sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Paulo Almeida desistiu de esperar por uma colocação em uma agência de empregos de Lisboa e atravessou a cidade para entrar em uma longa fila para obtenção de um visto para Angola. “Não há mais empregos decentes em Portugal, a coisa está só a piorar”, diz o jovem de 28 anos enquanto espera do lado de fora do consulado do país africano produtor de petróleo, onde as pessoas em busca de emprego passam a noite para conseguir um bom lugar na fila.
Não são apenas os investidores que estão abandonando os países que estão no centro da crise da dívida da Europa. Nunca tantas pessoas deixaram Portugal desde o fim do regime do Estado Novo em 1974, enquanto os gregos rumam para Austrália e EUA e irlandeses migram em números não vistos desde o fim do século XIX, quando ainda eram parte do Reino Unido. Com Portugal prevendo que sua economia continuará mergulhada na recessão pelos próximos dois anos e o desemprego no nível mais alto desde pelo menos 1983, trabalhadores e empresas estão se voltando para
as ex-colônias Angola, Moçambique e Brasil.
Quatorze das 20 empresas que fazem parte do índice referencial de ações PSI20 da Bolsa de Lisboa estão presentes, ou planejam estabelecer operações, em pelo menos um dos três mercados que vêm crescendo mais rapidamente. Elas incluem a Cimpor-Cimentos de Portugal, a maior fabricante de cimento do país, e a Mota-Engil, sua maior construtora.
“Quando perdemos as colônias, as pessoas pensaram que a Europa seria a solução”, disse Antonio Barreto, ex-ministro da Educação de Portugal. ”Agora, estamos novamente com problemas e as pessoas parecem pensar que as ex-colônias são a saída da crise.”
A diferença do PIB per capita entre Portugal e as três colônias combinadas é a menor desde 1997, segundo estimativas baseadas em dados publicados pelo Banco Mundial (Bird). Portugal foi o terceiro país, após a Grécia e Irlanda, a ser socorrido pela União Europeia e pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). O governo está congelando salários dos servidores públicos, aumentando impostos e vendendo participações em algumas das maiores companhias do país para se enquadrar nos termos do pacote de ajuda de € 78 bilhões (US$ 105 bilhões). A Sonangol, companhia estatal de petróleo de Angola vem investindo em Portugal e o ex-presidente do Brasil Luiz Inácio Lula da Silva exortou as empresas brasileiras a investirem no país. “Uma economia fraca em Portugal significa que precisamos continuar aproveitando as oportunidades de negócios nas ex-colônias e outros mercados de crescimento acelerado”, disse Francisco Lacerda, presidente-executivo da Cimpor-Cimentos de Lisboa, que obtém cerca de 30% de sua receita no Brasil.

Assim como a Grécia e a Irlanda, Portugal, com uma população de cerca de 10,6 milhões, é um país marcado por taxas elevadas de emigração. Cerca de 5,1 milhões de portugueses, ou pessoas de origem portuguesa, vivem fora do país, segundo o Ministério das Relações Exteriores. A taxa de emigração está em aproximadamente 40 mil cidadãos por ano, segundo Barreto. A última vez que essa taxa ficou tão alta foi da década de 1960 até a metade dos anos de 1970, quando Portugal enviou tropas para conter suas colônias africanas durante o fim do regime autoritário liderado por Antonio de Oliveira Salazar, afirma Barreto.

O número de cidadãos portugueses registrados em Angola, cresceu 64%, para 91.854, no fim de 2010 em comparação a dois anos antes, segundo dados do Observatório da Emigração de Lisboa. Em Moçambique esse número cresceu 23% para 20.413 no ano passado, em comparação a 2008, enquanto o número de portugueses registrados no Brasil aumentou 9% para 705.615.
A economia portuguesa deverá encolher 2,2% este ano e 1,8% em 2012, segundo previsões do governo. Na última década, ela cresceu a uma taxa média de menos de 1% ao ano. O Brasil deverá crescer 3,8% em 2011 e 3,6% em 2012, segundo previsões do FMI. Angola, que ainda está sendo reconstruída depois de uma guerra civil de 27 anos que se seguiu à sua independência de Portugal, em 1975, deverá crescer 3,7% este ano e crescimento de Moçambique provavelmente será de 7,25% este ano e de 8% no ano que vem, segundo o FMI. Angola respondeu por 15% da carteira de pedidos de € 3,4 bilhões da Mota-Engil no primeiro semestre do ano. “É um de nossos principais mercados”, diz o presidente-executivo Jorge Coelho.
As relações empresariais entre a ex-potência colonial e a outrora colônia também funcionando nos dois sentidos. Cheia de dinheiro das exportações de petróleo, a companhia estatal de petróleo angolana Sonangol controla 12,4% do Banco Comercial, o segundo maior banco de capital aberto de Portugal. Isabel dos Santos, filha do presidente angolano, José Eduardo dos Santos, controla 9,9% do Banco BPI de Portugal e 10% da Zon Multimedia SGPS, a maior operadora de TV a cabo de Portugal. “Com a economia aquecida, é normal companhias e investidores angolanos começarem a investir em Portugal e outros mercados estrangeiros”, disse Bornito de Sousa, ministro da Administração Territorial de Angola.
Em agosto, a Eletrobras disse que estava negociando com o governo português a compra de uma participação na EDP -Energias de Portugal. O governo está estimulando os negócios com as ex-colônias, mas não quer perder todos os seus engenheiros e administradores de empresas. “Se nada for feito, certamente todos nós vamos emigrar”, diz Álvaro Santos Pereira, um ex-professor de economia, em seu livro “Portugal na Hora da Verdade”. “O governo está totalmente comprometido para que isso não aconteça.”

Na Irlanda, a emigração atingiu o patamar mais alto desde o século XIX no ano até abril. O jornal “Kathimerini” de Atenas publicou recentemente que os gregos estão sendo atraídos por países como o Canadá e a Austrália.
Almeida pretende se juntar ao pai em Angola, também trabalhando no setor da construção. “Assim que eu me estabelecer em Angola pretendo voltar e cuidar do visto de minha mãe, para que ela posse se juntar a mim e ao meu pai”, diz ele. “A família inteira vai se mudar para lá.”

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