solidariedade entre os povos, principalmente para com os que vivem situação de maior vulnerabilidade.

IHU On-Line - Como a questão dos imigrantes é abordada na legislação brasileira?

Rosita Milesi - O Brasil ainda convive com uma Lei de Estrangeiros de 1980, aprovada em pleno regime militar e marcada pelos princípios vigentes em tal período. Há anos a sociedade civil luta por uma Lei de Migrações, pautada nos Direitos Humanos e que corresponda às exigências de uma política migratória coerente com a dinâmica das migrações da atualidade, contemplando inclusive situação que hoje mais do que nunca preocupam e demandam particular atenção, como, por exemplo, as vítimas do tráfico de pessoas e os migrantes submetidos a trabalho escravo ou degradante, assim como os migrantes em situação irregular, que não podem ser criminalizados pelo simples fato de estarem indocumentados.

O Conselho Nacional da Imigração tem suprido as deficiências da superada Lei de Estrangeiros de 1980, regulando, através de Resoluções Normativas, inúmeras situações que marcam a sociedade de hoje e as necessidades da vida dos migrantes da atualidade. Como exemplo, podemos citar a Resolução Normativa n. 77/08, que regula o visto de residência em base à união estável, a RN n. 95/10, que assegura a concessão de residência permanente às vítimas de tráfico de pessoas, a RN n. 27/98, que possibilita ao CNIg a solução dos casos omissos e especiais, entre outras.

Destaque-se que foi justamente com base nesta Resolução 27/98 que se encontrou amparo legal para uma solução migratória de caráter humanitário para os haitianos. O estado brasileiro situou-os na previsão de casos especiais, nos quais se incluem as situações humanitárias, conforme prevê o art. 1º, da RN 27/98, beneficiando-os com residência permanente.

IHU On-Line - Como a Igreja tem atuado em relação aos novos imigrantes que chegam?

Rosita Milesi - A Igreja no Brasil tem uma atuação significativa na área das migrações. Faz parte de sua história e de seu compromisso pastoral. A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB possui o Setor Pastoral da Mobilidade Humana, com pastorais específicas como a Pastoral dos Migrantes e a Pastoral dos Refugiados. Nesta ação pastoral, há também congregações religiosas que, tanto em âmbito local quanto nacional, atuam no serviço a grupos específicos - vítimas de tráfico de pessoas, migrantes retornados, brasileiros no exterior, nômades, entre outros.

Quanto aos imigrantes recém chegados, na maioria dos casos, o serviço eclesial se realiza na primeira acolhida, esclarecimentos, busca de albergues ou condições de moradia temporária, informações práticas do dia a dia, escritórios de orientação jurídica, suporte para a articulação e auto-organização dos diferentes grupos, denúncia das formas de exploração e xenofobia, bem como na pressão em âmbito político, para envolver as autoridades e as instâncias governamentais que devem assumir seu papel com políticas de efetiva atenção e acolhida desta população.

Trabalho pastoral

Basicamente é este o trabalho que está sendo realizado pela Igreja junto e em favor dos grupos de haitianos. De modo muito especial, as Dioceses e Pastorais do norte do País – Arquidiocese de Manaus, Diocese de Alto Solimões (Tabatinga), Paróquia N. Sra. das Dores (Brasiléia, AC), Pastoral do Migrante de Porto Velho, de Manaus, a Pastoral da Mobilidade Humana, Congregações religiosas presentes na região, assim como entidades com sede fora da região, tais como a Caritas Brasileira, o Instituto Migrações e Direitos Humanos, a CNBB, Congregações religiosas, entre outras instituições, tem disponibilizado seus espaços físicos para acolher haitianos, reuniram recursos financeiros, apoiaram e assistiram estes imigrantes na obtenção de seus documentos, atuaram na busca de trabalho e emprego junto às empresas, investiram muitos recursos no fornecimento de alimentação, acolhida em abrigos e em salões paroquiais, e, incansavelmente, na demanda junto aos poderes públicos que, com raras exceções, foram omissos por longo tempo e depois, muito lentamente, se envolveram na causa.

A atuação em rede e no apoio recíproco entre as diversas instituições eclesiais é um ponto forte nesta missão. A Rede Solidária para Migrantes e Refugiados (constituída por mais de 50 entidades), atuou de maneira artiuclada no processo de partilha de informações, no encaminhamento dos haitianos em busca de trabalho e na acolhida na cidade ou região de destino, como nas demandas frente ao estado brasileiro, e na partilha dos poucos recursos existentes. A atuação em rede vem superando as distâncias, animando o espírito missionário e compartilhando iniciativas e processos (as chamadas boas práticas), mas os desafios são imensos e toda ajuda será bem vinda.

IHU On-Line - Como o governo brasileiro deve se posicionar diante destas novas imigrações? Em que constituiria uma política pública de assistência aos haitianos?

Rosita Milesi - O Brasil, desde os meados dos anos 1980 do século passado, tem registrado a saída de um grande número de cidadãos que migraram para outros países, sobretudo EUA, Japão e União Europeia. Diante da violação de direitos e das circunstâncias muitas vezes humilhantes a que eram expostos esses patrícios, o governo brasileiro tem tomado uma posição clara em defesa dos migrantes.

Hoje o Brasil está registrando uma realidade diversa, que é um fluxo de imigrantes, não apenas haitianos, mas também de outras nacionalidades. Seria uma grave incoerência se o governo brasileiro agora negasse aos imigrantes aqueles direitos que defendeu para os emigrantes brasileiros.

Não obstante, a imigração que se verifica em nosso País, não esta diante de uma invasão. É evidente que há um limite para as condições de acolhida, mas, como disse o monge italiano Enzo Bianchi, é importante que o limite não seja determinado pelo egoísmo de quem se fecha no próprio bem-estar, mas pela real impossibilidade de abrir espaço para o outro. Acredito firmemente que, neste momento, o Brasil tenha ainda muita margem de acolhida.

Lei de migrações

Simultanemanete, reiteramos a necessidade de uma nova Lei de Migrações, revendo a tão ultrapassada Lei 6815, de 1980. Está em tramitação na Câmara dos Deputados um Projeto de Lei de iniciativa do Poder Executivo, mas até o presente o Congresso Nacional tem manifestado pouco interesse pela sua aprovação.

