Autoridades americanas passam a fiscalizar ônibus que rumam para a fronteira - o que inibe ilegais de voltar ao país de origem
15 de agosto de 2011 | 0h 00
Marc Lacey, The New York Times - O Estado de S.Paulo
Um agente da imigração americana entrou no ônibus prestes a cruzar a fronteira entre Estados Unidos e México e pediu os documentos de todos os passageiros.
"Documentos", gritou, examinando atentamente as pessoas enquanto caminhava pelo corredor do ônibus.
Esse tipo de controle não é surpresa diante de toda atenção concentrada na imigração ilegal. Mas esse ônibus estava lotado de imigrantes que estavam deixando os Estados Unidos e não entrando no país.
Diversas leis de imigração sancionadas no Arizona e em outros Estados americanos estão tornando tão difícil a vida dos imigrantes ilegais que eles estão preferindo fazer a mala e voltar para casa. Mas a realidade na fronteira é outra: sair dos Estados Unidos está mais complicado do que nunca, o que levou muita gente a se preocupar com a possibilidade de essa fiscalização na saída não só dissuadir os imigrantes ilegais de deixar o país, mas colocá-los num beco sem saída, ultrajados se ficarem e potencialmente presos quando tentam deixar o solo americano.
Antigamente, entrar no México, vindo de San Diego, El Paso, Texas, ou Nogales, era muito fácil, sem nenhuma fiscalização do lado americano da fronteira e quase nenhuma averiguação do lado mexicano. Mas as medidas adotadas pelo governo Barack Obama para reduzir o fluxo de armas e dinheiro de drogas dos EUA para o México mudou a situação.
Os agentes entram nos ônibus a caminho do sul, o meio de transporte utilizado pelos imigrantes para retornarem às suas cidades e povoados. Nos postos de fronteira permanentes, os guardas também param os veículos e fazem uma acareação dos pedestres que cruzam a fronteira a pé.
Ao interrogar as pessoas que deixam o país, para saber se estão fazendo contrabando, os agentes com frequência deparam-se com imigrantes que não estão contrabandeando, mas não têm permissão para permanecer nos Estados Unidos. Os que não têm antecedentes criminais são autorizados a seguir. E como entram para a base de dados do governo, sofrerão penalidades mais severas se forem pegos novamente nos EUA. Os imigrantes com registros criminais enfrentam um tratamento mais agressivo. São presos e oficialmente deportados.
Segundo as autoridades, o objetivo não é desencorajar os imigrantes ilegais a sair do país, mas conter o fluxo do contrabando. De acordo com um recente relatório semanal do serviço alfandegário do Arizona, entre 18 e 24 de julho, foram confiscados US$ 22 mil em dinheiro e recuperadas 6 armas e 5.943 cartuchos de munição. Os agentes detiveram 1.606 imigrantes ilegais.
Em entrevistas, imigrantes de partida ofereceram diversas razões para deixar o Arizona. As leis e as varreduras da polícia tornaram sua vida impossível. A desaceleração econômica também dificultou a sobrevivência. Houve muitos que alegaram motivos de ordem pessoal. Para Analleli Ríos Ramírez, de 24 anos, foi a morte do cunhado, em Cuernavaca, que levou ela e o marido a voltar para o México, para ficar mais próximos da família. "Decidimos voltar a viver no nosso país", disse Analleli, que trabalhava como gerente de uma padaria num centro de compras próximo de Phoenix.
Alguns contestam essa averiguação de documentos dos imigrantes que deixam os Estados Unidos. E as críticas partem daqueles para quem os imigrantes ilegais são proscritos e dos que simpatizam com sua luta para melhorar de vida.
"Por que vamos usar recursos detendo pessoas que, de qualquer maneira, estão saindo do país?", pergunta Jennifer Allen, do grupo de direitos humanos de Tucson Border Action Network, que dá assistência aos imigrantes no Arizona. "Há pessoas que querem deixar os Estados Unidos e se perguntam se devem se arriscar."
A possibilidade de a política do governo desencorajar os imigrantes ilegais de sair do país tem levado até mesmo grupos que defendem controles mais rígidos nas fronteiras a pensar duas vezes sobre essa fiscalização das pessoas que seguem para o sul. "É a única situação em que defendemos uma modificação nas nossas leis de imigração", disse William Gheen, presidente do Americans for Legal Immigration PAC, no ano passado.
"Dificultar a saída pode levar alguns imigrantes a, em vez de deixar o Arizona e outros Estados com leis imigratórias severas, mudar-se para regiões mais hospitaleiras do país", diz William Gheen.
Apesar de milhares de imigrantes terem sido detidos na saída para o México, as autoridades dizem que não podem calcular o número dos que foram detidos por permanência ilegal no país em relação aos que foram presos por contrabando. E alguns imigrantes disseram ter sido confundidos pela polícia.
Temor. Recentemente, quando se preparava para cruzar a fronteira e se reunir com o marido, que já havia partido para o México meses antes, Analleli Ríos Ramírez começou a ficar nervosa, pois não estava com os documentos em ordem. Ela entrou ilegalmente nos Estados Unidos há mais de uma década, com 11 anos, acompanhando a mãe. Agora, retorna a um país que mal conhece. "Acho que é essa a vontade do Arizona: que eu deixe o país", disse ela, embalando seus pertences, antes de partir. "E a minha preocupação é que possam me pegar na saída." Mas ela e sua picape carregada cruzaram a fronteira que separa Nogales, Arizona, da Nogales mexicana, sem nenhum problema.
Funcionários da imigração dizem que não conseguem fiscalizar todas as pessoas e procuram ser discretos quando examinam os documentos dos imigrantes de saída. A mãe de Analleli, Teodora Martínez, saiu do país alguns meses antes e não tinha documentos quando um agente abordou o ônibus em que ela viajava. Teodora apresentou um cartão de identidade emitido pelo consulado mexicano em Phoenix, que não provava residência legal. O marido dela, Cesar Valle Martínez, mostrou uma identidade falsa. O agente examinou os papéis com desconfiança e depois conversou com um colega que também estava no ônibus. O casal viajava com várias crianças que possuíam passaporte americano.
"Podem ir", disse finalmente o agente, que devolveu os documentos e saiu do ônibus, permitindo que a família retornasse ao México. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO
É JORNALISTA
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