quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Análise de Conjuntura Setembro de 2009

Daniel Seidel *
Adital

Apresentação
Essa Análise de Conjuntura do mês de setembro de 2009, um ano após o início da crise financeira internacional, analisa se, realmente, há sinais de recuperação ou apenas um alívio momentâneo. Em seguida, apresenta-se uma leitura das mudanças que os resultados eleitorais do Japão podem provocar na política do país.

Da realidade da América Latina, destaca-se a situação não resolvida de Honduras, o mal estar provocado na reunião da UNASUL pela falta de transparência nos acordos entre Colômbia e Estados Unidos para instalação de bases militares; e o resultado da revisão do acordo da Usina de Itaipu entre Brasil e Paraguai.

No âmbito nacional a agenda é extensa! Analisa-se que modelos de Estado estão por detrás do debate sobre a destinação de recursos do Pré-Sal; que papel a candidatura de Marina Silva pode cumprir no debate eleitoral; uma rápida notícia sobre os resultados da Ia Conferência Nacional sobre Segurança Pública; notícias do 15° Grito dos Excluídos; uma breve análise sobre o SUS, dentro do quadro sobre políticas sociais.

Merecem destaque ainda três temas: o resultado da Campanha "Ficha Limpa" e os 10 anos da Lei 9840; a situação difícil do povo Guarani Kaiowá no Mato Grosso do Sul; e a participação popular cerceada nas Audiências Públicas sobre a construção da hidrelétrica de Belo Monte(PA).
Finaliza-se a parte nacional com as Notícias do Congresso, que trazem os questionamentos que a sociedade civil está fazendo sobre o papel do Senado Federal. Trata sobre os Estatutos da Igualdade Racial e dos Povos Indígenas. O projeto de lei que traz alterações no processo eleitoral.

A movimentação da Campanha Ficha Limpa para entrega das assinaturas no Congresso Nacional. O esvaziamento da CPI da Petrobrás e o debate sobre o destino dos recursos oriundos do Pré-Sal. O risco da legalização dos bingos e caça-níqueis. Criação do imposto sobre poupanças acima de 50 mil reais. Votação da PEC que inclui o direito à alimentação no conjunto de direitos sociais, previstos no artigo 6° da CF. Aprovação pela Câmara dos Deputados de novas regras para a filantropia. A tramitação do Acordo Brasil-Santa Sé no Senado. Projeto de Lei sobre União Estável.

I. Conjuntura Internacional
A crise econômica internacional: sinais de recuperação ou alívio momentâneo?
Os sinais (no emprego, no investimento) são débeis, mas parecem convergir no sentido da recuperação para o curto ou curto-médio prazo. Mas o horizonte continua de mau tempo. Houve um prêmio Nobel que disse que a trajetória da economia parecia um "V", foi interpelado se não poderia ser um "W" e há quem tema que seja um "N" invertido.

Há leituras moderadamente otimistas se revezando de um dia para o outro com aquelas cautelosamente pessimistas. Abrem-se os jornais na terça e a hegemonia é otimista, mas na quarta, no conjunto das mesmas fontes ou similares, predomina a previsão de que não é ainda bem a retomada. Também ocorre que a situação dá mais esperança nos países emergentes e menos no Primeiro Mundo.

Mesmo supondo agora o que se dizia no início, que os sinais parecem ir no sentido da recuperação da conjuntura nos próximos meses, restam sérios problemas fundamentais. Provavelmente o mais fundamental é que não se conseguiu (ou não se quis realmente?) avançar decisivamente no controle das instituições financeiras privadas internacionais. Isto faz (até agora) grande diferença com o que mudou após a crise de 1929. Não só que a crise atual é mais internacional.

A de 1929 foi a conexão internacional de várias crises nacionais sérias. Esta é mais direta e claramente internacional. Mas a crise de 1929 resultou quase em toda a parte no aumento do controle público sobre as transações (reais e sobretudo financeiras). Foi o tempo da criação de instâncias governamentais controladoras da moeda, crédito, câmbio, com grande diversidade de formatos institucionais ou de leque de atribuições, chamadas de Bancos Centrais ou com outros nomes. Na atual conjuntura, o que cresceu na ação estatal foram sobretudo operações de salvamento. Que nos diversos países empresas financeiras tenham submergido assim mesmo, levou a maior concentração do capital financeiro. Bancos e seguradoras hoje são em média um pouco maiores, têm um pouco mais poder e a possibilidade de chantagem discreta sobre os governos com os salvamentos passados.

As tentativas de iniciativa legal para disciplinar o mercado financeiro encontraram decidida oposição. e neste contexto; p.ex. o presidente Obama foi chamado "socializante". Não houve progressos visíveis no sentido de cooperação internacional para o estabelecimento de controles da atividade financeira. O que se viu neste último ano foi às vezes a manutenção do controle menor, para atrair negócios retirando-os de países que intentavam mais controle. Ora, muito mais ainda que nas trocas reais, a única possibilidade do controle efetivo dos fluxos financeiros passa pela atuação concertada dos Estados nacionais. Tudo se passa como se a um organismo minado por doença pulmonar-respiratória séria, se receitassem mel com agrião, um anti-histamínico e antipirético. Os sintomas se reduzem.

Os jornais de segunda, 07/09/2009 noticiam que (um ano após o agravamento da crise) os dirigentes de 25 grandes bancos centrais concordaram na necessidade de normas rígidas para controle dos fluxos financeiros. Não fica claro ainda, se combinaram as normas rígidas necessárias.

O Japão se reniponiza?
Meados do século XIX, no Japão reinava Meiji, reduzido a sumo sacerdote do Xintô, o poder efetivo nas mãos dos senhores territoriais. O almirante Percy forçou a barra de Y okohama para impor ao Japão tratado de amizade e comércio com os Estados Unidos. A casta militar japonesa dos samurais, educada na disciplina e na fidelidade incondicional ao Filho do Sol, decidiu que para o Japão continuar japonês, ia ter de se modernizar. Restaurou o poder absoluto do imperador e começou a preparar a juventude para assimilar a técnica ocidental: rigorosamente restauração modernizante. O Japão se industrializava renovando valores tradicionais.