Urge também uma nova política migratória diante da crescente preocupação com deslocamentos humanos motivados por diversas causas e razões - mudanças climáticas, crise ecológica e situações provocadas em função de grandes projetos desenvolvimentistas, tráfico de pessoas, tráfico de migrantes, e outras. O cenário futuro da América Latina é de fato de aumento nos fluxos migratórios.

Dada a intensidade do fluxo de haitianos cabe uma ação coordenada de órgãos públicos (município, estado e Federação) nas diversas etapas do processo migratório no território brasileiro: a chegada, a documentação, o deslocamento em busca de trabalho, a inserção no mercado laboral e nas políticas sociais do estado brasileiro, além de suporte na qualificação profissional, no aprendizado da língua, na introdução à cultura local e, também no âmbito da preservação de sua cultura.

É importante fortalecer e ampliar as parcerias entre o Estado brasileiro, a sociedade civil organizada e organizações internacionais. No caso daqueles que obtiverem a condição de refugiado assegurar que tenham todos os benefícios assegurados pela legislação no Brasil e possam integrar-se à sociedade local.

IHU On-Line - Como é possível entender e compreender o fenômeno migração no século XXI?

Rosita Milesi - Os seres humanos sempre migraram no decorrer da história. No entanto, no começo do século XXI, as migrações são motivadas, como diria Bauman, sobretudo pela busca de inclusão biológica – a sobrevivência – e da inclusão social – a plena cidadania. O mundo moderno universalizou os direitos humanos, mas os negou a grande parte da população mundial. A migração representa uma forma de resistência e, ao mesmo tempo, de denúncia das contradições da globalização neoliberal. Além disso, ela aponta a utopia da “família humana”, da “cidadania universal”, de uma sociedade em que ninguém seja subestimado em sua dignidade. Hoje, mais do que nunca, precisamos desta utopia, talvez não para realizá-la, mas para orientar nosso caminho e garantir o futuro da espécie humana no planeta terra.

Neste início de século temos diante de nós três realidades desafiadoras:

a) nossa casa comum – o planeta Terra – pede socorro, pois o uso desenfreado dos recursos naturais e a poluição estão gerando mudanças drásticas no clima – elevação das temperaturas - e no equilibro ecológico, sendo uma de suas conseqüências os deslocamentos humanos por razões ambientais;

b) As sociedades democráticas não podem se dobrar a xenofobia; medo e reação adversa ao estrangeiro têm se tornado a base sobre a qual estão sendo construídas leis migratórias e de regulação de sociedades multiétnicas, o que é lamentável. Há que animar a sociedade a seguir construindo uma perspectiva centrada nos direitos universais de toda pessoa humana;

c) A superação das desigualdades sociais, econômicas, de gênero, etc., bem como o estabelecimento de sistemas políticos marcados pela plena participação dos cidadãos é fundamental para que se coloque um fim ao lado perverso que motiva migrações, ou seja, o fim das migrações forçadas pela miséria e vulnerabilidade social.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

CARTA ABERTA

“Não mais estrangeiros nem hóspedes, mas da família de Deus” (cf. Ef 2,19)

A Congregação das Irmãs Missionárias de São Carlos Borromeo - Scalabrinianas realizou de 24 a 29 de novembro de 2011, o IV Seminário Congregacional de Pastoral dos Migrantes. Este evento teve lugar no Centro Diocesano de Pastoral, em Caxias do Sul - RS, Brasil, e contou com a participação de 76 pessoas de diversos países entre elas, Irmãs Missionárias Scalabrinianas, Leigos Missionários Scalabrinianos e convidados.
O Seminário teve como tema: “Rostos da Migração, um sinal dos tempos” e o objetivo de aprofundar diferentes realidades da migração para responder com dinamismo e profecia aos desafios atuais.
Este evento consistiu no estudo, análise e aprofundamento da complexidade das migrações em seus diferentes aspectos: migrações contemporâneas características e tendências; mudanças climáticas e deslocamentos ambientais; a feminilização da migração e o diálogo intercultural e interreligioso. Evidenciou-se que o fluxo migratório, no seu duplo componente de movimento para dentro e para fora, não constitui mais uma experiência restrita, limitada a algumas áreas, mas é um fenômeno mundial, comum a todos os continentes.
Conforme a OIM, o número de migrantes internacionais totaliza 214 milhões, e destes, 49% são mulheres. O número de refugiados reconhecidos pelo ACNUR e UNRWA totalizam mais de 20 milhões, e a maioria destes se encontram na África e Ásia. Nos últimos anos, chama também a atenção a questão dos deslocados ambientais.
A recente crise econômica tem provocado o retorno de migrantes aos seus países de origem. Há sinais evidentes que os deslocamentos para os países desenvolvidos – principais alvos da crise – diminuam, com o concomitante aumento de fluxos para países emergentes. Ao que tudo indica, haverá nos próximos anos uma maior diversificação dos fluxos e, talvez, uma acentuada circularidade das migrações. Ao mesmo tempo, haverá deslocamentos mais ou menos forçados, provocados por fatores contingentes e contextuais, como conflitos bélicos, crises políticas e fenômenos climáticos e/ou ambientais.
A presença e atuação da Congregação junto dos migrantes é um diferencial na Igreja e na sociedade, ao difundir apreço pela pessoa do migrante, ao reconhecê-lo como sujeito e protagonista de sua história, capaz de provocar transformações na sociedade onde está inserido, tornando-o cidadão na nova pátria.
O migrante, participando do projeto divino, colabora para que a terra e os espaços eclesiais e comunitários se tornem lugar de fraternidade, de partilha e de gratuidade, antecipação daquele banquete do Reino, onde todos e todas somos da mesma família de Deus (Ef 2,19), onde ninguém é excluído, e sim chamados pelo Pai pelo próprio nome.
A Congregação das Irmãs Missionárias Scalabrinianas e o Movimento dos Leigos Missionários Scalabrinianos, por força do Carisma, consideram os migrantes sujeitos de direitos e portadores de cultura, caminham com eles, fazendo processo de integração e construção de cidadania. Reconhece-os como “profetas de mudanças” portadores de esperança, questionam o atual paradigma de desenvolvimento, o seu modelo civilizatório e sinalizam novas formas de convivência.

