terça-feira, 17 de janeiro de 2012

CARTA ABERTA

“Não mais estrangeiros nem hóspedes, mas da família de Deus” (cf. Ef 2,19)

A Congregação das Irmãs Missionárias de São Carlos Borromeo - Scalabrinianas realizou de 24 a 29 de novembro de 2011, o IV Seminário Congregacional de Pastoral dos Migrantes. Este evento teve lugar no Centro Diocesano de Pastoral, em Caxias do Sul - RS, Brasil, e contou com a participação de 76 pessoas de diversos países entre elas, Irmãs Missionárias Scalabrinianas, Leigos Missionários Scalabrinianos e convidados.
O Seminário teve como tema: “Rostos da Migração, um sinal dos tempos” e o objetivo de aprofundar diferentes realidades da migração para responder com dinamismo e profecia aos desafios atuais.
Este evento consistiu no estudo, análise e aprofundamento da complexidade das migrações em seus diferentes aspectos: migrações contemporâneas características e tendências; mudanças climáticas e deslocamentos ambientais; a feminilização da migração e o diálogo intercultural e interreligioso. Evidenciou-se que o fluxo migratório, no seu duplo componente de movimento para dentro e para fora, não constitui mais uma experiência restrita, limitada a algumas áreas, mas é um fenômeno mundial, comum a todos os continentes.
Conforme a OIM, o número de migrantes internacionais totaliza 214 milhões, e destes, 49% são mulheres. O número de refugiados reconhecidos pelo ACNUR e UNRWA totalizam mais de 20 milhões, e a maioria destes se encontram na África e Ásia. Nos últimos anos, chama também a atenção a questão dos deslocados ambientais.
A recente crise econômica tem provocado o retorno de migrantes aos seus países de origem. Há sinais evidentes que os deslocamentos para os países desenvolvidos – principais alvos da crise – diminuam, com o concomitante aumento de fluxos para países emergentes. Ao que tudo indica, haverá nos próximos anos uma maior diversificação dos fluxos e, talvez, uma acentuada circularidade das migrações. Ao mesmo tempo, haverá deslocamentos mais ou menos forçados, provocados por fatores contingentes e contextuais, como conflitos bélicos, crises políticas e fenômenos climáticos e/ou ambientais.
A presença e atuação da Congregação junto dos migrantes é um diferencial na Igreja e na sociedade, ao difundir apreço pela pessoa do migrante, ao reconhecê-lo como sujeito e protagonista de sua história, capaz de provocar transformações na sociedade onde está inserido, tornando-o cidadão na nova pátria.
O migrante, participando do projeto divino, colabora para que a terra e os espaços eclesiais e comunitários se tornem lugar de fraternidade, de partilha e de gratuidade, antecipação daquele banquete do Reino, onde todos e todas somos da mesma família de Deus (Ef 2,19), onde ninguém é excluído, e sim chamados pelo Pai pelo próprio nome.
A Congregação das Irmãs Missionárias Scalabrinianas e o Movimento dos Leigos Missionários Scalabrinianos, por força do Carisma, consideram os migrantes sujeitos de direitos e portadores de cultura, caminham com eles, fazendo processo de integração e construção de cidadania. Reconhece-os como “profetas de mudanças” portadores de esperança, questionam o atual paradigma de desenvolvimento, o seu modelo civilizatório e sinalizam novas formas de convivência.

Constatações

Constatou-se que, em diversos países de destinos migratórios e sob a pressão de nacionais, os Governos aprovam leis que desconsideram as convenções e acordos internacionais; as políticas migratórias frequentemente não consideram os direitos humanos, ferindo os migrantes fortemente em sua dignidade; migrantes são retidos em centros de detenção sem as mínimas condições humanas, fronteiras são fechadas para a circulação de pessoas, enquanto são abertas livremente para as finanças, comércio, fomentando assim, o crescimento do racismo e da xenofobia.
Esta realidade é interpeladora, pois, além dos motivos econômicos, multiplicam-se questões políticas, sociais e ambientais desencadeadoras de movimentos migratórios. Nesse contexto, intensifica-se a violação de direitos humanos expressos principalmente no tráfico de pessoas, trabalho escravo e servidão por dívida e criminalização dos migrantes. Os meios de comunicação, sustentados pelo sistema político, apresentam os migrantes como mentores de criminalidade e invasores que se apropriam dos recursos do país onde chegam.
As/os Participantes do Seminário com um coração compassivo e uma atitude solidária interpelam:
À Igreja
 Reconhecer os migrantes e refugiados como “sinal dos tempos”, através dos quais Deus a chama para viver mais plenamente a dimensão católica e sua vocação de peregrina, pois, ela é ponto de referência muito importante para a proteção da identidade dos migrantes. Uma das grandes responsabilidades da mesma é trabalhar para a formação de seus líderes, buscando mudança de atitude diante desta realidade e respondendo com flexibilidade às novas demandas apresentadas pelos movimentos migratórios.
Aos Governos e à Sociedade Civil
 Respeitar e defender a dignidade e os direitos humanos, especialmente a liberdade de consciência e liberdade religiosa dos migrantes e refugiados que se encontram em situação regular ou irregular, levando em consideração que apenas políticas restritivas em relação às pessoas em mobilidade não são idôneas para regularizar os fluxos migratórios.
 Desenvolver e/ou criar oportunidades para a reunificação familiar e a unidade da família migrante. Manter os laços familiares é essencial para ser plenamente humanos e garantir a estabilidade social.
 Usar de todos os meios à disposição, para evitar tragédias que resultem em perda de vidas de migrantes nas inúmeras fronteiras do mundo.
 Tratar os migrantes e refugiados sem prejuízos e combater o racismo, a xenofobia e o exagerado nacionalismo.

As/os participantes reunidas/os no IV Seminário de Pastoral dos Migrantes estão conscientes da complexidade do movimento global dos migrantes e refugiados no mundo atual e do grande sofrimento imposto a milhões de pessoas.
Renovam o compromisso com os migrantes, fortalecendo as ações locais numa perspectiva global, e trabalhando em rede com organizações nacionais e internacionais.
Reconhecem o migrante, nos seus diferentes rostos, como ‘sinais dos tempos’ e o chamado que Deus faz a todos/as para viver mais plenamente a acolhida e a solidariedade na Igreja e no mundo, caminhando com os migrantes e refugiados nas pegadas de Jesus e em seus ensinamentos, especialmente tendo presente a verdade por Ele proclamada no discurso escatológico: “Era migrante/ peregrino e me acolheste” (Mt 25, 35).

Caxias do Sul/RS, 29 de Novembro de 2011.

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