Até à Segunda Guerra, empresa japonesa raramente despedia trabalhador: decisão extrema, dolorida, vergonhosa, como interditar membro da família, deserdar filho. Em troca os trabalhadores eram leais, fiéis, dedicados à "sua" empresa. A camada dirigente herdara a parcimônia e rude simplicidade samurai. A relação entre empresas, de fato conglomerados, era emulação: juntava concorrência e colaboração. Concorrência implacável sim - para "os outros". Derrotado militarmente o império russo em 1905, a certeza de que "não somos inferiores" se verteu naquela "somos superiores". O que acabou levando o Japão à guerra ao lado do Eixo.

Subjugado o Japão com dois artefatos nucleares, os Estados Unidos decidiram impor-lhe valores ocidentais e cristãos como democracia representativa e jogo livre de mercado (no campo do trabalho e na competição entre empresas). No Japão se instalou, de cima para baixo, com sucesso variado, versão pré-datada do neoliberalismo, assumida pelo Partido Liberal Democrata. Faz sentido que a conversão ao individualismo e à glorificação do sucesso pessoal e do lucro, fizesse aparecer no Japão a corrupção, rarissima na "Era Meiji". A derrota tinha deixado no povo japonês uma profunda insegurança a respeito da aparente contradição entre a modernidade técnica e a sociedade organizada em moldes tradicionais renovados. As recentes eleições parecem iniciar tempos novos, em que o Japão procura caminho, afastando-se do neoliberalismo do PLD.

O Partido Democrático vitorioso professa democracia de corte ocidental, livre iniciativa, jogo do mercado, mas é mais "japonês" que o PLD no poder por meio século. Ainda minoritários, os partidos de esquerda de inspiração coletivista cresceram. É mais uma batalha que o neoliberalismo em crise perde.

2. Conjuntura Latino-americana
2.1. Situação em Honduras
Vários fatores estão fragilizando aqueles que protagonizaram o golpe militar em Honduras. O setor empresarial vem manifestando preocupação com a intensa desobediência civil, que vem implicando em crescentes custos econômicos; as agressões aos direitos humanos vêm corroendo a imagem de militares e policiais; partidos políticos tradicionais que apoiaram os golpistas vem perdendo credibilidade e legitimidade. A oposição ao golpe de Estado não está aceitando a realização de eleições sem o regresso do Presidente Zelaya, com o argumento de que estas "legitimariam a violência militar". Fortalecendo esta posição, temos o anúncio por parte dos EUA de que não reconhecerá os resultados eleitorais nas condições atuais. A força atual da oposição reside na sua capacidade de construir uma agenda comum aos vários setores da sociedade hondurenha.

A Diretora de Investigação Científica da Universidade Nacional Autônoma de Honduras, Letícia Salomón, declarou recentemente que "Não importa quem ganhe as eleições de novembro. O próximo governo terá que lidar com uma força social de envergadura que existe neste momento, se quiser manter uma mínima governabilidade no país".

2.2. Bases militares na Colômbia: reunião da UNASUL em Quito
A Colômbia se negou a tomar público o texto dos seus acordos com os EUA para a instalação de, pelo menos, sete bases militares em seu território, durante a reunião extraordinária do Conselho Sul-americano de Defesa da UNASUL, que aconteceu em 15 de setembro, em Quito, Equador. O pedido para que tais informações se tomassem públicas partiu de 12 membros da UNASUL. O Chanceler brasileiro Celso Amorim resumiu com as seguintes palavras o sentimento quase generalizado na reunião de Quito: "A Colômbia não percebeu a grave preocupação que causou o acordo sobre as bases militares."

A reunião do Conselho Sul-americano de Defesa da UNA SUL foi convocado por decisão dos presidentes da região, reunidos no dia 28 de agosto de 2009, em Bariloche, Argentina, os quais decidiram que os ministros de Relações Exteriores e de Defesa realizassem uma reunião extraordinária para que "de posse de uma maior transparência, planejem medidas de fomento na confiança e na segurança regionais, de maneira complementar aos instrumentos existentes no marco da OEA." Na América Latina, os EUA possuem bases e instalações militares em El Salvador, Honduras, Porto Rico, Cuba, Aruba, Curaçao, Peru e Paraguai e, agora, converteu a Colômbia em uma grande base militar, projetando neste país utilizar pelo menos cinco bases aéreas e dois portos.

2.3. Paraguai: negociações sobre Itaipu
Desde o início das negociações com o governo brasileiro, em setembro de 2008, o Paraguai apresentou seis pontos de reivindicação sobre a Usina de Itaipu, cuja gestão é compartilhada com o Brasil. Assim ficaram tais reivindicações, após a assinatura da declaração pelos presidentes Lula e Lugo: Conclusão das obras faltantes: ficou acertado que será construída uma subestação no Paraguai e serão realizadas obras de navegação no rio Paraná e um mirante no lado paraguaio, para potencializar o turismo; Controle e transparência: o Paraguai conseguiu inserir na declaração o reconhecimento de que sua Controladoria Geral da República está auditando a dívida do país relativa à construção da Usina; Co-gestão plena: o Paraguai terá maior participação na direção da binacional.

Na declaração assinada pelos presidentes, ficou reconhecida a necessidade de consolidar a co-gestão plena; Revisão da dívida: a Controladoria Geral da República do Paraguai começou este ano uma auditoria da dívida do país. Na declaração, o Paraguai limita-se a informar que está realizando a auditoria, "e sua intenção de transmitir suas conclusões à parte brasileira". Preço justo: o Fator Multiplicador, que calcula quanto Brasil paga ao Paraguai pela energia excedente, foi triplicado de 5,1 para 15,3. Com isso, o Paraguai passará a receber cerca de US 360 milhões por ano, caso repasse todo o seu excedente para o Brasil. Este preço pode aumentar se o Paraguai conseguir melhores preços no mercado brasileiro. Soberania hidrelétrica: o Paraguai defendia o direito de vender ao Brasil e a outros países sua parte da energia produzida por ltaipu.