Constatações

Constatou-se que, em diversos países de destinos migratórios e sob a pressão de nacionais, os Governos aprovam leis que desconsideram as convenções e acordos internacionais; as políticas migratórias frequentemente não consideram os direitos humanos, ferindo os migrantes fortemente em sua dignidade; migrantes são retidos em centros de detenção sem as mínimas condições humanas, fronteiras são fechadas para a circulação de pessoas, enquanto são abertas livremente para as finanças, comércio, fomentando assim, o crescimento do racismo e da xenofobia.
Esta realidade é interpeladora, pois, além dos motivos econômicos, multiplicam-se questões políticas, sociais e ambientais desencadeadoras de movimentos migratórios. Nesse contexto, intensifica-se a violação de direitos humanos expressos principalmente no tráfico de pessoas, trabalho escravo e servidão por dívida e criminalização dos migrantes. Os meios de comunicação, sustentados pelo sistema político, apresentam os migrantes como mentores de criminalidade e invasores que se apropriam dos recursos do país onde chegam.
As/os Participantes do Seminário com um coração compassivo e uma atitude solidária interpelam:
À Igreja
 Reconhecer os migrantes e refugiados como “sinal dos tempos”, através dos quais Deus a chama para viver mais plenamente a dimensão católica e sua vocação de peregrina, pois, ela é ponto de referência muito importante para a proteção da identidade dos migrantes. Uma das grandes responsabilidades da mesma é trabalhar para a formação de seus líderes, buscando mudança de atitude diante desta realidade e respondendo com flexibilidade às novas demandas apresentadas pelos movimentos migratórios.
Aos Governos e à Sociedade Civil
 Respeitar e defender a dignidade e os direitos humanos, especialmente a liberdade de consciência e liberdade religiosa dos migrantes e refugiados que se encontram em situação regular ou irregular, levando em consideração que apenas políticas restritivas em relação às pessoas em mobilidade não são idôneas para regularizar os fluxos migratórios.
 Desenvolver e/ou criar oportunidades para a reunificação familiar e a unidade da família migrante. Manter os laços familiares é essencial para ser plenamente humanos e garantir a estabilidade social.
 Usar de todos os meios à disposição, para evitar tragédias que resultem em perda de vidas de migrantes nas inúmeras fronteiras do mundo.
 Tratar os migrantes e refugiados sem prejuízos e combater o racismo, a xenofobia e o exagerado nacionalismo.

As/os participantes reunidas/os no IV Seminário de Pastoral dos Migrantes estão conscientes da complexidade do movimento global dos migrantes e refugiados no mundo atual e do grande sofrimento imposto a milhões de pessoas.
Renovam o compromisso com os migrantes, fortalecendo as ações locais numa perspectiva global, e trabalhando em rede com organizações nacionais e internacionais.
Reconhecem o migrante, nos seus diferentes rostos, como ‘sinais dos tempos’ e o chamado que Deus faz a todos/as para viver mais plenamente a acolhida e a solidariedade na Igreja e no mundo, caminhando com os migrantes e refugiados nas pegadas de Jesus e em seus ensinamentos, especialmente tendo presente a verdade por Ele proclamada no discurso escatológico: “Era migrante/ peregrino e me acolheste” (Mt 25, 35).

Caxias do Sul/RS, 29 de Novembro de 2011.

Um retrocesso humanitário

A relação entre o Haiti e o Brasil começa quando este assume o controle das tropas da ONU naquele país em 2004. A atuação brasileira foi marcante no país mais pobre das Américas, que tem problemas complexos de segurança, infraestrutura, estrutura do Estado, garantias e liberdades democráticas. O quadro se agravou depois do terremoto de 2010. A geração de fluxos migratórios é consequência natural dessa situação crítica.

A imigração é um processo de inclusão e aceitação em outro território e no seio de outra comunidade nem sempre amigável. O gozo de direitos dos imigrantes fica entretanto condicionado a políticas governamentais. É com esta prerrogativa que, infelizmente, o governo brasileiro limita a entrada de haitianos e estabelece medidas de controle de entrada e permanência. O Brasil tem longa tradição de acolhida, mas poucas iniciativas de políticas migratórias. Essa talvez seja nossa maior deficiência. O Brasil está crescendo economicamente e em termos de desenvolvimento humano. Natural que atraia imigrantes, mas melhor será se estivermos preparados para que esta força de trabalho colabore nesse crescimento.

Mais acertada que a imposição de medidas restritivas é a viagem da presidenta Dilma ao Haiti, especialmente se a intenção for buscar soluções aos haitianos. O mais relevante não é qualificá-los como ‘invasores’ ou ‘vítimas’, mas repensar nossa questão migratória, reconhecendo que os países são ligados pela repercussão de suas ações internas, até porque a soberania não pode ser utilizada pelos Estados para se eximir do cumprimento de resoluções, já que as decisões ‘internas’ podem, sim, gerar responsabilidade internacional.

Vanessa Oliveira Batista é professora associada da Faculdade Nacional
de Direito da UFRJ e pesquisadora do CNPq

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Refugiados, Imigração e Direitos Humanos

CENAS DO BRASIL - 12.01.12: O Cenas do Brasil discutiu o tema "refugiados" com o secretário-executivo do Ministério da Justiça, Luiz Paulo Barreto.
00:57:57
Adicionado em 13/01/2012
91 exibições

Muito interessante este programa, recomendo... conferir no link abaixo:

http://www.youtube.com/watch?v=4kh0TJcepnk&list=UUjaWLFTNqLkq3ZY2BJ4NYRg&index=1&feature=plcp

Eduardo Gabriel

Migrantes e Refugiados

Artigo publicado originalmente no Jornal de Piracicaba de 14 de janeiro de 2012. P.3

Migrantes e Refugiados



Por ocasião da celebração do Dia Mundial do Migrante e Refugiado (15 de janeiro), o Papa apresenta-nos uma mensagem para reflexão sobre a situação destes irmãos nossos, os migrantes e refugiados. O tema central da mensagem: “Migrações e a nova evangelização” é visivelmente a sua preocupação cristã pertinente diante da complexidade que os processos de mobilidade humana se constituem nos dias de hoje. A necessidade de migrar por questões de ordem financeira, especialmente nestes últimos meses por causa da crise mundial, e a migração forçada dos refugiados por motivos de perseguições em seus países, coloca a dinâmica dos deslocamentos em uma dimensão de alta complexidade.

