Dirigimo-nos à Rede Scalabriniana de Apoio a Migrantes e Refugiados, pois sentimos a necessidade de apresentar-lhes um pouco da situação dos haitianos que se encontram em nossa Região Amazônica, especialmente na cidade de Manaus, Amazonas, Brasil.
Em janeiro de 2010, um grande terremoto, como todos sabemos, devastou a cidade de Porto Príncipe, capital do Haiti (Caribe), impulsionando um grande número de haitianos a uma jornada migratória difícil. Com a perda de familiares, a destruição de suas casas, sem escolas, sem perspectivas e sem meios de sobrevivência em sua terra natal, muitos haitianos saíram numa diáspora que continua nos dias atuais, buscando alternativas em outros países em busca de melhores condições de vida, na tentativa de conseguir trabalho para obter recursos e ajudar os parentes e amigos que permaneceram no Haiti.
Sempre é oportuno repetir que nem todas as migrações são necessariamente resultado da exclusão e/ou da violência sofrida pelo ser humano. Esta migração de haitianos, em nossa perspectiva e visão, deve ser analisada como um fenômeno social que revela a grande vulnerabilidade a que estão expostas estas pessoas, o apelo ao direito ao trabalho e condições de sobrevivência, necessitando, para tanto, de uma solução sobre seu status migratório, para favorecer o acesso às condições mínimas de cidadania.
Em geral, os haitianos que chegaram a Manaus, seguiram uma longa trajetória, indo para Panamá ou República Dominicana, seguindo para o Equador, depois para o Peru, e na Tríplice Fronteira, entraram no Brasil na cidade de Tabatinga, onde fizeram sua solicitação de refúgio. A seguir, transferiram-se para Manaus.
Na primeira semana de fevereiro de 2010, chegaram aproximadamente 70 pessoas com protocolo de Solicitante de refúgio. A partir desse momento, a chegada de grupos foi constante e um grande número deles continuou sua difícil jornada que, até o presente, parece sem perspectiva de solução.
Em Manaus, buscam o Serviço da Pastoral dos Migrantes (SPM). Até o presente chegaram mais de 360 pessoas, as quais continuam sem uma definição jurídica de sua condição migratória. São mulheres e homens, trabalhadores, que sonham em recomeçar uma nova vida.
Entre o grande contingente que veio a Manaus, muitos tinham e têm o sonho dos Estados Unidos, da Europa - França (seguindo o caminho Via Guiana Francesa, fronteira norte do Brasil). Pouco se sabe sobre o destino deles a partir daqui, é recorrente o fato de deixarem as casas de acolhida, sem deixar contato e nem destino. No entanto, seja de passagem, seja em buscar de se fixar, em sua grande maioria chegam a Manaus sem recursos e sem ter para onde ir.
O número vem crescendo. O SPM no qual atuam as Irmãs Scalabrinianas, os padres Scalabrinianos da Paróquia São Geraldo, Leigos Missionários Scalabrinianos (LMS), Voluntários, Agentes de Pastoral, coordenadores de Setores, padres diocesanos, Cáritas e toda a ação Social da Arquidiocese de Manaus estão envolvidos neste atendimento. Cotidianamente buscando parcerias, interpelando, ”gritando” pela ajuda e pela ação e participação dos órgãos públicos, buscando apoio nas políticas públicas, mas os resultados são insuficientes e escassos frente à emergência e os desafios do trabalho de Assistência destes imigrantes em estado de vulnerabilidade, carentes de atenção às necessidades básicas de alimentação, moradia e trabalho.
Enquanto isto nosso papel é comprometer e fazer a denúncia profética de que enquanto o Governo Federal não se define e o Governo Estadual passa a preocupar-se com a situação de saúde, divulgando a situação nos espaços da comunicação social de Jornais e TVs locais. As manchetes dos meios de comunicação são discriminatórias, e às vezes lançam notícias alarmantes e geradores de idéias distorcidas e ofensivas: ‘Haitianos são examinados’; ‘FVS chega a Tabatinga para enfrentar cólera’; PF evita imigração ilegal: Ministério da Justiça quer conter imigração desenfreada – quem entrar sem visto será deportado’, entre outras.
O que mais nos preocupa é o futuro próximo. Primeiro: o que vai acontecer com os imigrantes que não receberão mais o Protocolo de Solicitantes de Refúgio e que a PF está barrando, tanto em Tabatinga, como em Brasiléia (Acre). Segundo, o que fazer com os que nos próximos dias chegarão a Manaus? Recebemos na semana passada mais de 53 pessoas. Temos, neste final de fevereiro, em torno de 192 haitianos que vivem em alojamentos mantidos pela Pastoral dos Migrantes, Paróquias e solidariedade das pessoas que fazem parte da Igreja Católica da Arquidiocese de Manaus.
O entendimento do Comitê Nacional para Refugiados, assim como do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados, é que os haitianos não se enquadram na condição de Refugiados, situação esta que pressupõe algum tipo de perseguição. Assim, após instruir os processos, repassa-os à responsabilidade do Conselho Nacional de Imigração do Ministério do Trabalho (Cnig), que analisará os casos buscando uma solução humanitária. A próxima reunião do CNIg está prevista para dia 16 de março.
Sabe-se que a Polícia Federal está controlando com mais rigor a entrada, exigindo-lhes Visto (até agora entravam irregularmente e uma vez no Brasil solicitavam refúgio). Fala-se de deportação para os indocumentados. Se assim for, será uma situação muito complicada para os haitianos, pois sequer recursos para voltar eles têm. Portanto, caracteriza esta luta por direitos, que de um lado, abrem as fronteiras para a entrada de trabalhadores dizendo buscar soluções humanitárias, e por outro lado, põem resistências e controles nas fronteiras, negando aos imigrantes o status de trabalhadores legais e conseqüentemente, os direitos de cidadania.
Mediante a demanda atual elencamos como algumas prioridades de emergência: Casas de alojamentos e albergues; comprometimento maior do Estado e a inclusão dos imigrantes em Políticas Públicas; escola permanente de Português para Estrangeiros, com professores qualificados, sendo pagos pelo Estado; inclusão dos Haitianos em Cursos de capacitação profissional; promoção de atividades de sensibilização da sociedade para a inserção dos haitianos na comunidade e no mercado de trabalho local, trabalhando a cultura do imigrante e o novo habitat e costumes; alimentação: ensino da culinária local mesclando a culinária de seu país de origem; oficinas de produção e comércio de trabalhos alternativos, tais como: produtos artesanais típicos; produtos feitos com materiais recicláveis; incentivo à formação de cooperativas e outras formas de autogerenciamento; integração comunitária com as Universidades, pastorais, grupos, organizações e movimentos sociais locais, ONGs que promovam o exercício da cidadania e o respeito à diversidade de costumes e culturas.
Concluímos esta mensagem com a esperança de que sejam viabilizadas medidas de proteção e residência regular, a fim de diminuir a condição de vulnerabilidade destes imigrantes, com o objetivo de ajudar a superar esta etapa e dar-lhes condições de reconstrução de novas oportunidades de emprego e de vida digna.
Manaus, 28 de fevereiro de 2011.
Ir. Rosa Maria Zanchin, mscs
A equipe do Serviço Pastoral dos Migrantes
Arquidiocese de Manaus- Amazonas
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