O Brasil reconheceu a possibilidade de venda gradual no mercado brasileiro. A declaração assinada pelos presidentes sinalizou que Itaipu poderá vender energia a terceiros países a partir de 2023, quando o tratado será revisado. O presidente paraguaio Fernando Lugo afirmou que: ''Nesta declaração não há vencedores nem vencidos. Ganhamos todos, para o bem de nossos povos e da região."

3. Conjuntura Nacional
3.1. Pré-sal: Estado, Mercado, Sustentabilidade e Sociedade

O debate que ocupou a agenda política do Brasil nas últimas semanas foi sobre os destinos das riquezas descobertas na camada pré-sal. Trata-se da maior descoberta de petróleo da atualidade, compreendendo uma área formada há milhões de anos, no período em que os continentes africano e americano estavam unificados. Constituindo-se, portanto, da formação de uma camada de sal com significativos volumes de petróleo que vão desde Santa Catarina ao Espírito Santo.

Estima-se que na área do pré-sal possui 100 bilhões de barris de petróleo. Esta gigantesca descoberta coloca o Brasil em situação geopolítica privilegiada, pois o petróleo é matéria prima de mais de 3000 produtos de base industrial e o mesmo está se tomando cada vez mais escasso no mundo. Entretanto, deve-se considerar que historicamente vivemos ciclos, assim como da cana de açúcar, do café, do ouro e da borracha, que potencializaram extraordinárias riquezas. Mas dessas riquezas, apenas grupos específicos são beneficiados, excluindo as maiorias sociais dos beneficios proporcionados por esses ciclos. Nesse sentido, o lançamento da proposta de regulamentação da exploração do petróleo recém descoberto, oferece a oportunidade de debate e reflexão na sociedade acerca das potencialidades que esta riqueza poderá oferecer, dando ao Brasil condições de superar os ciclos em que pequenos grupos se beneficiaram dos recursos naturais.

A proposta do marco regulatório para a exploração de petróleo e gás no chamado pré-sal, enviada pelo governo ao Congresso Nacional, indica três pontos centrais, a saber: 1) Fundo Social, vinculado à Presidência da Republica, com fmalidade de regular os recursos para a realização de projetos nas áreas de combate à pobreza, educação, cultura, ciência e tecnologia e a sustentabilidade ambiental; 2) criação de uma empresa, a Petrosal, que será a gestora dos contratos de partilha de produção entre o Estado e empresas privadas; 3) Partilha: regime que dá a União poder de assinar contratos com empresas privadas, sendo que as empresas assumem integralmente os custos e os investimentos necessários na fase de pesquisa. Em caso de descoberta, a contratada é ressarcida com parcela dos hidrocarbonetos. A outra parcela, nunca inferior a 30% de propriedade da União. O Pré-Sal oportuniza ao país o debate acerca de qual o melhor modelo de Estado que atenda as demandas da sociedade brasileira, especialmente dos mais pobres.

Frisa-se que esse debate se insere no contexto de esgotamento do modelo neoliberal hegemônico no mundo e no Brasil nas últimas décadas, sendo que o marco regulatório vigente foi feito à luz dessa visão de mundo. Atualmente, essa concepção de desenvolvimento encontra-se restrita a nichos acadêmicos, a uma parcela de colunistas econômicos da grande mídia, bem como anima os discursos de partidos oposicionistas no plano federal. A proposta agora em debate no Congresso Nacional traz avanços consideráveis: fortalece a Petrobras; amplia a participação do Estado subordinando os agentes privados ao interesse nacional. Isto pode garantir a apropriação social da riqueza via investimentos em demandas sociais, bem como ditar o ritmo em que se darão os leilões, tirando do mercado esse papel.

Os movimentos sociais, sindicatos e a Federação Única dos Petroleiros avaliaram como positiva, mas insuficiente, os termos dos projetos de lei do governo federal. Assim, apresentaram à Câmara dos Deputados um projeto de lei alternativo, o PL 589112009, por meio do qual sugerem que a Petrobras seja 100% estatal. O projeto alternativo propõe o monopólio estatal de todas as etapas da produção do petróleo, o fim das rodadas de licitações e a retomada dos blocos petrolíferos que já foram leiloados. Além disso, os movimentos criticaram a pouca discussão do projeto do Executivo. Mas, apesar das críticas, as entidades apontam aspectos positivos no projeto do governo. Por outro lado, apenas marginalmente, fala-se de investimento em novas tecnologias e na sustentabilidade ambiental, deixando aberto se os recursos advindos do pré-sal ajudarão o país a transitar da dependência das energias fósseis e do modelo de desenvolvimento que elas simbolizam para avançar a uma economia de baixo carbono e uma sociedade pós-ideologia do consumo.

Esta lacuna se deve ao fato de os principais partidos que organizam a vida política brasileira estar presos à dinâmica econômica do século XIX, período em que o desafio sustentável era ausente, diferentemente dos tempos atuais de aquecimento global e suas conseqüências para a preservação da vida no planeta. Seguramente, o cenário eleitoral que caminhava para um "plebiscito" entre os 8 anos de governo Lula e os 8 anos de FHC, pode trazer para o centro temas fundamentais para o futuro do Brasil: Estado e Desenvolvimento Sustentável. Pois o Pré-sal favorece a rediscussão sobre o modelo de Estado, principalmente entre os principais postulantes, o Governador José Serra e a Ministra Dilma Roussef.