Este é o contexto que a mensagem se volta para propor o desenvolvimento de uma Nova Evangelização. No texto da mensagem, o Papa lança algumas expressões chaves que valem ser destacadas: “novo vigor”, “novas modalidades”, “novas problemáticas”, “novas estratégias pastorais”, “novas situações”, entre outras. Estas sinalizações, particularmente com o destaque ao termo “novidade”, fazem parte da estrutura do argumento com o qual o Papa quer nos sensibilizar a todos sobre a situação desumana que milhares de pessoas migrantes e refugiadas em todo o mundo são submetidas, tendo seus direitos e a dignidade humana desrespeitados. O conjunto desta situação coloca o migrante em uma condição oposta ao que de fato ele pode verdadeiramente se tornar: um profeta. Todo migrante é profeta na medida em que traz consigo os sinais necessários de que uma mudança de qualquer natureza. Olhar o migrante nesta perspectiva é observar as transformações que um grupo social passa.

Porém, é certo também que hoje a violência marcante que atingem os migrantes e refugiados são as constantes e crescentes ideias de xenofobia veiculadas nos meios de comunicação, especialmente nas redes sociais da internet, como foi, por exemplo, o episódio da estudante Mayara Petruso, que postou no twitter o repúdio aos nordestinos em São Paulo. Esta é uma situação desafiadora para que a nova evangelização em direção ao fenômeno migratório possa também ser ativa, pois inegavelmente os meios de comunicação estão no centro das relações humanas do mundo contemporâneo, e os migrantes e refugiados não estão alheios aos seus usos e também reações. Em suma, é com o fôlego da preocupação sobre a complexidade dos deslocamentos migratórios e as reações a ele, que a Nova Evangelização neste contexto deve ser assumida por cada cristão, tornando-se comprometido com a acolhida fraterna do irmão migrante e refugiado, como nos pede o Papa, e também sendo agentes cobradores do poder público na elaboração de garantias legais em defesa da vida dos que fazem da travessia a busca por novas esperanças.



Eduardo Gabriel, sociólogo e seminarista scalabriniano.

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Imigrantes tomam novos rumos e remodelam América Latina‏

Interessante este tema agora!
Vi nesta semana uma matéria no telejornal apontando o retorno dos nordestinos para a região Nordeste.
A expressão "novos rumos", do título da reportagem, pode ser lida em paralelo com a mensagem do Papa para o Dia Mundial do Migrante e Refugiado: "Migrações e novas evangelizações". E a outra expressão "remodelam" pode ser lida tendo ao lado o texto do sociólogo Abdelmalek Sayad, "O RETORNO", que foi edição especial da revista Travessia de janeiro de 2000.
A profecia do migrante sempre nos traz adiantado preocupações latentes ainda pouco vistas por nós missionários e pesquisadores...


Imigrantes tomam novos rumos e remodelam América Latina

Posted: 12 Jan 2012 08:54 AM PST

Fonte: Último Segundo

Por Damien Cave


Moradoras andam por bairro residencial de Santa Maria Arzompa, em Oaxaca, no México (Foto: NYT)

Novo padrão de imigração, que inclui maior número de cidades e países, criam desafios e oportunidades regionais

Quando os mais velhos olham ao redor da cidade de Aria Atzompa, no México, tudo o que conseguem ver são recém-chegados: jovens mexicanos que trabalham com construção por menores salários, os filhos de trabalhadores lotando as escolas e até mesmo novos negócios – lojas, restaurantes e clubes de strip tease – surgindo nas estradas que costumavam ser desertas e silenciosas.

O choque pode parecer bastante familiar para muitas das cidades americanas que estão lutando contra a imigração, mas esta é uma aldeia pré-colonial Mexicana no subúrbio da cidade de Oaxaca que está sendo invadida por mexicanos que viviam nos Estados Unidos. Mesmo aqui, as caretas contra a imigração são tão comuns quanto os sorrisos.

“Antes de estas pessoas chegarem aqui, tudo era bem mais tranquilo”, disse Juarez Marcelino, 61, um artesão do mercado local. “Eles trazem complicações. Eles não trazem benefícios.”

Em todo o México e em uma grande parte da América Latina, os antigos padrões migratórios estão mudando. Os nômades e inquietos agora estão se instalando em uma gama maior de cidades e países da região, colocando moradores antigos contra novos, aumentando a pressão para a criação de empregos e fazendo com que nações reescrevam suas leis imigratórias, muitas vezes até mesmo para incentivar a tendência.

Os Estados Unidos simplesmente não são mais o ímã que já foram. O número de prisões feitas na fronteira entre o México e os Estados Unidos em 2011 caiu para seu nível mais baixo desde 1972, confirmando que a imigração ilegal, especialmente do México, atingiu agora o que os especialistas descrevem como uma pausa significativa ou o fim de uma era.

Mas esta não é uma mudança no volume de imigrantes e sim em sua direção. Cerca de mais de dois milhões de mexicanos viviam longe de suas cidades natais em 2010 em relação a uma década antes, de acordo com o census mexicano. Especialistas dizem que as partidas também se mantiveram estáveis ou aumentaram ao longo dos últimos anos na Guatemala, El Salvador, Peru e outros países latino-americanos que tinham sido tradicionalmente centros de emigração.

Os imigrantes não estão mais indo para onde eles costumavam ir.

Os mexicanos, por exemplo, estão cada vez mais evitando os Estados Unidos e a região da fronteira, bem como sua própria capital, e estão se mudando em direção a cidades menores e mais seguras, como Mérida, Cidade Oaxaca e Queretaro. Especialistas dizem que os guatemaltecos estão também se estabelecendo mais no México após anos de passagem pelo país para sua jornada mais ao norte.

Ao sul, Chile, Argentina e Brasil também estão ganhando popularidade. A Organização Internacional para Migração mencionou em relatórios que a população boliviana na Argentina aumentou 48% desde 2001 (chegando a 345 mil), e que as populações paraguaias e peruanas do país cresceram ainda mais rapidamente.

