quarta-feira, 20 de abril de 2011

Novo fluxo migratório estreita relação Brasil-Portugal

“Terra à vista”, disseram os portugueses quando descobriram o Brasil, em abril de 1500. Atualmente, entre o final do século 20 e início do 21, imigrantes brasileiros que decidiram “descobrir Portugal” têm dito “Emprego à vista”. Segundo a geógrafa Aline Lima Santos, o atual contexto global que envolve inversões de fluxos migratórios ocasionou uma nova relação entre Brasil e Portugal. Esse novo relacionamento serve para os dois países como um “navio” para que ambos alcancem a desejada importância na Divisão Internacional do Trabalho e a inserção na geopolítica mundial.

“A ideia de empreender o estudo surgiu quando me dei conta de que nos dias de hoje as relações entre Brasil e Portugal são mais importantes do que muitos imaginam. Decidi então descobrir onde estava essa importância, e porquê”, conta Aline. Na pesquisa “Mudança de vento: a migração do Brasil para Portugal no final do século XX e início do século XXI”, a geógrafa analisa as consequências e causas da inversão do fluxo migratório entre esses dois países, nesse período.

Para chegar às conclusões de sua pesquisa de mestrado, Aline foi a Portugal, onde esteve no período de setembro a novembro de 2009, e entrevistou cerca de 40 brasileiros que lá residiam. O estudo apontou alguns dos principais motivos de estarem lá, e onde e como eram inseridos no próprio território ou no mercado de trabalho. A geógrafa também conheceu quais eram suas necessidades como estrangeiros em uma terra distante, e como poderiam enfrentar os obstáculos da imigração.

Ondas do Atlântico
Segundo o estudo, a primeira onda de migração para Portugal aconteceu na década de 1980, em meio a uma crise econômica e política no Brasil. “Nessa época, os membros da classe média, principalmente os parentes de portugueses, depositaram a esperança na “terra dos antepassados” com o objetivo de recuperar o poder aquisitivo. O padrão educacional desses emigrantes chegava a ser até mesmo superior ao dos portugueses”, aponta a geógrafa.

“No final da década de 1990, também num contexto de crise econômica, como a que atingiu países pobres como o México e que teve repercussões para o Plano Real, aconteceu outra onda de migração. Desta vez, os “tripulantes” eram, em sua maioria, membros de uma classe média baixa, o que acabou mudando o perfil dos imigrantes brasileiros em Portugal”, acrescenta.

Emprego no ‘velho mundo’
Como apontam as entrevistas e as visitas a consulados e associações feitas pela pesquisadora, os brasileiros que se mudaram para Portugal, muitas vezes, ao buscarem um emprego, encontram com certa “naturalidade” um espaço relacionado à entretenimento, lazer e serviços em geral, como em lojas, bares ou restaurantes. Segundo Aline, esse fato está vinculado à imagem que muitos portugueses constroem dos brasileiros, como sendo um povo simpático e alegre. “É curioso que muitos portugueses dizem sentir-se ‘bem-atendidos’ por brasileiros”, conta a geógrafa.

Contudo, Aline constatou que nem sempre a ex-metrópole oferece de fato uma melhora na condição financeira. “Nesse momento, para o imigrante, surgem mais dificuldades e necessidades”, relata a autora. De acordo com a pesquisa, essas necessidades dos brasileiros “forçam” os dois países a se relacionarem de forma mais estratégica e “cooperacional”, visto que nos ventos da Globalização “migração” é um tema muito delicado para a Europa, muitas vezes associado à criminalidade, violência ou terrorismo.

Facilidades na “terra firme”
Mas as os motivos pelos quais Portugal oferece mais facilidades para as pessoas vindas do Brasil que para imigrantes dos países do leste europeu, por exemplo, vão além da delicadeza do tema. “Para esses dois países, a população que passam a compartilhar se torna uma espécie de argumento para que ambos se apoiem, também em outros assuntos políticos que não só a migração”, afirma Aline.

Além disso, segundo a autora, essas “facilidades” existem porque há peculiaridades no caso Brasil-Portugal, como a experiência do Governo português em lidar com a emigração, já que 30% de portugueses não vivem em seu país de origem. “Por causa dessa experiência, os portugueses encaram as associações de brasileiros imigrantes que surgem em seu país como uma espécie de instrumento que pode auxiliá-los para que conheçam e cuidem melhor dessa população, além de aprender a lidar com ela mais satisfatoriamente”, explica a pesquisadora.

“Por conta disso, essas associações ganham conteúdo e peso político, e também capacidade de intermediar a relação entre os dois países, podendo influenciar em decisões diplomáticas e solicitar dos dois Estados envolvidos atitudes que atendam às necessidades dos imigrantes”, completa. De acordo com a experiência da geógrafa, a chamada Casa do Brasil em Lisboa é um exemplo desse tipo de associação.

“Considerando a atual conjuntura global, que incentiva os fluxos imigratórios valorizando as “experiências no exterior”, o Brasil cumpre um papel interessante no sentido de estabelecer debates que olhem para a imigração de um modo positivo. Hoje em dia, até mesmo o conceito de cidadania sofre uma redefinição, também por conta desses fluxos. Você pode ser português, mas também se sentir brasileiro, ou vice-versa”, conclui a geógrafa.

Mais informações: (11) 3106-5747, (11) 6962-2232, email: alinelss@yahoo.com.br

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