sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Entrevista - Governo de fato mantém perseguição aos meios de comunicação

Adital - Após 109 dias do golpe de Estado, que depôs do poder o presidente Manuel Zelaya, a situação de repressão policial, militar e de violação aos direitos humanos do povo hondurenho segue de forma intensa.

Até o momento, as negociações realizadas nos últimos dias não conseguiram restabelecer a paz e mesmo com a interrupção das medidas que suspendiam os direitos, a perseguição à liberdade de expressão continua acontecendo.

Para compreender melhor a situação pela qual estão passando os meios de comunicação em Honduras a Adital conversou com Karla Rivas, coordenadora do Departamento de Imprensa da Rádio Progresso (http://www.radioprogresohn.com).

Adital - Muitos analistas assinalam a repressão aos meios de comunicação hondurenhos como uma das mais fortes dos últimos anos vividos na América Latina. Como vocês puderam enfrentar essa situação?
Karla Rivas - Como rádio estamos expostos assim como qualquer meio que dá abertura à opinião contrária ao regime. Isso nós sabemos e experimentamos no próprio dia do golpe. Mas no dia seguinte, a rádio afina sua posição editorial em consonância a nossa missão institucional e à trajetória do meio nas últimas décadas: parciais para com os setores menos favorecidos.
Apesar de ter uma posição muito crítica para todas as autoridades por sua falta de visão, descumprimento de promessas e atos de corrupção, desde ante do golpe de 25 de junho, nunca como agora temos sentido tanta repressão. Também não tínhamos visto o fechamento de uma rádio e uma televisão, a autocensura de vários meios e jornalistas, e sem dúvida a atitude tão servil de comunicadores, jornais e emissoras, que sem pudor algum mostraram quem, de fato, são.

Adital - Apesar de haver derrogado as medidas de suspensão de direitos, a verdade é que o cerco e a perseguição da liberdade de expressão continuam vigentes. Como se vive tendo que lidar diariamente com estes tipos de coerção?
Karla Rivas - Na realidade se derrogou o Decreto Executivo PCM-M-016-2009, que suspendia garantias constitucionais, mas no mesmo dia entrou em vigor o Acordo Executivo No. 124-2009 especificamente contra os meios de comunicação.
Dito acordo, instrui à Comissão Nacional de Telecomunicações (Conatel), "revogar ou cancelar a permissão e licenças de operação naqueles meios de radiodifusão sonora e de televisão que emitam mensagens que gerem apologia ao ódio nacional, afetação de bens jurídicos protegidos, bem como também um regime de anarquia social na contramão do Estado democrático…," Mas de qual Estado estamos falando?

Adital - Como podemos definir, atualmente, o panorama dos meios de comunicação em Honduras?
Karla Rivas - Completamente sem defesas. O Comissariado Nacional dos Direitos Humanos não funciona, não prosperam recursos na contramão de decretos que atentam contra a liberdade de expressão. Muitas empresas pressionam ou tiraram sua publicação daqueles meios que não seguem o discurso oficial.

Adital - Como os profissionais conseguiram se esquivar do cerco e manter a população informada?
Karla Rivas - Arriscando sua segurança e a sua família, a cada vez que sua voz vai ao ar ou se publica sua assinatura na matéria escrita. Outra é através de alianças com outros meios locais, mas especialmente com meios internacionais que dão vazão aos eventos, lutas e sacrifícios do povo hondurenho. Acrescento uma mais, dando informação e análise, assim o ouvinte forma seu próprio critério.

Adital - Uma das saídas para o exterior foi a transmissão via internet. Continua funcionado?
Karla Rivas - Sim. Dado seu imediatismo, a internet teve um papel fundamental, especialmente para driblar o cerco midiático, despir as mentiras e revelar as atrocidades do regime. Em muito também contribuiu em manter diversas regiões conectadas, mas seu uso ainda é muito limitado no interior do país. Também, é uma janela vulnerável a ataques, como experimentamos em nosso sítio dezenas de vezes nos últimos meses.

Adital - No caso da Rádio Progresso, especificamente, quais foram as dificuldades enfrentadas para seguir em funcionamento?
Karla Rivas - Enumero algumas: Ameaças contra nossos jornalistas e nosso diretor; Detenção ilegal de um companheiro enquanto transmitia uma repressão policial; Levantar arquivo de seguimento por parte de militares nacionais; Interrupção do fluido elétrico em reiteradas ocasiões, trazendo como consequência a queima de vários equipamentos e o aumento do uso de combustível para fornecer energia através de um gerador local; Os decretos e acordos executivos que restringem a liberdade de expressão.

Adital - Como comunicadores, como avaliam esses últimos diálogos entre representantes de Manuel Zelaya e do governo de fato?
Karla Rivas - O diálogo está baseado em interesses de grupos, por isso não podemos ter esperanças em possíveis acordos, porque não há dados que indiquem que esses serão a favor do povo.
Apostamos no diálogo como ferramenta democrática para encontrar pontos de consenso, mas no fundo o que se precisa é avançar para uma nova conjuntura que abra um espaço amplo de discussão para construir um novo pacto social.

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