Todo esse movimento está remodelando a região, tornando-a menos parecida a uma bússola que aponta ao norte e mais como um centro repleto de muitas possibilidades. Do mamão cultivado por agricultores bolivianos na Argentina à recente descoberta de exploração de trabalhadores ilegais no Chile e conflitos sobre o governo local no sul do México, essa migração intrarregional na América Latina tornou-se um desafio e uma surpresa para uma parte do mundo que costumava avaliar apenas quantas pessoas iam embora para os Estados Unidos.

“É como se um rio tivesse mudado de rumo”, disse Gabino Cue Monteagudo, o governador de Oaxaca. “É o processo de desenvolvimento – é inevitável.”

Para os Estados Unidos, a mudança significa menos migrantes que atravessam a fronteira ilegalmente e, possivelmente, mais debates sobre o orçamento ampliado para leis imigratórias ainda fazer sentido.

Mas os maiores impactos deste crescimento estão sendo sentidos rapidamente em cidades como Santa Maria Atzompa, onde milhares de pessoas, principalmente famílias rurais pobres, têm buscado ganhar a vida. No caso desta cidade e de seus arredores, o crescimento tem sido “rápido, bárbaro e anárquico”, disse Jorge Hernandez-Diaz, um sociólogo da Universidade Autônoma Benito Juarez de Oaxaca.

Há apenas uma geração, disse ele, a estrada da cidade de Oaxaca até a praça principal de Atzompa passava por campos e agricultores. A população total do município em 1990 era de 5.781. Agora, este pequeno pedaço de terra encheu-se com um labirinto de estradas de terra com becos sem saída, novos negócios e milhares de casas com diferentes níveis de construção e qualidade.

Os moradores dizem que o boom populacional começou a ganhar força por volta de 2006, já que as oportunidades nos Estados Unidos não eram tão boas e os perigo e o custo de cruzar a fronteira se tornou impossível em meio à violência dos cartéis de drogas e a implementação de uma segurança de fronteira mais eficaz. Agora, mais de 27 mil pessoas vivem em Atzompa, de acordo com o censo de 2010, e mais continuam chegando.

Outros pólos regionais estão experimentando um crescimento similar. Na verdade, enquanto a população da Cidade do México se estabilizou e a imigração para os Estados Unidos diminuiu, as zonas costeiras e centrais do México têm expandido.

Isto é em parte por causa dos esforços do governo mexicano para descentralizar o desenvolvimento, muitas vezes dando incentivos a empresas internacionais. No mês passado, a Nissan disse que iria construir uma fábrica no centro da cidade de Aguascalientes. No Estado de Oaxaca, segundo os especialistas, a migração para fora das zonas rurais é também um produto da reforma agrária que ocorreu em 1992 que, juntamente com o Acordo Norte-Americano de Livre Comércio, tornou mais difícil para os agricultores viverem da terra e fez com que seja mais fácil que a vendam.

Na América do Sul, também foram feitos acordos de livre comércio que contribuíram para um movimento mais regional, assim como o crescimento das economias e de novas leis de incentivo à migração e também leis que protegem os direitos dos imigrantes na Argentina, Uruguai, México e Equador, entre outros países.

Melhorias na tecnologia (especialmente o acesso a telefones celulares) e a uma melhor infraestrutura (especialmente melhores estradas) também tornaram mais fácil a descoberta de novos locais para encontrar trabalho, alimentando o desejo de poder ter uma boa oportunidade sem seja necessário seguir para os Estados Unidos.

“É a economia, mas também o acesso a cultura e a mais informações”, disse Juan Artola, Diretor da Organização Internacional da América Do Sul para as Migrações. “A migração intrarregional cresceu muito na última década e é muito importante por causa das mudanças que implica.”

Continuando e expandindo o movimento em direção à urbanização, os imigrantes estão agora tornando a América Latina mais integrada e mais metropolitana, dizem os demógrafos e especialistas em toda a região. Cerca de 77% de todos os mexicanos vivem hoje em áreas urbanas. Em 1908, eram 66 %.

Isso torna mais fácil e mais barata a prestação de serviços, incluindo cuidados com a saúde, água e eletricidade, dizem autoridades do governo. Para os imigrantes, a educação parece ser a atração principal.

Escolas que vão além do ensino secundário são raras nas cidades de montanha deste Estado pobre e muitos jovens dizem que vieram aqui para estudar ou porque um de seus pais veio estudar.

Gabriel Hernandez, 21, disse que quatro de seus irmãos se mudaram para cá para estudar há quase uma década. Alguns se formaram, outros não, mas a família abriu uma bodega faz mais de um ano, onde vende produtos de sua cidade natal.

Hernandez e muitos outros novos moradores em Atzompa que não vêm apenas de Oaxaca, Veracruz, mas também da Cidade do México e de outros lugares, dizem que estão felizes com a forma como as coisas têm acontecido.

Javier Espiritu 36, bem rechonchudo e coberto de tinta na loja de carpintaria que abriu no mês passado, disse que não tinha planos de se mudar novamente. Seu negócio é razoável, mas suas razões vão além da economia. Ele veio aqui com sua esposa e dois filhos, uma raridade para imigrantes que cruzam para os Estados Unidos ilegalmente, que são normalmente separados de suas famílias. E ao contrário de seus irmãos mais velhos que fizeram essa viagem há uma década, ele disse que visita sua aldeia ao sul pelo menos duas vezes por ano.

“Quando minha mãe precisa de alguma coisa, me chama”, disse ele. “Se eu fosse para outros Estados ou para os EUA isso seria muito complicado. Você imagina eu tentar levar minha família inteira para os Estados Unidos?”

Como muitos norte-americanos nas comunidades com um crescimento de imigrantes aprenderam, novos moradores significam novos desafios. A taxa de pobreza em Atzompa permanece elevada. Um centro de reabilitação de drogas fica próximo a oficina de Espiritu; clubes de strip da região prometem “bellas chicas”, e os moradores de longa data agora se queixam de terem muitos jovens com valores diferentes em seu meio. “Eles não são daqui”, disse Juarez, o artesão, explicando o motivo da divisão.