O primeiro, caudatário de uma renovação do neoliberalismo e a segunda, parte de uma visão de Estado como indutor do desenvolvimento. Enquanto que a possível candidatura de Marina Silva está focada no desenvolvimento sustentável. Mesmo com pouca chance eleitoral, a Senadora poderá cumprir um relevante papel de forçar as candidaturas com reais condições de obter a vitória eleitoral a incorporarem essa fundamental questão do século XXI: a sustentabilidade socioambiental.

3.2. 1ª Conferência Nacional de Segurança Pública (I CONSEG)
Foram realizadas 1.140 conferências livres em 514 cidades, 266 conferências municipais e 27 estaduais. A discussão envolveu mais de meio milhão de brasileiros. Estas enviaram mais de 80 mil propostas de futuros princípios e diretrizes de segurança pública do país para a I CONSEG. Essas propostas foram sintetizadas em 26 princípios e 364 diretrizes.

As conferências eletivas, bem como a Conferência deliberativa Nacional integraram os três segmentos da sociedade com 2.097 delegados eleitos, representando os gestores das políticas públicas das três esferas, 30% (629); os trabalhadores - policiais, guardas, agentes penitenciários, 30% (629); e a sociedade civil, 40% (839); Participaram também observadores de 60 países. "É uma vitória para o Brasil. Um marco histórico que vai transformar as propostas de toda a sociedade em uma política de Estado e não mais de governo", afirmou a coordenadora geral da I a CONSEG, Regina Miki. O passo político mais importante passa por uma imediata reforma e reativação do Conselho Nacional de Segurança Pública (CONASP). Pois este foi definido pela I CONSEG para ser conselho integrador desses três segmentos representativos das três esferas do Estado e da sociedade brasileira com a atribuição de deliberar as dinâmicas de articulação das políticas públicas definidas nessa conferência e de ser o catalisador permanente da construção de um novo sistema de segurança pública no país.

Esta construção passa pela necessidade de reformas institucionais, pelo desafio da construção de um novo paradigma de segurança púbica e políticas transversais e intersetoriais inovadoras, e isso com a participação da sociedade civil. A partir do ponto de vista dos direitos humanos a I CONSEG resultou em avanços e retrocessos. Avanços ocorreram em termos da valorização do SUSP (Sistema Único de Segurança Pública) e do PRONASCI (programa Nacional de Segurança Pública com cidadania) e a proposta de reativação do CONASP - Conselho Nacional de Segurança Pública, além de propostas de gestão participativa e controle social, bem como a decisão pela não redução da maioridade penal. Um dos retrocessos foi a aprovação da diretriz da criação de uma polícia penal. Ainda é dificil avaliar até que ponto as contribuições da I a Conferência Nacional de Segurança Pública serão integradas nas políticas de segurança pública no País.

Depende do atual e do próximo governo, que será eleito em 2010, acatar essas decisões de futuros princípios e diretrizes de Segurança Pública. Parece que internamente no governo há uma tendência em construir políticas de Estado visto que a partir de 2003 se conseguiu a assinatura de todos os governadores para a criação de um sistema Único de Segurança Pública (SUSP) no país. A Mídia não demonstrou interesse e a sua responsabilidade foi muito questionada pelos conferencistas.

A população em geral também não participou e não mostrou acreditar num possível processo inovador. Isto se constatou também nas comunidades eclesiais e pastorais, salvo algumas dioceses que realizaram dezenas de conferências livres, enviaram as suas propostas e participaram das delegações oficiais, enviando, motivadas pela Campanha da Fraternidade, que foi uma contribuição histórica neste processo nacional.

3.3. 15° Grito dos Excluídos entre a crise financeira e a intensificação das mobilizações locais.
A manifestação nos Estados ao longo do dia 07 de setembro revelou mais uma vez que a crítica à falta de ética na política é um dos pontos muito abordados nas manifestações populares. Além disso, neste ano, a criminalização das lideranças e dos movimentos sociais foi um dos pontos de forte denúncia nas mobilizações do Grito. Tudo indica que neste contexto de crise as organizações populares se encontram numa espécie de encruzilhada, necessitando criar alternativas de luta, o que pode explicar a expansão do Grito às localidades, comparados aos anos anteriores Há 15 anos o Grito está nas ruas, manifestando a posição em favor da vida.

A idéia do tema de que a "força de transformação está na organização popular" conduz à compreensão que o protagonismo é fundamental para a construção da alternativa: ele se constitui no próprio princípio da configuração alternativa: os cidadãos se fazerem sujeitos de sua vida coletiva. Trata-se, por exemplo, no nível da economia, de um modo de produzir em que o poder é "centrado na sociedade de pessoas que trabalham e criam com autonomia e liberdade" em contraposição às sociedades em que o mercado dirige o processo uma vez que nelas, as decisões são do "automatismo do mercado", o que conduz ao esvaziamento da eficácia da democracia política.

D. Pedro Luiz Stringhini, bispo responsável pela Pastoral Social da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos no Brasil), lembrou que os moradores de rua são a face mais visível da exclusão. "Hoje o Grito dos Excluídos é uma árvore que tem dado frutos", disse o bispo em coletiva de imprensa. Juntamente com a metodologia de base e a linguagem popular, a descentralização das decisões parece ter sido a grande novidade do 15° Grito dos Excluídos. As preocupações e lutas regionais, estaduais e locais revestem os eixos sugeridos em âmbito nacional. Novas reivindicações, novas práticas e novas manifestações surgem a cada ano. Isso explica a pluralidade das mobilizações: romarias, caminhadas, atos públicos, concursos, celebrações, desfiles paralelos ao oficial, palestras, seminários, entre outras. Já não basta passar o microfone aos excluídos, o mais importante é permitir que eles se manifestem em suas expressões genuínas, o que caracteriza a linguagem e a metodologia do Grito. Segundo o arcebispo de Aparecida, dom Raymundo Damasceno, o Grito dos Excluídos fortalece a participação do povo para a concretização de uma verdadeira democracia.

