sexta-feira, 17 de junho de 2011

Dia do Migrante

Dom Demétrio Valentini
Bispo de Jales (SP) e Presidente da Cáritas Brasileira
Adital
Este domingo, por anteceder ao dia vinte de junho, é o Dia Nacional do Migrante, segundo o calendário pastoral da CNBB.

Isto significa que a Igreja faz questão de colocar a realidade migratória no contexto do domingo, dia destinado à celebração do mistério cristão. Colocado o domingo como referência, fica fácil ampliá-la para uma semana, como de fato se tornou tradição do Serviço Pastoral dos Migrantes, incumbido pela CNBB para acompanhar de perto os problemas vividos pelos migrantes em nosso país, nos diversos contextos em que se encontram. Em cada ano, precedendo o dia 20 de junho, se realiza a "Semana do Migrante”.

Quando a celebração é de um dia só, a data se limita a ser uma efeméride vazia, como existe dia para tudo no calendário da ONU! Mas quando se propõe uma semana, é para encarar a realidade com mais atenção, entender o que ela nos diz, e tomar as providências que ela nos sugere.

Que a realidade migratória é complexa se comprova pelo fato da própria bíblia ter assumido um paradigma migratório como sujeito representativo da humanidade. Seja individualmente, na pessoa de Abraão. "Meu pai era um arameu errante”, diz o livro do Deuteronômio (26,5). Seja coletivamente, na experiência do povo de Israel, que forjou sua identidade nacional na experiência da penosa e longa migração através do deserto, saindo da escravidão do Egito, em busca de sua libertação humana e espiritual.

A realidade migratória acaba expressando a problemática humana, que perdura ao longo da história.

Entre tantas facetas do problema migratório, sempre inquietou uma contradição que perdura e se acentua cada vez mais. No mundo globalizado de hoje, o sistema econômico mundial faz questão de defender, e de exigir, a absoluta liberdade de migração dos capitais, enquanto forja obstáculos cada vez maiores para impedir a migração dos trabalhadores.

Não é nenhuma indiscrição perguntar por que. Pois se temos o dever de dar a razão de nossas esperanças, como São Pedro nos anima a fazer, temos também o direito de saber as razões de nossas desgraças.

Olhando a grande facilidade que tem hoje o capital, sobretudo o financeiro, de buscar as aplicações que mais lhe garantam dividendos, seja onde for, em qualquer bolsa de valores ou em qualquer banco do mundo, compreendemos que ele se move na busca do lucro maior que ele pode auferir. Assim, a grande migração de capitais especulativos, tem a cândida e evidente razão do lucro, que os move e direciona.

Ao passo que a tenaz, e cada vez mais sofisticada política de coibir os fluxos migratórios humanos, se entende a partir do objetivo de impedir que mais pessoas venham auferir as vantagens do sistema econômico globalizado.

Assim, no topo da globalização, encontramos a mesma tensão das origens do capitalismo: quanto menos se remunera o trabalho, mais dividendos sobram para o capital. Estamos ainda no mesmo mundo.

Com uma diferença a ser advertida com seriedade. Tempos atrás os prejudicados eram os trabalhadores, considerados singularmente. Agora os prejudicados podem ser os países. Pois com a mesma facilidade com que vêm, os capitais podem sair de um determinado país, quando eles não têm vais vantagens de lá permanecer. Este cenário começa a se desenhar quando se verifica uma forte tendência à desnacionalização da indústria, e também da agricultura, e em estágio mais grave quando se acentua o processo de desindustrialização de um determinado país.

É muito conveniente que o Governo comece a fazer as contas, para verificar a quantas anda nossa dependência externa, e em que medida se acentua o processo de desindustrialização do Brasil.

Assim, os migrantes continuam cumprindo sua saga, mas também seu indispensável serviço de alerta sobre os rumos da humanidade. Eles continuam testemunhando que o mundo ainda não entrou nos eixos da fraternidade.

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