Atzompa parece ter atingido seu ponto de ruptura. Cue disse que a urbanização será uma das principais prioridades, mas o governo está claramente lutando para acompanhar o crescimento populacional. Apenas algumas das estradas em Atzompa são pavimentadas, e a escola secundária principal, construída para cerca de 120 alunos, agora tem quase 700. Aulas de ginástica e práticas esportivas acontecem nas estradas de terra fora da escola.

As estirpes levaram a região a um conflito profundo sobre governo e cultura. Atzompa costumava ser uma simples aldeia rural que seguia um sistema de governo comunal de acordo com o “Usos y costumbres” ou “usos e costumes” em que todos os direitos cívicos se aplicavam apenas para pessoas que faziam parte do serviço público ou da comunidade e que nasceram na comunidade. Mas como o número de novos moradores começou a superar os antigos ao longo dos últimos anos, os recém-chegados se queixaram de que eles estavam pagando impostos e recebendo quase nenhum serviço em troca.

No ano passado, a comunidade atingiu um impasse. Quando o mandato do presidente municipal terminou, um administrador do Estado assumiu. Agora, o legislativo estadual deve decidir se quer manter o “Usos y Costumbres ” ou estabelecer o tipo de sistema partidário aplicado na maior parte do país.

Enquanto isso, a economia de Atzompa têm mudado, não totalmente para o bem. Trabalhadores da construção civil dizem que o aumento da concorrência diminuiu sua taxa diária de US $ 14 para US$11, enquanto os preços para os lotes vazios dobraram para cerca de US$ 7.200.

Dentro da loja de Espiritu, estes são os tipos de novidades que fazem parte das conversas e indicam os possíveis problemas que podem surgir.”Com todo esse projeto de urbanização, existe bastante emprego, mas o que irá acontecer quando isso acabar?”, Disse Sergio Morales, que estava na loja encomendando uma porta para sua casa.

Uma possibilidade otimista, disse ele, era que o atual declínio na imigração para os Estados Unidos fizesse com que mexicanos pudessem estudar, trabalhar e lentamente construir negócios em seu próprio país ao invés de fugir para tentar ganhar salários mais altos nos Estados Unidos. “Olhe para esse cara”, disse Morales, apontando para Espiritu. “Ele está fazendo isso há anos.”

Uma nova pesquisa da Universidade da Califórnia, em San Diego, sugere que mais imigrantes internos estão mudando para áreas mais próximas de sua casa, ao invés de ir para os Estados mais próximos da fronteira ou para a capital. Uma de cada cinco pessoas que deixaram a aldeia do norte de San Miguel Tlacotepec entre 2001 e 2011 não saiu do Estado de Oaxaca, um número que subiu para um pouco mais do que uma de cada 10 pessoas que ficavam na região entre 1997 a 2007.

Mas, conforme os novos padrões de imigração demonstram, os movimentos de pessoas – assim como de capital – são constantes e podem mudar. Muitos dos jovens do México estão apostando que uma melhor educação irá garantir a eles melhores empregos dentro do seu país nos próximos anos. Mas agora, disse David Fitzgerald, um demógrafo da Universidade da Califórnia, em San Diego, “suas aspirações são maiores do que as oportunidades.”

Caso o México consiga preencher essa lacuna pode determinar se a economia mexicana irá conseguir ficar com seus recém-formados, ou se, mais uma vez, eles iram decidir ir embora para os Estados Unidos.

“Esse é o nosso grande desafio”, disse Cue. “Temos que criar empregos para todos esses jovens que estão estudando.”


Fie

sábado, 7 de janeiro de 2012

MENSAGEM DE SUA SANTIDADE BENTO XVI

"Migrações e novas evangelizações"