3.4. Políticas Sociais: O SUS - Sistema Único de Saúde
O Sistema Único de Saúde é a maior política pública inclusiva no Brasil e é uma política que nasceu das entranhas da sociedade. O SUS foi construído "de baixo pra cima". À época da constituinte representou um dos maiores avanços consagrados na Constituição Federal de 1988. Marcou o auge da realização do movimento pela reforma sanitária. Todavia, o fato de se ter garantido na CF o direito a saúde e, junto com esse, o dever do Estado foi como se o trabalho estivesse concluído e era "só aguardar que o resto viria por acréscimo". Ledo engano, o mercado não se conformou e investe muito forte para que o Sistema Único de Saúde não funcione. O fato de a Saúde possuir o segundo maior orçamento da União (só perde pra Previdência), faz com seja um setor muito disputado por diferentes interesses. Ele tem também o maior mercado emergente do mundo em bens e serviços. Para muitos saúde é uma questão de "negócio".

Pode ser até contraditório, mas o carro chefe do SUS é a saúde e não a doença. A promoção e proteção da saúde é o grande sustento dessa política, visto que prevenir é muito mais barato que curar. Todavia, o modelo "hospitalocentro" não se conforma com essa premissa do SUS e investe muito para que a atenção básica não funcione e, com isso, a população busque os setores de média e alta complexidade, cujo o custo é bem maior. Há muita sutileza neste enfretamento, visto que a desconstrução do Sistema passa pelo sucateamento da rede pública, para justificar as terceirizações e a contratação da iniciativa privada. O que no princípio seria complementar, hoje se converteu, em muitos lugares, na sustentação do atendimento realizado pelo SUS.

Muitos problemas resultam desse quadro: recursos desviados; precarização das relações de trabalho; mão-de-obra sem remuneração justa e desqualificada; pessoas mal atendidas ou que não são atendidas. E se não houver uma retomada do controle social, com ampla participação da sociedade civil nos Conselhos de Saúde, nos vários níveis, se estará perdendo, para a ganância do mercado, a maior política pública de inclusão que foi construída pela sociedade. O Governo Federal retomou em agosto último os debates para concluir a votação do Projeto de Lei Complementar 306/08, que regulamenta a Emenda Constitucional 29 - responsável por definir percentuais de recursos a serem aplicados pela União, estados e municípios na área de saúde. Essa retomada ocorreu em função da dificuldade financeira enfrentada pelo setor, desde a queda da CPMF, ocorrida em dezembro de 2007.

A Contribuição Social para a Saúde (CSS) possui três diferenças em relação à antiga CPMF: a duração (é indeterminada); a alíquota (0,1% sobre as movimentações financeiras, ficando isento o assalariado com renda mensal menor de até R$ 3.080,00.) e a exclusividade de financiar apenas a saúde. A criação da Contribuição Social para a Saúde (CSS), deverá injetar algo em tomo de R$ 12,5 bilhões a mais no setor da saúde pública no Brasil por ano, a partir do no que vem. Só que a regulamentação da Emenda 29 encontra muita resistência na Câmara dos Deputados, primeiro porque cria mais impostos para o cidadão, segundo porque a criação de impostos em véspera de eleição é um assunto considerado delicado pelos parlamentares candidatos.

3.5. Ficha Limpa e os 10 anos da Lei 9840
No próximo dia 29 de setembro completam 10 anos da aprovação da Lei 9840/99, também conhecida como "Lei dos Bispos". Foi a primeira lei de iniciativa popular aprovada no Congresso Nacional após a Constituição Federal de 1988. É preciso recordar que a mobilização para coleta de assinatura foi uma proposta de gesto concreto da Campanha da Fratemidade, promovida pela CNBB em 1996, "Fratemidade e Política". Pelo próprio TSE é considerada a lei mais eficaz que o país já teve no combate à corrupção eleitoral. Dados oficiais demonstram que mais de sete centenas de políticos foram cassados pela compra de votos ou uso da máquina administrativa para fms eleitorais, em cinco eleições que ocorreram.

Foi uma conjugação feliz entre a credibilidade da iniciativa popular, liderada pela Igreja Católica e üAB, à época, e a mobilização popular dos Comitês da Lei 9840 que foram criados em diversas partes do país para "fazer valer alei". A própria criação do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral com a participação de mais de 40 entidades para liderar o movimento, demonstrou a sabedoria de contar com a força da cidadania das organizações da sociedade civil brasileira para conduzir o processo de mobilização popular no processo eleitoral. Foi necessário resistir a várias iniciativas de Declaração de Inconstitucionalidade da Lei no STF e a inúmeras tentativas de alteração da mesma no Congresso Nacional, dada a sua eficácia! 10 anos depois, a melhor forma de comemorar a vitória da cidadania, foi obter mais de 1 milhão e 300 mil assinaturas numa nova iniciativa popular, agora chamada de "Ficha Limpa", visando aprimorar o processo eleitoral brasileiro impedindo que dele participem candidatos que não tenham a "Ficha Limpa".

Mais uma vez a cidadania brasileira contou com a participação decisiva da Igreja Católica. Essas conquistas não significam que a política está livre da corrupção, mas que é possível no país mobilizar a indignação da população brasileira em iniciativas construtivas e que fortaleçam a democracia. Há muito o que se fazer no campo da educação política. Assim, para fazer avançar a democracia é necessário mobilizar os apoios no Congresso Nacional para aprovar mais esse instrumento da cidadania brasileira, caminhando a passos rápidos para uma Reforma Política que possibilite a ampliação da representação dos setores excluídos na política do país, criando novos instrumentos de controle popular sobre os mandatários dos vários poderes constituídos da República.

