segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Bolívia depois das eleições

Evo Morales, a tempo de agradecer o apoio do povo boliviano, manifestou que é hora de acelerar as mudanças

11/12/2009 - Eduardo Paz Rada

Se bem estava “cantado” que Evo Morales conseguiria a reeleição presidencial no primeiro turno para conduzir a Bolívia durante os próximos cinco anos, que provavelmente se converterão em dez, não era muito claro quais seriam as margens de controle nas regiões que haviam sido o reduto da oposição neoliberal e conservadora durante os últimos quatro anos.

Os sucessivos triunfos de Morales, em eleições, consultas e referendos, desde 2005, tem como fundamental antecedente a rebelião popular de outubro de 2003 que jogou abaixo todo o sistema político e partidos que haviam levado adiante a política neoliberal que destruiu a estrutura econômica do país e entregou os recursos e empresas estratégicas, a terra e a administração financeira às transnacionais e à oligarquia local.

Foram as consignas de recuperação dos recursos naturais, especialmente o gás, e do Estado, através de uma Assembléia Constituinte, e de expulsão dos políticos corruptos que marcaram os últimos seis anos da vida nacional. Este impulso social, imposto pelos movimentos populares teve sua continuidade e projeção na derrota dos setores oligárquicos e terratenientes de Santa Cruz, Beni e Pando em setembro e outubro de 2008, incluindo a expulsão do embaixador dos Estados Unidos na Bolívia.

Agora, com verificação eleitoral, os desafios do governo se abrem a novas perspectivas. O programa de governo apresentado pelo Movimento ao Socialismo (MAS) está claramente orientado ao desenvolvimento clássico da sociedade moderna, sob a consigna de “Revolução Industrial, Viária, Tecnológica e Institucional” que propõe romper a colonial exportação de matérias primas. O discurso indigenista passou a um segundo plano, assim como a “Revolução Democrática e Cultural” sustentada durante o período 2006-2009.

Evo Morales, a tempo de agradecer o apoio do povo boliviano, manifestou que é hora de acelerar as mudanças, ponderou o voto recebido da classe média e respondeu com a referência anti-imperialista do projeto dos países da Alternativa Bolivariana das Américas (Alba) quando grupos de manifestantes faziam um coro: “Socialismo, socialismo”.

Ao haver sido pulverizada a oposição conservadora, começaram a surgir vozes empresariais para somar-se abertamente ao projeto de governo, por um lado, e os grupos opositores regionais a reagrupar-se para buscar melhores resultados nas eleições de governadores e prefeitos nas eleições departamentais (estaduais) e municipais de abril de 2010, aonde poderiam rearticular-se os setores oligárquicos.

Por outra parte, no seio das forças políticas e sociais que respaldam Morales, começa a remover-se tendências que se manifestaram mornamente até agora. Os setores indigenistas buscam um maior protagonismo nas instâncias governamentais, os bolivarianos uma maior vinculação e compromisso com os postulados latino-americanistas e de integração econômica e política, os esquerdistas uma definição socialista e os liberais manter as boas relações existentes com as transnacionais petroleras, mineradoras e financeiras.

Finalmente, o contexto regional e mundial vai marcar também os passos do segundo mandato de Evo Morales. A multipolaridade abriu vários polos que pretendem hegemonia econômica, especialmente com a emergência de China, Índia, Rússia e Brasil, que se somam a União Européia e Estados Unidos e buscam recursos naturais, com poderosas transnacionais, que existem na Bolivia. Regionalmente, as prováveis mudanças no timão político no Brasil, Chile e Argentina, junto a estratégia militar imperialista manifestada em Honduras e Colômbia, abrem um jogo geopolítico ainda indefinido.

Bolívia, junto a outros países, na União das Nações Sulamericanas e a Alba tem um grande desafio batendo à porta.

Eduardo Paz Rada é diretor do curso de sociologia da Universidade Mayor de San Andrés (UMSA), universidade pública de La Paz, Bolivia.

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