Queridos Irmãos e Irmãs!
Anunciar Jesus Cristo, único Salvador do mundo, «constitui a missão essencial da Igreja, tarefa e missão, que as amplas e profundas mudanças da sociedade actual tornam ainda mais urgentes» (Exort. apost. Evangelii nuntiandi, 14). Aliás, hoje, sentimos a urgência de promover, com novo vigor e novas modalidades, a obra de evangelização num mundo onde a queda das fronteiras e os novos processos de globalização deixaram as pessoas e os povos ainda mais próximos, tanto pela expansão dos meios de comunicação, como pela frequência e a facilidade com que indivíduos e grupos se podem deslocar. Nesta nova situação, devemos despertar em cada um de nós o entusiasmo e a coragem que impeliram as primeiras comunidades cristãs a ser intrépidas anunciadoras da novidade evangélica, fazendo ressoar no nosso coração as palavras de São Paulo: «Se anuncio o Evangelho, não tenho de que me gloriar, é antes uma obrigação que me foi imposta: ai de mim, se eu não evangelizar!» (1 Cor 9,16).
O tema, que escolhi para o Dia Mundial do Migrante e do Refugiado em 2012, «Migrações e nova evangelização» – nasce desta realidade. De facto, a hora presente chama a Igreja a realizar uma nova evangelização inclusive no vasto e complexo fenómeno da mobilidade humana, intensificando a acção missionária tanto nas regiões de primeiro anúncio, como nos países de tradição cristã.
O Beato João Paulo II convidava-nos a «alimentar-nos da Palavra para sermos “servos da Palavra” no trabalho da evangelização... [numa] situação que se vai tornando cada vez mais variada e difícil com a progressiva mistura de povos e culturas que caracteriza o novo contexto da globalização» (Carta apost. Novo millennio ineunte, 40). Com efeito, as migrações dentro ou para fora da nação, como solução para a busca de melhores condições de vida ou para fugir de eventuais perseguições, guerras, violência, fome e catástrofes naturais, produziram uma mistura de pessoas e de povos sem precedentes, com novas problemáticas do ponto de vista não só humano, mas também ético, religioso e espiritual. As actuais e palpáveis consequências da secularização, a aparição de novos movimentos sectários, uma difundida insensibilidade à fé cristã, uma acentuada tendência à fragmentação, tornam difícil focalizar uma referência unificadora que encoraje a formação de «uma só família de irmãos e irmãs em sociedades que se tornam cada vez mais multiétnicas e interculturais, onde também as pessoas de várias religiões são estimuladas ao diálogo, para que se possa encontrar uma serena e frutuosa convivência no respeito das legítimas diferenças», como eu escrevia na Mensagem do ano passado para este Dia Mundial. O nosso tempo está marcado por tentativas de cancelar Deus e a doutrina da Igreja do horizonte da vida, enquanto ganham terreno a dúvida, o cepticismo e a indiferença, que gostariam de eliminar todo e qualquer referimento social e simbólico da fé cristã.
Em tal contexto, sucede frequentemente que os migrantes que conheceram Cristo e O aceitaram se sintam impelidos a considerá-Lo como não relevante na própria vida, a perder o sentido da fé, a deixar de se reconhecerem como parte da Igreja, acabando muitas vezes por viverem uma existência que já não é caracterizada por Cristo e pelo seu Evangelho. Cresceram no seio de povos marcados pela fé cristã, mas depois com frequência emigram para países onde os cristãos são uma minoria ou a antiga tradição de fé já não é convicção pessoal, nem confissão comunitária, mas está reduzida a um facto cultural. Aqui a Igreja enfrenta o desafio de ajudar os migrantes a manterem firme a fé, mesmo quando falta o apoio cultural que existia no país de origem, lançando mão inclusive de novas estratégias pastorais, assim como de métodos e linguagens para um acolhimento vivo da Palavra de Deus. Em alguns casos, trata-se duma ocasião para proclamar que, em Jesus Cristo, a humanidade se torna participante do mistério de Deus e da sua vida de amor, abrindo-se a um horizonte de esperança e de paz através, nomeadamente, do diálogo respeitoso e do testemunho concreto da solidariedade, enquanto, noutros casos, há a possibilidade de despertar a consciência cristã adormecida, através dum renovado anúncio da Boa Nova e duma vida cristã mais coerente para fazer descobrir a beleza do encontro com Cristo, que chama o cristão à santidade em todo o lado, mesmo em terra estrangeira.
Mas o actual fenómeno migratório é também uma oportunidade providencial para o anúncio do Evangelho no mundo contemporâneo. Homens e mulheres provenientes das mais diversas regiões da terra, que ainda não encontraram Jesus Cristo ou que O conhecem só de maneira parcial, pedem para ser acolhidos em países de antiga tradição cristã. Em relação a eles, é necessário encontrar modalidades adequadas para que possam encontrar e conhecer Jesus Cristo e experimentar o dom inestimável da salvação, que para todos é fonte de «vida em abundância» (cf. Jo 10,10); os próprios migrantes desempenham um papel precioso a este respeito, porque podem, por sua vez, tornar-se «anunciadores da Palavra de Deus e testemunhas do Senhor Ressuscitado, esperança do mundo» (Exort. apost. Verbum Domini, 105).
No exigente itinerário da nova evangelização em âmbito migratório, assumem um papel decisivo os agentes pastorais – sacerdotes, religiosos e leigos – que se encontram a trabalhar num contexto cada vez mais pluralista: em comunhão com os seus Ordinários, inspirando-se no Magistério da Igreja, convido-os a procurar caminhos de partilha fraterna e anúncio respeitoso, superando contrastes e nacionalismos. Por sua vez, as Igrejas tanto de proveniência, como de trânsito e de acolhimento dos fluxos migratórios saibam intensificar a sua cooperação em benefício tanto dos que partem como daqueles que chegam e, em todo o caso, de quantos têm necessidade de encontrar no seu caminho o rosto misericordioso de Cristo no acolhimento do próximo. Para uma frutuosa pastoral de comunhão, poderá ser útil actualizar as tradicionais estruturas que atendem os migrantes e os refugiados, dotando-as de modelos que correspondam melhor às novas situações em que aparecem diferentes culturas e povos a interagir.
Os refugiados que pedem asilo, fugindo de perseguições, violências e situações que põem em perigo a sua vida, têm necessidade da nossa compreensão e acolhimento, do respeito pela sua dignidade humana e seus direitos, assim como da consciência dos seus deveres. O seu sofrimento reclama dos diversos Estados e da comunidade internacional que haja atitudes de mútuo acolhimento, superando temores e evitando formas de discriminação e que se procure tornar concreta a solidariedade também mediante adequadas estruturas de hospitalidade e programas de reinserção. Tudo isto exige uma ajuda recíproca entre as regiões que sofrem e aquelas que, anos após anos, acolhem um grande número de pessoas em fuga e também uma maior partilha de responsabilidades entre os Estados.
A imprensa e os outros meios de comunicação desempenham um papel importante para fazer conhecer, com imparcialidade, objectividade e honestidade, a situação de quantos foram forçados a deixar a sua pátria e os seus afectos e desejam começar a construir uma nova existência.
As comunidades cristãs reservem particular atenção aos trabalhadores migrantes e suas famílias, acompanhando-os com a oração, a solidariedade e a caridade cristã; valorizando aquilo que enriquece reciprocamente e promovendo novos projectos políticos, económicos e sociais, que favoreçam o respeito pela dignidade de cada pessoa, a tutela da família, o acesso a uma habitação condigna, ao trabalho e à assistência.
Sacerdotes, religiosos e religiosas, leigos, e sobretudo os jovens e as jovens, mostrem-se sensíveis e ajudem incontáveis irmãs e irmãos que, tendo fugido da violência, se devem confrontar com novos estilos de vida e com dificuldades de integração. O anúncio da salvação em Jesus Cristo será fonte de alívio, esperança e «alegria completa» (cf. Jo 15,11).
Por fim, desejo recordar a situação de numerosos estudantes vindos de outros países que enfrentam problemas de inserção, dificuldades burocráticas, aflições na busca de alojamento e de estruturas de acolhimento. De modo particular, as comunidades cristãs mostrem-se sensíveis com tantos jovens que, além do crescimento cultural, têm necessidade – precisamente devido à sua tenra idade – de pontos de referência, cultivando no seu coração uma profunda sede de verdade e o desejo de encontrar Deus. De modo especial, as Universidades de inspiração cristã sejam lugares de testemunho e de irradiação da nova evangelização, aparecendo seriamente comprometidas, no ambiente académico, não só em cooperar para o progresso social, cultural e humano, mas também em promover o diálogo entre as culturas, valorizando a contribuição que podem dar os estudantes estrangeiros. Estes sentir-se-ão impelidos a tornar-se, eles mesmos, protagonistas da nova evangelização, se encontrarem testemunhas autênticas do Evangelho e modelos de vida cristã.
Queridos amigos, invoquemos a intercessão de «Nossa Senhora do Caminho», para que o anúncio jubiloso da salvação de Jesus Cristo infunda esperança no coração daqueles que se encontram, em condições de mobilidade, pelas estradas do mundo. A todos asseguro a minha oração e concedo a Bênção Apostólica.
Vaticano, 21 de Setembro de 2011.

