quinta-feira, 2 de julho de 2009

Fluxo migratório mundial inverte sentido

Brígido de Jesus González mora há 20 anos em Nova York, trabalhando como jardineiro para sustentar sua esposa e filhos, que estão em El Salvador. Mas agora que a recessão atingiu seus negócios esse imigrante ilegal decidiu fazer as malas e voltar para seu país natal - definitivamente.

"Estou pensando em abrir uma oficina mecânica, ou talvez um posto onde meus vizinhos possam vir encher o tanque com gás", diz González, de 50 anos. Esses novos negócios seriam uma boa maneira de ajudar seus dois filhos, que moram em Nova York, se as coisas piorarem nos Estados Unidos. "Posso lhes oferecer empregos se eles quiserem voltar para cá", diz.
O mundo desenvolvido, que há décadas oferece um caminho difícil, mas promissor, para a mobilidade social, parece estar perdendo seu atrativo. O desemprego cresce, e os incidentes de hostilidade contra trabalhadores estrangeiros estão aumentando. O resultado talvez seja a maior virada nos fluxos migratórios desde a Grande Depressão, dizem economistas.

As estatísticas completas sobre migração para a maioria dos países só ficam disponíveis depois de longo tempo e, portanto, ainda não conseguem retratar todos os efeitos da atual crise econômica.
Mas relatos de casos e dados de ministérios e organizações diversas indicam que o fluxo de imigrantes de países pobres para países ricos está diminuindo bastante, pela primeira vez em décadas. Ao mesmo tempo, mais migrantes estão voltando aos seus países. Entre os que retornam estão trabalhadores da construção de estradas oriundos de Bangladesh, empregadas domésticas das Filipinas, operários fabris que emigraram da Indonésia e do Vietnã e mexicanos empregados na construção civil, assim como banqueiros, advogados e agentes imobiliários do mundo todo que estavam trabalhando em Cingapura e Dubai.

A emigração do México para os Estados Unidos caiu 13% no primeiro trimestre deste ano ante o do passado, com mais mexicanos saindo do que entrando nos EUA. As autoridades da Indonésia esperam que 60.000 ou mais cidadãos retornem da Malásia, Coréia do Sul e outros países vizinhos mais ricos, com o corte de empregos para imigrantes. Dezenas de milhares de indianos estão dando adeus a Dubai, agora que os empregos nesse emirado árabe vão sumindo e as licenças de trabalho, expirando. No Reino Unido, o número de trabalhadores registrados vindos de países recém-admitidos na União Europeia, como Polônia e República Checa, caiu 55% no primeiro trimestre de 2009 ante o mesmo trimestre do ano passado.

Um número crescente de migrantes está regressando a países como Nepal ou Tajiquistão, ao mesmo tempo em que muitas pessoas estão cancelando seus planos de emigração, diz Dilip Ratha, economista especializado em migração do Banco Mundial em Washington, citando relatórios de ministérios e embaixadas. Ratha chama essa migração reversa de um fenômeno "muito novo" e "sem precedentes".

Essas mudanças migratórias podem ter consequências profundas para os países desenvolvidos, em especial em lugares onde a população interna não está crescendo com rapidez suficiente para preencher os postos de trabalho e pagar a conta das necessidades sociais. Imigrantes altamente qualificados são uma importante fonte de tributos em certas cidades, e seus filhos preenchem as salas de aula das universidades e escolas particulares. No mundo em desenvolvimento, as remessas de dinheiro que esses migrantes mandam para casa também estão diminuindo, o que indica menos renda - e, potencialmente, menos crescimento Alguns analistas questionam se essa recente reversão das correntes migratórias vai durar mais que a atual recessão, e se vai, de fato, ser tão grande como preveem especialistas em migração.

Muitos imigrantes trabalharam arduamente para se fixar em seus países de adoção, e não vão querer sair, mesmo que os empregos desapareçam. Outros dizem que essa tendência pode ser mais duradoura, em especial se os trabalhadores que retornam derem um empurrão nas economias em desenvolvimento, ou se a economia dos países mais ricos demorarem muitos anos para se recuperar.

Trabalhadores como González estão voltando voluntariamente, acreditando que, apesar de todos os problemas em seus países natais, estes oferecem melhores opções do que os EUA e a Europa. Muitas economias desenvolvidas estão se contraindo, mas alguns países em desenvolvimento, como China e Índia, continuam crescendo.

No passado, "quem vinha para os EUA trazia uma passagem só de ida", diz Vivek Wadhwa, pesquisador associado sênior da Universidade Harvard, que acaba de finalizar um estudo sobre tendências migratórias. "Agora, porém, há muitas terras da oportunidade."

O próprio Wadhwa emigrou da Austrália para os EUA em 1980, trabalhando na Xerox Corp. e depois no banco First Boston, antes de tornar-se acadêmico. "Em outras palavras, eu mesmo fui uma dessas pessoas sobre as quais estou pesquisando agora", diz.

Segundo seus estudos, entre os chineses que emigraram para os EUA e depois voltaram para a China, 72% disseram acreditar que as oportunidades profissionais estavam melhores em seu próprio país. Entre os indianos que voltam para casa, 56% disseram o mesmo. Wadhwa avalia que até 200.000 profissionais especializados da Índia e da China voltarão para seus países nos próximos cinco anos, ante cerca de 100.000 nos últimos 20 anos.

Autor(es): Patrick Barta e Joel Millman, The Wall Street Journal
Valor Econômico - 10/06/2009

Nenhum comentário:

Postar um comentário