Pe. Alfredo J. Gonçalves, CS
Os Estados Unidos voltam à carga na tentativa de criminalização dos imigrantes. Começou com o Estado que está na fronteira com o México, por onde milhares de imigrantes tentam anualmente um futuro mais promissor nos EUA. A governadora do Arizona, Jan Brewer, aprovou uma lei de “tolerância zero” com os estrangeiros ilegais. A nova legislação confere à polícia o direito de parar e exigir de qualquer pessoa os documentos que comprovem sua legalidade ou não no país, além de prisão sem mandado.
Trata-se da “lei mais severa de anti-imigração dos EUA, que torna crime estadual a presença de um imigrante ilegal no Estado e permite à polícia comum checar o status legam da pessoa sobre quem paire ‘dúvida razoável’” (Cfr. Andréa Murta, Folha de São Paulo, 24/04/10, pág. A14). A quem caberia o atarefa de interpretar a expressão “dúvida razoável”, tão porosa e permeável a indefinições? À própria polícia? Não é difícil prever o que isso significa em termos de insegurança para os estrangeiros. O próprio presidente Barack Obama manifestou preocupação com a atitude da governadora, temendo que o mesmo tratamento se estenda a outros estados do país.
Convém não esquecer que a Diretiva de Retorno, aprovada pelo Parlamento Europeu em agosto de 2008 e que deverá entrar em vigor em julho de 2010, permite igualmente prender e deportar todo e qualquer imigrante ilegal dos diferentes países do velho continente. Está declarada uma nova “caça às bruxas”! Depois do atentado ao Word Trade Center, na cidade de New York, em 11 de setembro de 2001, os imigrantes tem sido duplamente criminalizados: como “bodes expiatórios”, responsáveis por inúmeros distúrbios sócio-políticos e, não raro, confundidos com representantes do narcotráfico e do crime organizado em escala mundial. Quem o diga a proliferação de grupos neonazistas e neofacistas na Alemanha, França, Reino Unido, África do Sul, Estados Unidos, entre outros.
O mundo rico procura rechaçar o direito de ir e vir, garantido pela Declaração Universal dos Direitos Humanos. Fecha-se e isola-se em suas fortalezas e em suas finanças construídas, em grande parte, com as riquezas historicamente saqueadas dos países colonizados. Reforçam a rigidez de suas leis, ao mesmo tempo que vão erguendo muros visíveis e invisíveis. Temem perder privilégios ou dividir o conforto com outros povos e pessoas. Exigem padrão de vida responsável e sustentável com os recursos limitados do planeta, desde que para os outros!
Mas, em menor grau, o mesmo tratamento se reproduz no caso dos africanos, asiáticos e latino-americanos que, de forma irregular, tentam melhores condições de vida em cidades do Terceiro Mundo, tais como São Paulo, Manaus, Porto Alegre, Buenos Aires, Santiago do Chile, entre outras. A xenofobia não tem fronteiras. E a linha que divide Primeiro e Terceiro Mundo passa, hoje em dia, pelo interior de cada país. Talvez, como pretendem alguns, seja mais indicado falar de “países de maioria rica”, de um lado, e “países de maioria pobre”, de outro.
Cabem três rápidas observações. Primeiro, os países centrais ou as capitais dos países periféricos parecem não reconhecer que os imigrantes são em boa medida a garantia de seu conforto, enquanto constituem a mão-de-obra dos serviços mais sujos, pesados e mal remunerados. A situação irregular torna-os vulneráveis a todo tipo de exploração, sejam em termos trabalhistas, seja em termos sexuais. A alcunha de “clandestinos” vai acompanhada com o estigma do preconceito e da discriminação.
Em segundo lugar, o mundo desenvolvido tampouco parece reconhecer o sangue novo e o oxigênio primaveril que milhares de jovens provindos de regiões e países periféricos injetam nas veias de organismos muitas vezes envelhecidos, cansados e debilitados. São forças vivas que penetram em sociedades muitas vezes ameaçadas pela decrepitude, o ocaso ou a aproximação do outono. O Documento de Aparecida, por exemplo, chama a atenção para a esperança renovada que pode significar a chegada dos imigrantes a uma nova região ou país. Se, por uma parte, se apresentam como “problema” para a polícia e para as autoridades aduaneiras, por outra, constituem uma “oportunidade” para a Igreja. Oportunidade de encontro, confronto e enriquecimento no contato de culturas e povos. Neste sentido o texto afirma que “os migrantes que partem de nossas comunidades podem oferecer valiosa contribuição missionária às comunidades que os acolhem” (Cfr. DA, nºs 411-416).
Por fim, os filhos dos países ou regiões desenvolvidas parecem ainda esquecer que, em séculos passados, milhões de seus habitantes construíram o próprio futuro migrando para as regiões ou países subdesenvolvidos, às vezes colonizados ou recém independentes. Por que negar a outros imigrantes o caminho que os fez ascender e progredir na vida? Aqui vale o critério de uma dupla reciprocidade. Se é verdade que os imigrantes mais antigos ajudaram a construir sociedade mais consistentes, também é certo que os emigrantes de hoje podem contribuir positivamente para um sadio rejuvenescimento dos pólos centrais. Por outro lado, se atualmente inúmeros jovens ou trabalhadores buscam novos horizontes através da migração é por que, no passado, seus avós e tataravôs fizeram o mesmo. Os jovens refazem inversamente o trajeto de seus ancestrais. Uma vez mais, por que barrar-lhes essa mesma oportunidade?
Concluímos voltando à preocupação do presidente dos Estados Unidos. Cresce a necessidade de uma revisão das leis migratórias em nível local, nacional e internacional, uma das promessas de sua campanha eleitoral Uma revisão que tenha em seu horizonte uma cidadania universal, vinculada ao trabalho, à contribuição e aos sonhos que cada povo e cultura podem oferecer às demais.
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