BENEDICTUS PP. XVI

Alerta para a fome causada pela seca na região subsariana. População afetada poderia chegar aos 11 milhões de pessoas

A Santa Sé lançou um alerta para o risco de fome e subnutrição que atinge a região africana do Sahel, a sul do deserto do Sara, atingindo uma população estimada em 11 milhões de pessoas.
O secretário da Fundação João Paulo II para o Sahel, em entrevista á Rádio Vaticano referiu que a situação de carestia no Corno de África se estendeu a outros países, que sentem dificuldades “pela falta de água, pela falta de chuvas e, por isso, pela dificuldade de cultivo e de colheita, que este ano se faz sentir de forma particularmente forte”.
D. Giampietro Dal Toso, também secretário do Conselho Pontifício ‘Cor Unum’, fala numa “situação crítica” que nos próximos meses poderá provocar a “fome a muitos milhões de pessoas”.
Os países mais afetados são o Burquina-Faso, Chade, Gâmbia, Mali, Mauritânia, Níger e Senegal.
O Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) refere que “mais de um milhão de crianças estão em risco de ficar gravemente desnutridas” nesta região.
Em 2011, a Fundação João Paulo II para o Sahel distribuiu 1,43 milhões de euros a 176 projetos de ajuda às populações da região.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Índia: Igreja cria comitê especial para combater o tráfico de adolescentes

Índia: Igreja cria comitê especial para combater o tráfico de adolescentes

O tráfico e a exploração de seres humanos, sobretudo de adolescentes e meninas, é uma chaga social que na Índia, segundo estimativas, afeta de 20 a 60 milhões de vítimas, e sobre a qual prospera a criminalidade. Trata-se de uma verdadeira emergência que a Igreja indiana está ajudando a combater, como refere à Agência Fides a Igreja local na Arquidiocese de Calcutá.

A Arquidiocese criou um comitê especial para deter o tráfico de seres humanos e, em particular, que envolve meninas e adolescentes. "Seva Kendra Calcutá", Centro de Serviço Social Diocesano, formou 50 comitês de supervisão em várias comunidades. Os comitês, por sua vez, formam grupos de 30 jovens em cada povoado de Bengala Ocidental, para monitorar e combater o fenômeno. Existem, além disso, 50 grupos de adolescentes que atuam para captar aliciadores em seus povoados.

O Centro utiliza meios tecnológicos modernos, pois está conectado com o departamento do Governo, com outras associações e com os chefes dos povoados: isto facilita e simplifica as operações, que são principalmente de prevenção.

O tráfico de seres humanos é uma forma moderna de escravidão, que inclui exploração sexual, trabalho forçado e violência. As principais vítimas são sobretudo meninas e adolescentes, que estão dispostas a abandonarem seus vilarejos com promessas de um futuro promissor.

ACNUR apela a refugiados sudaneses para que deixem região fronteiriça

ESTADO UNIDADE, Sudão do Sul, 4 de janeiro (ACNUR}) - As bombas caíam do céu de Kordofão do Sul e Zahara* conseguia ouvir quando atingiam sua vila. A garota de 20 anos ouviu as explosões, agarrou seus dois filhos e fugiu. Ela correu desde sua casa em Lehemid, nas montanhas de Nuba, até a próxima cidade. Eles chegaram à cidade de Al Reika e, apesar da distância, as explosões ainda podiam ser ouvidas. Então continuaram correndo até a cidade de Tamanya. Quando bombardeio alcançou Tamanya fugiram para a vila Angola e posteriormente cruzaram a fronteira do Sudão do Sul até chegarem em vida, onde encontraram milhares de outros refugiados acomodados em cabanas construídas entre as árvores. “Estávamos sem nada”, disse Zahara. “Nós corremos, caímos, nos levantamos e voltamos a correr”.
Eles pensaram que estavam salvos. Mas no dia 10 de novembro outra
aeronave de bombardeio se aproximou. O avião deu três voltas ao redor de
Yida antes de liberar sua carga. As pessoas se fugiram em todas as
direções. Duas das bombas caíram na pista nos arredores do campo e
as outras caíram em locais mais distantes. Mas uma bomba foi jogada no
meio de uma escola provisória. As crianças tinham sido evacuadas, mas
Zahara lembra o medo que todos passaram. “As pessoas correram para o
mercado e para a floresta”, disse. “Alguns permaneceram na floresta
por horas”. De fato, cerca de 600 estudantes fugiram após o bombardeio e alguns continuam desaparecidos.
Quando se lembra daquele momento, Zahara sente o medo se apoderar dela.
Havia pouca comida e então ela se preocupou com sua situação e a de seus
filhos. Há poucos dias eles deixaram Yida, pegaram carona com um
caminhão e se transferiram para o centro de trânsito do Alto
Comissariado da ONU para Refugiados (ACNUR), mais ao sul da fronteira.
“Claro que nos sentimos mais seguros aqui”, diz. “Se tivéssemos
sentido segurança em Yida não teríamos vindo para cá”.
O ACNUR e seus parceiros têm expressado fortemente sua preocupação com
o destino de mais de 20 mil refugiados que permanecem no acampamento de
Yida. O maior temor é que a proximidade com a fronteira e os crescentes
enfrentamentos militares coloquem a vida de pessoas inocentes em risco.
Enquanto o ACNUR continua provendo assistência emergencial em Yida, vem solicitando aos refugiados que se transfiram a outros centros e acampamentos mais ao sul do país, os quais estão prontos para recebê-los.

Leia a íntegra desta notícia em: www.acnur.org.b