quinta-feira, 10 de março de 2011

Crise ecológica, crise civilizacional

Manfredo Araújo de Oliveira
Doutor em Filosofia e professor da UFC. Presidente da Adital
Adital
O grande entusiasmo provocado pela retomada do crescimento econômico gerou um processo reflexivo sobre seu sentido e sobre o tipo de sociedade que ele está gestando. A primeira questão discutida entre os analistas contemporâneos é precisamente o paradoxo que marca hoje nossa vida coletiva: por um lado cresce cada vez mais a sensibilidade na sociedade a respeito das questões ecológicas; por outro lado, percebe-se um imobilismo quando se trata de programar ações concretas, sobretudo, quando isto envolve interesses econômicos. A crítica aqui se articula enquanto esforço de mostrar os limites constitutivos do modelo neodesenvolmentista em execução.

Um elemento fundamental é compreender que a crise ecológica é na realidade a manifestação de uma crise bem maior, mais ampla e mais profunda que tem a ver com o sentido da própria civilização moderna e que se concretiza nas crises econômico-financeira, alimentar, ecológica, energética e do trabalho que são profundamente inter-relacionadas e interdependentes. Tudo isto desemboca numa crise ético-cultural que toca o cerne do sentido humano do mundo que construímos na modernidade. Antes de tudo, mostra-se o paradoxo central da civilização que implantamos na modernidade: o desenvolvimento tecnológico vinculado à forma capitalista de configurar a vida social alargou a distância entre os seres humanos, agravou o abismo entre ricos e pobres, entre o Norte e o Sul. Enquanto foram gestadas gigantescas possibilidades para a atuação do ser humano no mundo, a fome, a miséria e a pobreza se propagaram levando milhões de pessoas a situações humilhantes em que se fez constante a ameaça de aniquilamento da vida.

Este modelo provocou a destruição sistemática do meio-ambiente trouxe problemas globais, que ameaçam toda a humanidade. A queima de combustíveis fósseis (petróleo, carvão) provocou o aparecimento do efeito estufa devido à poluição do ar pela concentração de gás carbônico na atmosfera. Esta concentração começou a aumentar a partir da revolução industrial em virtude da necessidade de queimar grandes quantidades de carvão mineral e petróleo como fontes de energia para a produção de produtos industrializados. Isto é causa do aquecimento da atmosfera, cujos efeitos, em longo prazo, são terríveis. A destruição da camada de ozônio tornaria a vida hu­mana sem defesa contra as radiações ultravioletas, o que resultaria em tumores de pele e no enfraquecimento do sistema de imunização. Por outro lado pesquisas científicas nos informam que o degelo do Ártico em 2007 foi o maior em um século encolhendo-o em mais de um milhão de quilômetros quadrados, está havendo elevação do mar, os desertos estão avançando e grandes inundações se tornam frequentes.

Não seria necessário reconhecer que esta crise nos está encaminhando para um novo paradigma civilizacional? A questão ecológica é muito mais do que ela revela imediatamente. O que aqui emerge é a problematização radical de uma determinada cultura entendida como forma específica de in­terpretar o existir do ser humano na história. Somos provocados por uma ameaça global, que nos leva a retomar a pergunta pela validade do sentido-fundamento, que herdamos da cultura moderna. Desta forma, a crise ecológica desemboca numa crise do próprio sentido da vida humana, de sua inserção na natureza, no mundo humano, em última instância, no todo da realidade.

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