3.6. Situação do povo Guarani Kaiowá no Mato Grosso do Sul
Em relação aos povos indígenas do Brasil, merece destaque a situação do povo Guarani Kaiowá, no cone sul do Mato Grosso do Sul. Este povo segue enfrentando a pior realidade entre os povos indígenas brasileiros. Enquanto isso, os estudos para identificação das terras do povo ainda não recomeçaram, mesmo não havendo impedimentos legais para que eles sejam retomados. Para alertar sobre a situação, vale destacar alguns casos mais significativos:

-Laranjeira Nhanderu (próxima ao município Rio Brilhante) As 130 pessoas da comunidade de Laranjeira Nhandem foram despejadas no dia 11 de setembro da área onde viviam há dois anos, em seu território tradicional ainda não demarcado. Por ordem judicial, eles saíram da área e, por não terem para onde ir, formaram o 20° acampamento indígena à beira de estradas no MS. Na noite do dia 14 de setembro, por ordem do fazendeiro que reintegrou a terra, alguns homens incendiaram pertences e animais dos indígenas que ainda estavam na aldeia. Nos últimos meses, duas crianças da comunidade morreram, pois o fazendeiro vizinho à terra proibiu a entrada das equipes da Funasa e da Funai para prestarem assistência à saúde. Além disso, três jovens se suicidaram.

-Kurussu Ambá (próxima ao município Coronel Sapucaia) Cerca de 200 pessoas vivem em barracos em pequeno pedaço da terra sem condições de plantar. Eles já tentaram retomar para seu território tradicional duas vezes nos últimos dois anos. Como resultado, uma líder religiosa de 70 anos foi assassinada por um segurança privado (que foi identificado, mas não está condenado), a principal liderança foi assassinada na porta de seu barraco, cinco indígenas foram baleados por seguranças de fazendeiros, 4 lideranças foram presas e condenadas por furto, numa situação questionada pela defesa dos indígenas, pois apresentava indícios de ter sido armada.

-Nhanderu Marangatu (próxima ao município Antônio João - fronteira com Paraguai) Nessa terra, mais de 900 pessoas vivem em 124 hectares, apesar dela ter sido homologada com 9.300 hectares em 2005. Após a homologação, o STF decidiu, liminarmente, suspender os efeitos deste ato. Até hoje o mérito da ação ainda não foi julgado. As pessoas da aldeia são constantemente vigiadas e ameaçadas por seguranças armados, empregados do fazendeiro que disputa a área com os indígenas. Nos últimos anos, uma liderança da aldeia foi assassinada, mulheres foram violentadas pelos seguranças e ocorreram outras agressões.

-Amambai (próxima do município de Amambai) Foi uma das primeiras terras Kaiowá Guarani reservadas no início do século passado. Vivem nela quase 8 mil pessoas em menos de 2 mil hectares. Entre as graves conseqüências do confinamento, os indígenas sofrem com violência do narcotráfico, alcoolismo, prostituição, trabalho escravo, entre outros males.

-Passo Piraju (próxima do município de Dourados) A terra foi retomada há quase 10 anos e, por todo esse período, há uma constante tensão entre indígenas e fazendeiros da região. Os indígenas estão confmados a 40 hectares por um Termo de Ajustamento de Conduta. Nos últimos três anos, após um conflito em que morreram dois policiais, passaram a sofrer perseguições e pressões da polícia. Em conseqüência disso hoje se encontram reduzidos a menos da metade das famílias que havia anos passados.

-TI Dourados (no município de Dourados) É a terra indígena com a maior população do país, em tomo de 13 mil pessoas, onde ocorre o maior número de mortes de crianças por desnutrição e o maior número de casos de suicídios e homicídios de indígenas do país. Na área superlotada não há espaço sequer para roça familiar. Por falta de opção para se sustentarem na terra, muitos indígenas se submetem a situações degradantes e até análogas à escravidão em usinas de álcool na região. Tudo isso gerou, nos últimos anos, um grande aumento de violência na área com formação de gangues e alto consumo de drogas. Em função disso estão sendo discutidas políticas de segurança na aldeia, que vão desde a preparação de contingentes policiais para atuar na área, até o toque de recolher a partir das dez horas da noite.

3.7. Participação popular foi cerceada nas Audiências sobre a construção da hidrelétrica de Belo Monte (P A)
O Ministério Público Federal (MPF-PA) deve entrar, nesta semana, com uma ação pedindo a nulidade das audiências públicas sobre a hidrelétrica de Belo Monte, prevista para ser construída no Rio Xingu, Pará. Nas quatro audiências, que ocorreram entre 10 e 15 de setembro, o MPF-PA e diversos grupos que devem ser afetados pela construção da hidrelétrica tiveram sua participação cerceada. Depois da última audiência, realizada em Belém no dia 15 de setembro, o MPF-PA anunciou que questionará na Justiça o cerceamento à participação popular nos debates sobre Belo Monte. Nesta mesma audiência, em protesto, o MPF-PA e diversos presentes, entre eles líderes indígenas, se retiraram da audiência. Neste dia, vários representantes de movimentos sociais e professores universitários não puderam entrar no auditório onde ocorria o evento.

O MPF-PA também deve solicitar um maior número de audiências públicas. Essa recomendação já havia sido feita ao Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (lbama), mas não foi atendida. Além do escasso número de audiências, o Estudo de Impacto Ambiental que serviria de base para a discussão somente foi integralmente disponibilizado dois dias antes da primeira audiência. Na audiência realizada em Altamira, numa das regiões que pode ser mais afetada pela obra, índios de seis povos (Assurini, Juruna, Arara, Curuaya, Xikrin e Parakanã) que vivem às margens do Xingu, solicitaram que comunidades indígenas sejam ouvidas sobre o projeto, como prevê a Constituição em caso de aproveitamentos hidrelétricos que impactem terras indígenas. A usina de Belo Monte deve afetar - direta ou indiretamente - 66 municípios e 11 terras indígenas.

4. Notícias do Congresso Nacional
A crise que se desencadeou no Parlamento, nos últimos meses, não só questionou fortemente a missão da instituição como desafiou os cidadãos-eleitores a buscar soluções viáveis. Criou perplexidade e desalento. Circula pela internet uma proposta de Projeto de Lei explicitando o desejo de alternativas, sobretudo para o Senado. Uma convicção se afirma: para além das questões aéticas, ilegais, negociatas, influências indevidas, nepotismo e corrupção, as atribuições do Congresso Nacional precisam ser revistas.

A primeira alteração deve ser na Constituição Federal, para que uma casa não seja mais revisora da outra. Em seguida, esclarecimento das competências atribuídas à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal. Com isso, teremos, no mínimo, maior agilidade nas decisões e menor custo no processo legislativo. Há quem defenda um sistema unicameral e extinção do Senado. Neste caso, argumentam outros, quebraríamos o equilíbrio da representação dos Estados-membros. Só justifica manter o sistema bicameral, no entanto, se cada casa tiver função diferente da outra. As competências até podem ser complementares, mas não revisoras e nem conjuntas.

Solicitação à CNBB: "Como católico, peço que a CNBB por caridade seja novamente protagonista de uma movimentação nacional contra a aprovação em definitivo, no Congresso, da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 336/2009 - que, uma vez em vigor, aumentará o número de vereadores em todo o País dos atuais 51.988 para 59.611, ou seja, mais 7.623 parlamentares. Um custo a mais para pesar, principalmente, sobre os ombros do cidadão trabalhador. Ainda dá tempo. A Igreja é a nossa única esperança de credibilidade e mobilização neste momento. Nossas principais instituições faliram, e não podemos mais esperar algo de bom delas: executivo, legislativo, judiciário..." Prof. Cláudio Silva.

4.1. Estatuto da igualdade racial
O presidente da Comissão Especial do Estatuto da Igualdade Racial - o deputado Carlos Santana afirmou "que a aprovação do Estatuto representa o reconhecimento de que não há igualdade racial no Brasil, o que sempre foi negado". Ele considera o ponto mais positivo do Estatuto a inclusão de 90 milhões de brasileiros/as que vivem num processo de apartheid e exclusão. A controvérsia maior, diz ele, foi quanto à posse da terra por comunidades quilombolas, o que foi retirado do Estatuto. O projeto original é do senador Paulo Paim; foi concebido para garantir direitos essenciais à população negra em sua totalidade. O texto, aprovado na Câmara, vai agora para o Senado.

4.2. Estatuto dos povos indígenas
Após quase 15 anos de pressão dos povos indígenas, os deputados federais, fmalmente, retomaram a tramitação do Estatuto dos Povos Indígenas, aprovando o recurso n. 182, que aguardava votação desde 1994. Os chefes indígenas, seus aliados e representantes do governo elaboraram uma nova proposta já que estava desatualizada. Esperam poder conseguir novo avanço na legislação indígena e garantindo as conquistas da Constituição de 88.

4.3. Projeto de Lei da Reforma Eleitoral
Conforme cientistas políticos e especialistas em direito eleitoral, o projeto de lei No 141 sobre as regras do Código Eleitoral, da Lei dos Partidos Políticos e da Lei das Eleições, já aprovado, estabelece mudanças superficiais e não promove novidades significativas no sistema político nacional. Um exagero mesmo, dizem eles, chamar de "lei de reforma eleitoral". Com palavras ainda mais duras o jornalista Mauro Santayana, (JB, 18.09), se expressa: "Do ponto de vista institucional, a decisão dos Parlamentares diante da Reforma Eleitoral é um retrocesso criminoso. A atual legislatura se toma responsável pelo que houver no futuro". Vejamos as modificações - com avanços e retrocessos.

4.4. Ficha limpa rumo ao Congresso
O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) comemora a marca de mais de um milhão de assinaturas de eleitores de todo o Brasil em apoio ao projeto de lei de iniciativa popular que proíbe a candidatura de pessoas que tenham sido condenadas em processos judiciais em primeira instância ou que respondam a ações em tribunais de Justiça. O projeto, apelidado de Ficha Limpa, será encaminhado ao Congresso Nacional no próximo dia 29/09, durante ato solene em comemoração aos 10 anos da Lei No 9.840/99, a primeira de iniciativa popular na história do país. Os organizadores da Campanha Ficha Limpa já iniciaram contatos com deputados federais e senadores na tentativa de garantir a aprovação da proposta o mais rápido possível.

4.5. Esvaziada a CPI da Petrobras e os projetos do pré-sal.
A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga denúncias de irregularidades na Petrobras foi esvaziada. Não gerou o constrangimento nem a preocupação que o Palácio do Planalto temia. Nos bastidores, é conhecida como a CPI do senador Romero Jucá, líder do governo e relator. A estratégia do governo de dominar os rumos da CPI deu certo. Dois meses depois da sua instalação, a base governista mantém o controle querendo evitar o desgaste da estatal e do governo. A oposição demonstra desânimo com a comissão. A base governista, além de ter maioria, a comanda.

O que está a pleno vapor são os quatro Projetos do pré-sal. Tratam, respectivamente:
1. Do novo marco regulatório, exclusivo para a exploração do petróleo do pré-sal, baseado no regime de partilha da produção;
2. Da criação de uma nova estatal - a Petrosal - para a gestão dos futuros contratos de partilha;
3. Da criação do Fundo Social que administrará os recursos a serem obtidos pela União com a venda do petróleo e que deverão ser investidos nas áreas de educação, combate à pobreza, desenvolvimento científico e tecnológico, cultura e sustentabilidade ambiental;
4. Da autorização para o aumento do capital da Petrobras.

4.6. Legalização de bingos e caça-níqueis - brecha para cassinos
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara aprovou o projeto de lei que legaliza bingos e caça-níqueis, por 40 votos a 7, após um debate de mais de quatro horas. Entre os pontos polêmicos, estava a brecha para incluir, entre os estabelecimentos de jogos legalizados, os cassinos. O projeto teve uma forte resistência de um grupo de parlamentares. Os jogos de bingos e caça-níqueis estão proibidos no Brasil desde 2004, quando o governo Lula editou uma medida provisória que anulou todas as licenças, permissões, concessões e autorizações para a exploração desses jogos. A proposta aprovada na CCJ segue para apreciação do plenário da Câmara, onde serão possíveis novas emendas.

Três deputados (Biscaia, Marcelo Itagiba e João Campos) decidiram apresentar votos em separado contra o projeto, apoiados no mesmo argumento: "a legalização facilita a lavagem de dinheiro proveniente de atividades criminosas e dificulta o combate ao crime organizado e à violência". "O argumento de que a legalização vai gerar 300 mil empregos, argumentou Biscaia no seu voto, não pode ser usado para legalizar uma prática tão nociva à sociedade".

4.7. Imposto sobre poupança a ser enviado ao Congresso
O Ministro da Fazenda admitiu encaminhar ao Congresso o projeto que taxa as cadernetas de poupança com saldo superior a R$ 50 mil. À Agência Brasil, o ministro afirmou que 99% das poupanças não serão afetadas com a medida, e que não haverá tributação caso a única fonte de renda da pessoa seja a poupança. Pela proposta, os rendimentos acima de R$ 50 mil serão taxados em 20% sempre que a taxa básica de juros ficar abaixo de 10,5%. Segundo o governo, o objetivo da medida é evitar uma migração em massa de investidores para a poupança quando as taxas de juros estiverem relativamente baixas (cenário que atrai investidores para a poupança). Caso a matéria seja aprovada ainda neste ano, a medida entrará em vigor já a partir de 2010.

4.8. PEC da Alimentação deve ser votada na terça-feira
Poderá ser votada nesta terça-feira (22), na Comissão Especial, o parecer do deputado LeIo Coimbra para a PEC 47/03, que inclui a alimentação entre os direitos sociais previstos no artigo 6.0 da Constituição. O objetivo dos membros da Comissão é fazer a sua parte o mais rapidamente possível para que o Plenário da Casa aprove a PEC até o dia Mundial da alimentação (16 de outubro). A CNBB participa ativamente da campanha nacional lançada este ano para convencer os parlamentares da importância de se aprovar esta emenda constitucional que, segundo analistas, ajudará a garantir o direito humano à alimentação à população. Correntes jurídicas defendem que, aprovada esta PEC, será possível embasar, por exemplo, uma ação civil pública para garantir o acesso a alimentos, numa interpretação ampla do direito à dignidade e de outros direitos fundamentais.

4.9. Câmara aprova novas regras para filantrópicas
A Câmara aprovou o substitutivo ao Projeto de Lei 7494/06, que cria novas regras para o credenciamento das entidades beneficentes, as chamadas "filantrópicas". A proposta transfere para os ministérios da Educação, da Saúde, e do Desenvolvimento Social e Combate à Fome a responsabilidade de conceder e renovar os certificados de entidade beneficente. Atualmente, esse documento é concedido pelo Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS). Pela proposta, esses ministérios terão de divulgar na internet detalhes sobre os certificados concedidos às filantrópicas. O prazo de validade da certificação será fixado em regulamento, observadas as especificidades de cada uma das áreas e o prazo mínimo de um ano e máximo de cinco anos. A matéria retomará ao Senado.

4.10. Acordo Brasil- Santa Sé
O Plenário da Câmara aprovou, no dia 27/08, o Acordo entre o Brasil e a Santa Sé. Também aprovou um projeto de lei que regulamenta a relação entre o Estado e todas as religiões do País. O texto do projeto é muito semelhante ao do convênio com a Igreja Católica. O acordo, por exemplo, garante que "a Igreja Católica pode livremente criar, modificar ou extinguir todas as instituições eclesiásticas (enumeradas no início do artigo, como dioceses e ordens religiosas)". O projeto de lei adota uma forma mais geral: "As denominações religiosas podem livremente criar, modificar ou extinguir suas instituições". O texto do Acordo está agora no Senado e fará os mesmos passos da Câmara: Comissão de Relações Exteriores (relator Collor de Mello), Comissão de Constituição e Justiça (relator Marco Maciel), Plenário. Por em quanto, não há ainda novidades.

4.11. Projeto de Lei sobre a união estável
Este projeto de lei, n. 674/07, regulamenta o artigo 226 § 30. da Constituição Federal, sobre a união estável. O autor é o deputado Cândido Vaccarezza e teve como re1ator o deputado José Linhares. Para tanto, foram apensados muitos outros projetos com temáticas relacionadas, quase todas conflitivas. Impressionante o número de projetos de liberalização neste campo afetivo sexual! O Projeto recebeu grande número de emendas em todos os níveis. O relatório foi apresentado e aprovado, nos últimos dias na Comissão de Seguridade Social e Família, não sem muitas tensões e contraposições. Agora, vai para a Comissão de Constituição e Justiça. O relator se pronunciou, de forma candente, contra a união homoafetiva no conceito legal de família, um dos aspectos mais conflitivos. Baseia-se ele na tradição judaico-cristão da sociedade ocidental e, também, numa recente pesquisa (02/09) da Fundação Perseu Abramo cujos resultados rezam que 58% dos brasileiros consideram a homossexualidade um pecado contra as leis de Deus e 84% concordam com a idéia de que homem e mulher foram criados por Deus para cumprirem a função de ter filhos.

Contribuíram para esta análise:
Pe. Antonio Abreu SJ, Daniel Seidel, Ir. Delci Franzen,
Pe. José Ernanne Pinheiro, Gilberto Souza e Paulo Maldos
Prof Msc Daniel Seidel Universidade Católica de Brasília e CBJP/CNBB
* Universidade Católica de Brasília e CBJP/CNBB

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